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Tribunal de Contas enterra investigação sobre doação de terreno para Prysmian

Após mais de uma década sem solução, o plenário do Tribunal de Contas do Estado (TCE) determinou o arquivamento de uma auditoria sobre a doação do terreno que abriga hoje a empresa Prysmian Cabos e Sistemas do Brasil S/A, em São Torquato, no município de Vila Velha. O caso foi uma das maiores polêmicas da primeira Era Hartung por suspeitas de irregularidades no repasse da área portuária no início dos anos 2000. No entanto, o processo foi arquivado sem o exame do mérito das acusações.
 
O julgamento aconteceu no final de dezembro, mas o acórdão foi publicado apenas no início dessa semana. O relator do processo (TC 3578/2004) foi o conselheiro José Antônio Pimentel, quarto integrante do tribunal a ser responsável pelo caso ao longo dos quase 13 anos de tramitação. Em seu voto, Pimentel acolheu o parecer do Ministério Público de Contas (MPC) pelo arquivamento do processo, cuja Instrução Técnica Inicial (ITI) só foi concluída em 2014.
 
Na manifestação ministerial, o procurador-geral Luciano Vieira afirmou que “não constam elementos mínimos sobre a existência de prejuízo ao erário, não se podendo presumir que a doação do imóvel, por si só, configure lesão ao patrimônio”. Ele opinou pela decretação da prescrição da pretensão punitiva, isto é, quando o Estado perde a capacidade de punir.
 
O parecer acabou se tornando a solução para enterrar as investigações sem avançar sobre o mérito das acusações. A auditoria foi iniciada em julho de 2004, a pedido do então procurador-chefe de Contas, Ananias Ribeiro de Oliveira, integrante á época do Ministério Público Estadual (MPES). Ele questionava os critérios para transferência do terreno pelo Estado à empresa Cotia Trading, sem prévia licitação. Mais tarde, a área denominada de Ilha dos Comboios foi repassada para a empresa italiana Pirelli, e por fim, transferida à Prysmian, que hoje produz cabos umbilicais para a indústria do petróleo. Todas as envolvidas constam em doações para campanhas eleitorais de Hartung.
 
Com a decisão unânime pelo arquivamento, a auditoria deve ser extinta e os autos devem ser arquivados em definitivo após o trânsito em julgado. A medida deixará em aberto uma série de suspeições, que até hoje não foram rechaçadas sobre a transação, cujos procedimentos tiveram início no governo José Ignácio Ferreira e foram concluídos no primeiro mandato de Hartung.
 
Consta nos autos que o Estado cedeu um terreno com 31 mil metros quadrados no berço portuário de São Torquato, incluindo um conjunto de benfeitorias (composto por armazéns, barracões, pátio e cais) em uma área aproximada de 9.040 metros quadrados. Com o auxílio do Legislativo, o governo emplacou três matérias com objetos semelhantes, duas delas sendo alvo direto do Tribunal de Contas (transformados nas leis estaduais 7.062/2002 e 7.944/2004).
 
O primeiro projeto de lei foi proposto pelo então governador José Ignácio, doando a área para a empresa exportadora Cotia Trading. Durante a Era Hartung, o peemedebista enviou à Assembleia Legislativa dois projetos – um revogando a doação para a Cotia e outro doando a área para a Pirelli Energia Cabos e Sistemas do Brasil (mais tarde transformada em Prysmian), que iria efetivamente tocar o projeto.
 
As dúvidas sobre a procedência da doação começaram ainda durante a aprovação do primeiro projeto. Sob a liderança do então presidente da Assembleia, José Carlos Gratz, a área foi doada à Cotia Trading com a única exigência da realização de obras no suposto valor de avaliação da área (cerca de R$ 3,5 milhões). A doação chegou a ser lavrada em cartório, cuja escritura previa a doação da área do Estado para a Cotia com o pagamento de R$ 3,5 milhões sob a rubrica de “encargos de doação”.
 
Mas, logo após tomar posse, o governador Paulo Hartung enviou um projeto de lei ao Legislativo para suspender os efeitos da doação à Cotia Trading. Após a aprovação do projeto suspensivo da doação, o governador enviou uma nova mensagem à Casa, desta vez, transferindo a posse a Pirelli – sem qualquer prestação de conta dos valores anteriormente envolvidos na operação.
 
De acordo com a justificativa da matéria (Projeto de Lei nº 301/2004), o governador alega que a alienação estava condicionada à construção da unidade industrial em até trinta meses e fazia parte de um esforço para permitir que o Estado formasse um cluster (concentração geográfica de empresas do mesmo setor) das atividades relacionadas à área de petróleo e gás natural.
 
No entanto, o parecer da então procuradora da Assembleia, Edna Rangel Lourenço, aponta uma série de vícios de inconstitucionalidade na matéria, o que impediria até mesmo a tramitação na Casa. Entre as irregularidades apontadas no novo projeto está à ausência de avaliação prévia, a motivação para a dispensa de licitação e a não-existência de qualquer levantamento sócio-econômico justificando a instalação do empreendimento.

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