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‘Sergio Moro do caso Samarco’, Mario de Paula é parcial e atua contra os atingidos

Afirmação é dos Ministérios e Defensorias Públicas, em pedido de suspeição do juiz federal da 12ª Vara de MG

Reprodução/Youtube

O Ministério Público Federal (MPF), o Ministério Público de Minas Gerais (MP/MG), a Defensoria Pública da União (DPU), a Defensoria Pública do Estado de Minas Gerais (DP/MG) e a Defensoria Pública do Espírito Santo (DP/ES) impetraram pedido de Arguição de Suspeição contra o juiz federal substituto da 12ª Vara Federal Cível e Agrária de Belo Horizonte, Mário de Paula Franco Junior.

Responsável por julgar os processos referentes às ações e programas de reparação e compensação dos danos socioambientais e socioeconômicos advindos do rompimento da Barragem de Fundão, da Samarco/Vale-BHP, em novembro de 2015, Mário de Paula Franco Junior já afirmou sua proximidade com o juiz que liderou as investigações de corrupção no governo e empresas brasileiras iniciada em 2014.

“Se na seara criminal nós temos a Lava Jato, que sem sombra de dúvida é o caso mais importante do país, na cível nós temos o caso Samarco. Eu brinco às vezes com o colega Sergio Moro, que estamos só trocando de área, ele na área criminal e eu na área cível”, declarou Mario de Paula em palestra proferida em 2017, durante um seminário em alusão aos dois anos do crime, realizado pelo Movimento Ecos na capital mineira.

Na Arguição de Suspeição solicitada nessa terça-feira (30) ao juízo da 12ª Vara de Belo Horizonte, os procuradores da República, defensores públicos e promotor de Justiça listam nove fatos e fundamentos jurídicos que embasam a acusação de que o magistrado substituto na Vara, Mário de Paula, tem agido de forma parcial e contrariamente aos direitos dos atingidos.

O comportamento de Mário de Paula, resumem os autores da Arguição, “além de causar tumulto processual e a inefetividade dos processos, gera uma situação em que a reparação integral buscada pelas Instituições de Justiça em favor de todos os atingidos é relegada a segundo plano em prol do atendimento dos interesses de uns poucos escolhidos – e favorecidos processualmente – pelo juízo, que os aconselha, aceita petições por e-mail, realiza reuniões extra-autos, aprecia com celeridade – às vezes em poucas horas – os respectivos pedidos e elogia advogados e os representantes das comunidades atingidas, desde que sejam ‘ordeiros’, quer dizer, que concordem com a posição do juízo. Àqueles que não aderem às soluções propostas (!) pelo Juiz Federal da 12ª Vara da Seção Judiciária de Minas Gerais, há apenas a opção de reiteradamente requerer que seus pleitos sejam ao menos apreciados, antes que se tornem inúteis após longo tempo transcorrido”.

Os fatos expõem diversos aspectos da conduta do magistrado até o momento, com ênfase nas 31 apócrifas comissões de atingidos criadas a partir de 2020 no Espírito Santo e Minas Gerais para colocarem em prática o “Sistema Indenizatório Simplificado”, em que os atingidos se cadastram no sistema Novel, disponibilizado no site da Fundação Renova, para receber indenizações baseadas numa Matriz de Danos elaborada pelo juiz Mario de Paula, mediante aceitação da quitação geral de direitos e da contratação de advogados, que devem receber, a título de honorários, 10% do valor de cada indenização.

Na exposição dos fatos, os procuradores, defensores e promotor denunciam a abertura de processos de pedidos de indenização a partir de e-mails encaminhados diretamente à secretaria da 12ª Vara Federal e alguns até diretamente enviados ao gabinete do juiz federal substituto, sem que o próprio MPF tenha sido comunicado.

“Além da ausência de intimação, diversos processos referentes às demandas das ‘Comissões de Atingidos’, como os relativos às localidades de Aracruz, Conceição da Barra, Ipaba do Paraíso, São Mateus e Santana do Paraíso, tramitaram – ou ainda tramitam – em segredo de justiça, sem que se conheçam os motivos para tanto, o que inviabiliza o acesso e a atuação das Instituições de Justiça signatárias”, acentuam.

Reuniões não informadas nos autos

Tais atitudes passaram a ser denunciadas pela Força-Tarefa Rio Doce, criada no âmbito do MPF, quando finalmente o órgão pôde ter acesso aos autos desses processos. Na Arguição de Suspeição, foram acrescentados relatos colhidos em transcrições de vídeos de reuniões online realizadas entre Mário de Paulo, atingidos e seus advogados a partir de janeiro de 2021, que foram noticiados pelo Observatório da Mineração.

“A obscura tramitação dos processos judiciais acima referidos, a irregularidade do peticionamento por e-mails, que resultam na autuação de processos paralelos, em segredo de Justiça, e divulgação de reuniões realizadas pelo magistrado – antes mesmo do ajuizamento de diversas das ações das novas Comissões – caracterizam claríssimas violações dos deveres de transparência, imparcialidade e tratamento isonômico dos sujeitos processuais. Note-se que tais iniciativas não são convocadas como atos processuais, tais como audiências públicas ou audiências judiciais, e sequer encontram-se documentadas formalmente, na linha do que preconiza o art. 10 do Código de Ética da Magistratura”, afirma a Arguição.


Chama atenção ainda dos agentes da Justiça que assinam o pedido de suspeição, que as advogadas da Fundação Renova e das novas “Comissões de Atingidos”, “anunciam, na prática, a condição de porta-vozes do juiz federal substituto da 12ª Vara de Belo Horizonte, utilizando o nome do magistrado para colocar o peso da autoridade judicial a favor do constrangimento que fazem a atingidos e atingidas, sem que tenha havido qualquer tentativa do juízo de desfazer essa impressão”.

Longe de desmentir a postura das citadas advogadas, Mário de Paula “vem realizando reuniões informais, não registradas nos autos do processo, nas quais não apenas orienta, como também impõe condições às pessoas atingidas para decidir pedidos de seu interesse” e “sem a presença das Instituição de Justiça”, sublinha o documento.

‘Aqui não é Caixa Econômica Federal’

Em uma das diversas reuniões extra-oficiais realizadas, o juiz chegou inclusive a destratar os atingidos, conforme relato de um deles: “[…] assim, uma coisa que ele falou e que eu não gostei, é que ele, quando abriu a reunião, perguntou para nós, se nós vimos lá embaixo escrito Caixa Econômica Federal ou se era escrito Justiça Federal, entendeu?! ‘Quando vocês entraram lá embaixo, o que vocês viram escrito lá?! Vocês viram escrito lá, Caixa Econômica Federal, não né?! Então…lá é Justiça Federal, né?! Pois é, então […] quem quiser ficar rico, vai jogar na loteria, entendeu?! É uma das coisas que ele falou e que eu achei assim desnecessário ele falar isso com a gente, porque nós, atingido, estamos buscando um direito nosso, […] não estamos querendo ficar rico […].”

Ao longo do documento, os autores da denúncia acrescentam ainda que, para muito além de um aconselhamento sobre a melhor forma de proceder para conseguirem suas indenizações, Mário de Paulo tem impelido os atingidos “a alterar seu comportamento processual, sob pena de não terem seus pedidos de indenização apreciados de forma célere”.

Por isso, asseveram, “a conduta do juiz da 12ª Vara Federal, além de processualmente irregular, causou verdadeiro caos entre as pessoas atingidas, redundando em assédio de advogados e criação de comissões artificiais e não representativas. Mais que isso, o juiz ainda demonstra parcialidade ao dar tratamento privilegiado a determinadas e específicas comissões, aquelas recentemente criadas, em detrimento de outras, já existentes”. Seguramente, reafirmam, “esse tipo de interferência transborda do que se pode admitir do comportamento judicial e compromete as relações existentes nos territórios atingidos”.

Honorários multimilionários

Em meio ao grande número de advogados que têm assediado os atingidos, a Arguição descreve a atuação de um escritório de Baixo Guandu, no centro-oeste do Espírito Santo, liderado por Richardeny Luiza Lemke Ott, que tem sido repetidamente elogiada por Mário de Paula.

Em um dos trechos destacados na arguição, o juiz chega a justificar os R$ 150 mil pagos à equipe de Richardeny, a título de honorários de sucumbência, afirmando que “o presente valor levou em consideração o ineditismo e o pioneirismo da demanda para os atingidos do estado de Minas Gerais e da solução pragmática apresentada, contornando quase cinco anos de amarras institucionais, ineficiência das instituições, discursos radicais, viabilizando uma solução real (efetiva) para milhares de atingidos de Naque, inclusive com antecipação da tutela de urgência”, e que “o presente valor não constitui precedente para qualquer outro caso, nem mesmo para aqueles patrocinados pela referida advogada. Trata-se de valor singular, rigorosamente pontual, em razão do ineditismo, pioneirismo e importância da demanda de Naque, como precedente positivo, para Minas Gerais e toda a bacia do Rio Doce”.

O grupo liderado pela advogada de Baixo Guandu, acentua o documento, é os responsável “pelos recebimentos de praticamente todos os atingidos, perante a Fundação Renova, privatizando, assim, o processo coletivo, a um ganho de honorários multimilionário”, e que somente Richardeny, “sozinha, responde por mais de mil pagamentos, tendo recebido valores da ordem de dezena de milhão de reais em honorários, em menos de um ano de trabalho repetitivo, composto basicamente de upload de documentos na plataforma criada após as ‘tratativas’ feitas com o juiz, sem qualquer argumentação ou redação de petição relevante”.

Afastamento

A Arguição pede que “seja determinado, em caráter provisório, o afastamento do juiz responsável pelo caso, com a designação provisória de outro juiz federal para dar andamento a todas as providências atualmente pendentes, de modo a não fazer recair sobre a população mineira e capixaba o ônus do tempo necessário para o processamento do presente pleito”.

A medida, ressalta o documento, “é a que proporciona maior segurança jurídica para o processo, uma vez que evita, de um lado, a suspensão total das providências processuais, por prazo indeterminado e, de outro, a produção de mais atos que possam vir a ser anulados, futuramente”.

Assinam a petição os procuradores da República Silmara Cristina Goulart (coordenadora da Força Tarefa Rio Doce), Edilson Vitorelli Diniz Lima, Edmundo Antonio Dias Netto Junior, Eduardo Henrique de Almeida Aguiar, Flávia Cristina Tavares Tôrres, Helder Magno da Silva, Ludmila Junqueira Duarte Oliveira; o promotor de Justiça em Minas Gerais Gabriel Pereira de Mendonça; os defensores públicos da União Francisco de Assis Nascimento Nóbrega, Lígia Prado da Rocha e Carolina Morishita Mota Ferreira; o defensor público em Minas Gerais Aylton Rodrigues Magalhães; e os defensores públicos no Espírito Santo Mariana Andrade Sobral e Rafael Mello Portella Campos.

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