Decisão definitiva se estende para todo o País e considera o cenário de pandemia do coronavírus
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) estendeu, nessa quarta-feira (19), para todo território nacional, os efeitos do habeas corpus coletivo da Defensoria Pública do Espírito Santo (DPES) para soltura de presos que tiveram o deferimento da liberdade provisória condicionada ao pagamento de fiança. A decisão unânime da Terceira Seção do STJ levou em consideração a Recomendação 62 publicada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
Em março deste ano, a Defensoria já havia conseguido decisão liminar do STJ para a soltura de todos os presos do Espírito Santo encarcerados em razão do não pagamento de fiança, que somam quase 600 pessoas. Segundo a então decisão do ministro Sebastião Reis Júnior, diante do cenário de pandemia e de propagação do coronavírus, do aumento de desemprego e da diminuição ou até mesmo da total perda de renda, seria irrazoável condicionar a liberdade provisória ao pagamento da fiança.
Um mês depois, o mesmo pedido foi solicitado por outras Defensoria Públicas no Brasil e a ampliação dos efeitos da liminar foram estendidas, de forma provisória, a todo o País. Já nessa quarta, em análise final pela Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça, o colegiado entendeu que a situação apresentada pelo Espírito Santo e os consequentes impactos econômicos são idênticos aos relatados nos demais estados, e decidiu pela extensão do pedido. Ainda não se sabe, porém, o número total de presos que podem ser beneficiados com a medida.
A decisão, como aponta a Defensoria, é a segunda vitória histórica da instituição no Espírito Santo nos Tribunais Superiores. Em agosto deste ano, a DPES também conseguiu garantir de forma inédita, por meio do HC Coletivo 143.988/ES, a extensão da limitação de 119% para 100% da lotação das unidades socioeducativas em todo o Brasil.
“Importante para garantir a qualidade do funcionamento das unidades socioeducativas do País, a decisão do habeas corpus coletivo teve o objetivo de impedir cenários que violam a dignidade humana, como a superlotação, além de prevenir rebeliões, agressões, maus-tratos e tortura”, destaca.
No habeas corpus coletivo, a DP do Espírito Santo sustentou que, diante do cenário de pandemia da Covid-19, deveria ser superada a Súmula 691 do Supremo Tribunal Federal e, nos termos da Recomendação 62/2020 do CNJ, determinada a soltura imediata de todos os presos do Estado que tiveram o deferimento da liberdade provisória condicionado ao pagamento de fiança.
O ministro Sebastião Reis Júnior votou pela concessão do habeas corpus por reconhecer a plausibilidade jurídica das alegações e a flagrante ilegalidade da situação desses presos. “O risco de contágio pela pandemia do coronavírus (Covid-19) é semelhante em todo o país, assim como o é o quadro de superlotação e de insalubridade dos presídios brasileiros, razão pela qual os efeitos desta decisão devem ser estendidos a todo o território nacional”, afirmou.
Sebastião Reis Júnior lembrou que a recomendação do CNJ teve por objetivo fazer com que tribunais e magistrados adotassem medidas preventivas contra o coronavírus no âmbito dos sistemas de justiça penal e socioeducativo. Segundo o ministro, estudos mostraram que as pessoas que vivem em aglomerações, como nos presídios, são mais sujeitas a contrair a doença, mesmo se proporcionados equipamentos e insumos de proteção individual.
O relator destacou ainda que tanto a Organização das Nações Unidas (ONU) quanto a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) recomendaram a adoção de medidas alternativas ao cárcere para mitigar os riscos elevados de propagação da doença no ambiente das prisões. Além disso, ele mencionou o entendimento do STF de que o sistema prisional brasileiro vive um estado de coisas inconstitucional (ADPF 347), para concluir que é necessário “dar imediato cumprimento às recomendações apresentadas no âmbito nacional e internacional, que preconizam a máxima excepcionalidade das novas ordens de prisão preventiva, inclusive com a fixação de medidas alternativas à prisão, como medida de contenção da pandemia mundialmente causada pelo coronavírus”.
O ministro afirma ainda que, nos casos individuais apresentados pela Defensoria Pública do Espírito Santo, a necessidade da prisão preventiva já foi afastada pelo juiz de primeiro grau, pois não estavam presentes os requisitos imprescindíveis para sua decretação. O relator observou que, nesses casos, o juiz deliberou pela substituição do aprisionamento cautelar por medidas alternativas, mas optou mesmo assim por condicionar a liberdade ao pagamento de fiança. “Nos termos em que preconiza o Conselho Nacional de Justiça em sua resolução, não se mostra proporcional a manutenção dos investigados na prisão, tão somente em razão do não pagamento da fiança, visto que os casos – notoriamente de menor gravidade – não revelam a excepcionalidade imprescindível para o decreto preventivo”, afirmou.