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‘Projeto pode prejudicar desinternações do manicômio judiciário’

Militante antimanicomial critica proposta de aumento do tempo de internação para inimputáveis

Sejus

A Câmara dos Deputados aprovou, nessa quinta-feira (12), um projeto de lei que aumenta para 3 a 20 anos o prazo mínimo de internação compulsória para pessoas que cometeram crimes, mas foram declaradas inimputáveis pela Justiça, devido a doenças mentais ou desenvolvimento intelectual incompleto. Atualmente, o prazo mínimo é de 1 a 3 anos.

Para Maria das Graças Loureiro, militante capixaba do Núcleo da Luta Antimanicomial e mãe de um usuário da rede de atenção psicossocial, o projeto de lei, caso seja aprovado em definitivo, vai gerar impactos negativos para a reforma psiquiátrica iniciada em 2001, e poderá comprometer o processo de desinternação dos pacientes da Unidade de Custódia e Tratamento Psiquiátrico (UCTP) de Cariacica, na região metropolitana do Estado.

“Na verdade, o que estão querendo com essa lei é o retorno dos manicômios. Por que o que significa reclusão de 20 anos? Exclusão e negativa de direitos. As pessoas com transtorno mental precisam de tratamento, não de prisão – isso em relação àquelas que realmente têm transtorno, e não as que os juízes e psiquiatras encontram um ‘jeitinho brasileiro’ para emitir laudo de doença mental”, comenta.

O Projeto de Lei 1637/19 foi apresentado originalmente pelo ex-deputado federal de extrema direita Delegado Waldir (União-GO), visando uma alteração no Código Penal. De acordo com a proposta, a internação compulsória de inimputáveis passará a acontecer por tempo indeterminando, enquanto não for averiguada “a cessação de periculosidade”.

A proposta também estabelece a necessidade de repetição de perícia médica de três em três anos; libertação “sempre condicional”, havendo a possibilidade de restabelecimento da condição anterior, se ocorrer “fato indicativo de persistência de sua periculosidade”; e possibilidade de a Justiça determinar a internação em qualquer tempo, se “for necessária para fins curativos ou como garantia da ordem pública”.

Na Câmara, o projeto foi aprovado com 238 votos a favor e 111 contrários, com o apoio massivo de partidos de direita e extrema direita. “Nós, enquanto movimento nacional, estamos fazendo uma articulação para ver se a gente consegue impedir que esse projeto seja aprovado no Senado Federal. Somos contra, porque causa um retrocesso na lei da Reforma Psiquiátrica. Defendemos o tratamento em liberdade e uma sociedade sem manicômio”, afirma Loureiro.

Manicômio ainda aberto

No início deste ano, causaram alvoroço as notícias veiculadas na imprensa capixaba sobre a desinternação dos pacientes da Unidade de Custódia e Tratamento Psiquiátrico. O processo segue a decisão da Resolução 487 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), de fevereiro do ano passado, que deu prazo para o fechamento dessas instituições, de forma a dar cumprimento à Reforma Psiquiátrica de 2001.

Inicialmente, o prazo final estabelecido foi maio deste ano. Depois, houve uma prorrogação para agosto – mês em que uma nova alteração abriu espaço para que os tribunais de justiça apresentassem novos pedidos de aumento do prazo para implementar as medidas.

Segundo a Secretaria de Estado da Justiça (Sejus), a interdição parcial da UCTP foi revogada em 11 de setembro, devido aos novos prazos dados pelo CNJ. Ainda de acordo com a secretaria, atualmente, a unidade se encontra com 38 medidas de segurança e 14 internações provisórias, totalizando 52 pacientes.

A Sejus e a Secretaria de Estado da Saúde (Sesa) trabalham para transformar a UCTP em Unidade de Acolhimento Transitório, conforme definido pela Portaria Conjunta Sejus/Sesa Nº 001-R, de 18 de setembro de 2024, e a previsão é de que o local passe a ser gerido pela Sesa a partir de 30 de julho de 2025.

“O projeto de lei aumentando o tempo de internação compulsória poderá impactar nesse processo da UCTP. Hoje, um juiz pode internar uma pessoa compulsoriamente. Daí, se o médico dá alta para o paciente, ele só é liberado se o juiz decidir. Há uma disputa entre as áreas da Saúde e da Justiça sobre essa questão, inclusive por causa da verba que é liberada para as instituições”, comenta Maria das Graças Loureiro.

Em abril, a assistente social Nicéia Malheiros, representante da Associação Brasileira de Saúde Mental (Abrasme) no Espírito Santo, defendeu o processo de fechamento do manicômio judiciário capixaba.

“Existe todo um processo de acompanhamento intersetorial. Uma vez que as pessoas cometeram delitos e estão nessa condição de saúde mental, elas serão acompanhadas pela rede de atenção psicossocial, e isso inclui as equipes de Estratégia de Saúde da Família, os Caps [Centros de Atenção Psicossocial] e outros equipamentos. Os internos podem, inclusive, passar por internação, se for necessário”, comentou.

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