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TJES vai analisar pedido da realização de novo júri do Caso Alexandre

O Tribunal de Justiça do Estado (TJES) vai iniciar, a partir da próxima semana, o exame dos recursos contra o resultado do júri popular dos acusados de mando do assassinato do juiz Alexandre Martins de Castro Filho, morto em 2003. O Ministério Público Estadual (MPES) está recorrendo da absolvição unânime do ex-policial civil e hoje empresário Carlos Luiz Andrade Baptista, o Calú, no julgamento realizado em agosto passado. A defesa do coronel reformado da Polícia Militar, Walter Gomes Ferreira, condenado pelo crime, também pede a realização de um novo júri.

Os autos da ação penal (0003512-14.2005.8.08.0035) foram remetidos à segunda instância na última quarta-feira (20). Os recursos de apelação – do Ministério Público e de Cel. Ferreira – deverão ser analisados por uma das câmaras criminais do TJES. Não há previsão de julgamento dos pedidos de novo julgamento. Resta ainda a definição sobre a realização do júri do último acusado de mando, o juiz aposentado Antônio Leopoldo Teixeira, que depende da análise de recursos nos tribunais superiores.

A reportagem de Século Diário teve acessos às peças que serão analisadas pelos desembargadores. O MPES alega, em síntese, que a decisão do Conselho de Sentença foi “manifestamente contrária à prova dos autos”. No julgamento realizado entre os dias 24 e 31 de agosto, os jurados decidiram, por unanimidade (sete votos), pela absolvição de Calu da acusação de homicídio qualificado. Na peça com 65 páginas, os promotores de Justiça João Eduardo Grimaldi da Fonseca e Bruno de Freitas Lima, que atuaram durante o júri, repetem a tese de que o juiz Alexandre teria sido morto a mando dos três denunciados por atrapalhar um suposto esquema de venda de sentenças na Vara de Execuções Penais (VEP) de Vitória.

Ao longo da peça da acusação, os promotores colecionam uma série de depoimentos, entre eles, de testemunhas que participaram do júri, como o caso do juiz Carlos Eduardo Lemos, que atuava ao lado do magistrado morto. O recurso de apelação cita ainda a suposta relação de amizade entre Calu e o juiz Antonio Leopoldo, além da eventual ligação entre o togado e o coronel reformado da Polícia Militar. Toda essa linha de acusação foi fortemente abalada durante o júri, tanto que Ferreira foi condenado em votação apertada (quatro votos contra três), muito embora a tentativa da promotoria de atribuir uma série de crimes ao ex-militar.

Também foram citados na peça, dois episódios que ocorreram durante o júri, como o depoimento do juiz aposentado e advogado Antônio Franklin e a reprodução da gravação de uma conversa entre o promotor inicial do caso, Florêncio Izidoro Herzog, e a mãe de Calu. Tanto o primeiro responsável pelas investigações do crime quanto o jurista contratado pela Associação de Magistrados do Espírito Santo (Amages) para atuar como assistente de acusação, disseram entender que se tratava de um latrocínio (roubo seguido de morte).

“A defesa para causar dúvida no Conselho de Sentença – aparentemente com êxito – utilizou-se, pois, da opinião tendenciosa de um advogado que voltou-se contra o pai da vítima [Antônio Franklin deixou o caso logo no início e recusou-se a receber seus honorários por rechaçar a tese de crime de mando], que o contratara e, igualmente, da apreciação pessoal atribuída a um promotor de Justiça, em data não estabelecida  [o MPES por mais de uma vez tentou retirar a gravação dos autos, mas o áudio foi mantido para assegurar a plenitude da defesa]”, afirmam.

Ao final da peça, os promotores João Eduardo Grimaldi e Bruno Lima concluem que “a prova dos autos aponta, portanto, de forma inequívoca, que a interferência do juiz Alexandre no esquema criminoso montado na VEP fez com que Antônio Leopoldo, Walter Gomes Ferreira e o apelado [Calú] passassem a arquitetar a morte da vítima”. O MPES sustenta que o empresário foi absolvido pelos jurados com base na negativa de autoria, o que não teria amparo nas provas, segundo o texto da apelação.

Defesa chama acusação de trama hollywoodiana

Nas contrarrazões da apelação, a defesa de Calu voltou a atacar a denúncia do Ministério Público, mesmo comportamento que teve ao longo do júri – tese que convenceu aos jurados ao final das quase cem horas de julgamento. “Ora, com a devida vênia, as razões de apelação da acusação estão mais para contrarrazões das razões de apelação a serem apresentadas pelo correu”, afirma. A defesa cita que, ao longo das 65 páginas do recurso do MPES, o nome de Calu só consta em 22 delas.

Inicialmente, a defesa rechaçou a justificativa apontada pelos promotores para a realização de um novo júri. “O Supremo Tribunal Federal (STF), em recentes julgados, tem reconhecido a ofensa ao princípio constitucional da soberania dos veredictos em julgados de Tribunais de Justiça que determinam a submissão do réu a novo júri, sob o argumento da manifesta contrariedade à prova dos autos”, narra o documento.

Sobre a tese acusatória, a peça rebateu cada um dos pontos levantados pela suposta ligação de Calu com o crime, ressaltando que todas “essas questões já foram debatidas à saciedade nos sete dias de julgamento perante o Tribunal Popular”. A defesa volta a denunciar a farsa do crime de mando: “Se é inegável que tal trama daria um bom enredo para um livro – como foi escrito em conjunto pelo juiz Carlos Eduardo, pelo secretário de Segurança da época [Rodney Miranda] e por um escritor [Luiz Eduardo Soares] -, quiçá para um filme, tal versão hollywoodiana não foi apta a convencer os juízes naturais da causa, quais sejam, os jurados da Comarca de Vila Velha”.

Os advogados citam que o ex-policial civil foi preso sob acusação de extorsão – em ação que acabou sendo extinta por falta de queixa-crime – um mês antes do crime e solto dois meses depois da morte do juiz Alexandre.  “Ora, estando sob a custódia do Estado, seria fácil investigá-lo. Poderia ter sido requisitada a lista de pessoas, incluindo advogados, que tiveram contato com o recorrido. Poderia ter sido realizada interceptação telefônica, caso se suspeitasse do uso de telefone celular pelo recorrido. Nada disso foi feito. Certamente pelo fato de esta linha de investigação nunca ter sido levada a sério”, ressaltam.

E prosseguem: “Enfim, se o recorrido [Calu] tivesse tramado um crime desta magnitude enquanto estava preso, certamente teria deixado rastros. E onde estão tais rastros, tais pistas, tais vestígios, tais indícios? Em cerca de 8.000 folhas de processo, após 13 anos do crime, não foram encontrados. Nem serão, pelo simples fato de não existirem, pelo simples fato de jamais ter passado pela cabeça do recorrido tal coisa”. Assinam a peça os advogados Antônio Fernando Moreira e Leonardo Picoli Gagno. A defesa pede o não reconhecimento do recurso de apelação do MPES e, caso seja reconhecido, a manutenção da sentença proferida pelo júri popular.

Além do pedido de novo julgamento feito pela promotoria, os desembargadores do TJES também vão decidir sobre o recurso de apelação interposto pela defesa do Coronel Ferreira, condenado a 23 anos de prisão em regime fechado pelo crime. Apesar de ser tratar do mesmo caso, os recursos não estão necessariamente vinculados. Portanto, o colegiado poderá admitir somente uma das apelações, por exemplo, determinando a realização de um novo júri popular para apenas um dos acusados. Caso seja mantida a prevenção no exame do caso, a 1ª Câmara Criminal do TJES deverá examinar os recursos. O relator deverá ser o desembargador Willian Silva.

Em casos normais, o julgamento de recursos dessa natureza costuma demorar entre seis meses e um ano, porém, a complexidade dos autos – são mais de 33 volumes e sete mil páginas de processo – e a repercussão social do crime podem acelerar ou retardar a análise do recurso.

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