Os servidores estaduais não desistiram de lutar pelo pagamento retroativo do auxílio-alimentação, benefício que foi cortado pelo governo do Espírito Santo em 2006 para os que passaram a receber por subsídio, regime segundo o qual todos os benefícios são incorporados ao salário-base, cerca de 47 mil trabalhadores. O Pleno do Tribunal de Justiça do Estado (TJES) decidiu, no último dia 15 de março, por maioria de votos, negar o direito que seria a um período de cinco anos anteriores às ações. Dos 28 magistrados, só tiveram entendimentos contrários os desembargadores Pedro Valls Feu Rosa e Ronaldo de Souza.
A decisão foi tomada durante o julgamento do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR), que unificou todas as ações de sindicatos que tratam do tema, e passou a valer para todos os processos que tratam do mesmo assunto no Estado. O IRDR começou a ser julgado no Tribunal no dia 21 de setembro de 2017.
As entidades – incluindo o Sindicato dos Servidores da Saúde no Estado (Sindsaúde), Associação de Cabos e Soldados da Polícia Militar (ACS) e Sindicato dos Servidores Públicos do Estado (Sindipúblicos), entre outras – estão se unindo para contratar um escritório em Brasília para recorrer da decisão do TJES em instâncias superiores, como o Superior Tribunal de Justiça (STJ) e Supremo Tribunal Federal (STF). De acordo com o diretor de Comunicação do Sindsaúde-ES, Valdecir Gomes Nascimento, de qualquer forma, as entidades também vão apelar à decisão no próprio TJES, uma vez que ainda cabe recurso no tribunal local.
De acordo com uma das advogadas que atua em favor do Sindsaúde-ES, Jaline Iglesias Viana, o trâmite será aguardar a publicação do acórdão no Diário Oficial da Justiça, o que ainda não foi feito pelo TJES. Em seguida, pode ser utilizado como recurso para apelação embargos de declaração, que pedem revisão de algum ponto obscuro do julgamento. Em seguida a uma nova negativa do TJES, recursos especial ou extraordinário podem ser requeridos ao STF ou STJ.
Vitórias em primeira instância
Algumas entidades já haviam conseguido vitórias em primeira instância, como o Sindsaúde e o Sindipúblicos.
O Sindsaúde-ES, por exemplo, ingressou com ação judicial em 2015 diante da negação do governo do Estado em pagar o auxílio-alimentação aos servidores que passaram a receber por subsídio. Em março de 2016, o Juízo da 3ª Vara da Fazenda Pública de Vitória condenou o Estado ao pagamento do benefício, inclusive o retroativo. O mesmo Juízo, no entanto, determinou a suspensão do processo do Sindsaúde-ES até que o Tribunal de Justiça julgasse o IRDR, alegando que a medida foi adotada de forma a garantir igualdade nas decisões.
Após admitido o IRDR pelo Tribunal Pleno, o relator do processo, desembargador Fernando Estevam Bravin Ruy, também suspendeu todos os processos pendentes (individuais e coletivos) que cuidassem da temática e a intimação de todas as partes interessadas para que apresentassem, caso houvesse interesse, as suas respectivas manifestações.
As defesas dos servidores estaduais argumentam que o artigo 2-A, da Lei Estadual 5.342/1996, que suprimiu o auxílio-alimentação dos servidores públicos do Estado remunerados pelo regime de subsídio, deve ser reconhecida como inconstitucional.
A defesa dos policiais militares, que também integram o processo, por sua vez, manifestou-se pelo reconhecimento do direito à percepção retroativa do auxílio a toda a categoria de policiais militares, em respeito à isonomia com os demais servidores. Os que pertencem ao Judiciário, por exemplo, sempre receberam o benefício. Argumentou, ainda, que a verba consiste em um direito fundamental, sendo incabível a renúncia ao seu recebimento e, ainda, que como se trata de verba de natureza indenizatória, pode ser cumulada com o subsídio.
Do total de desembargadores que foram o Pleno, apenas dois votaram a favor dos servidores. Um deles foi Pedro Valls Feu Rosa. Em seu voto, o magistrado afirmou que o Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas possui teses que foram discutidas no Plenário. Além da inconstitucionalidade do artigo 2-A, da Lei Estadual 5.342/96, a respectiva modulação de seus efeitos, a contagem da prescrição para pretensão em juízo do auxílio-alimentação, pertinência jurídica da renúncia ao auxílio-alimentação pelos servidores que adotaram o regime jurídico do subsídio e limitação territorial da sentença.
Para Feu Rosa, “não há quaisquer dúvidas sobre a inconstitucionalidade formal do artigo 2-A, da Lei Estadual 5.342/96, uma vez que versou sobre matéria atinente à reserva de Lei Complementar, enquanto se tratava, em verdade, de Lei Ordinária”. Além disso, segundo o magistrado “o comportamento do Estado do Espírito Santo acabou por demonstrar para aqueles servidores que, no ano de 2006, acreditando que estariam recebendo a mesma remuneração sob outra nomenclatura, em verdade não estavam, caso contrário não lhes teria sido concedido o direito ao benefício com a edição da Lei nº 10.723/2017”.
O magistrado se refere à Lei nº 10.723/2017, projeto do Executivo, que retornou com o auxílio-alimentação para também quem recebe por subsídio. Para a defesa dos servidores, com isso, deu o entendimento de que, ao sancionar tal legislação, o Estado reconheceu seu erro histórico em ter retirado esse direito dos servidores.
Em suas alegações, o Estado afirmou que todos os servidores públicos que optaram pelo regime remuneratório do subsídio a partir de 2006 fizeram com a renúncia expressa ao recebimento do auxílio-alimentação, tendo este sido incorporado ao subsídio. “Evidentemente, tratando-se de uma opção, só a fez se teve um acréscimo remuneratório para o regime de subsídio”, destaca a defesa do Estado.
“Quanto aos servidores que ingressaram no serviço público depois da instituição do regime de subsídio, evidentemente, estão sujeitos ao regime já estabelecido; essa opção só alcançou, obviamente, aqueles que estavam no regime de vencimentos”, concluiu o Estado.