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Ação sobre condomínio no Morro de Guaibura é remetida à Justiça Federal

Funai pediu para entrar no processo; desmatamento e terraplanagem avançam no local, protegido por lei

A ação civil pública que visa impedir a instalação do condomínio de luxo Manami Ocean Living no Morro de Guaibura, em Guarapari, na região metropolitana do Estado, será remetida da Justiça Estadual para a Federal. A decisão foi proferida pelo juiz Gustavo Marçal da Silva e Silva nessa quarta-feira (3), em resposta ao pedido da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) para ingressar como assistente do povo Borum M’nhag Uipe, comunidade autodeclarada indígena de Guaibura.

Entretanto, sem uma liminar contra as ações da empresa Design 16, responsável pelo empreendimento, as intervenções continuam no espaço localizado na região da Enseada Azul, com avanço do desmatamento. Na semana passada, foi iniciada o a terraplanagem no morro, conforme registros em vídeo feitos por moradores. A Organização Não Governamental (ONG) Gaya Religare acusa o empreendimento de ultrapassar os limites estabelecidos no licenciamento.

Reprodução

A Funai, que enviou uma equipe técnica à Vila de Guaibura no mês passado, havia tentado entrar como amicus curiae (“amigo da corte”, um terceiro que fornece elementos ao julgador) no processo, mas o pedido foi negado pelo juiz, que considerou não haver competência da esfera estadual para julgar direitos indígenas. A autarquia, então, reformulou a solicitação, pedindo para entrar como assistente e para que os autos fossem remetidos à Justiça Federal.

“Ainda vai levar 15 dias para a Justiça Federal analisar. Na verdade, a ação, neste momento, está numa espécie de ‘limbo’. Enquanto isso, a terraplanagem segue ‘comendo solta”, lamenta Juliana Souza, da Gaya Religare.

Na avaliação de Juliana, faltou sensibilidade ao juiz para entender que a questão é urgente, com risco de dano ambiental irreversível. Apesar disso, ela avalia que existe mais possibilidades de apresentar o dano causado pelo empreendimento e mais chance de efetividade na Justiça Federal.

Não é primeira vez que ocorre alteração na esfera julgadora da ação judicial. A Gaya Religare ingressou com a ação civil pública em 29 de novembro de 2023 na Justiça Estadual. Logo depois, o juiz sinalizou que a competência seria federal, e a ONG desistiu da ação para ingressar novamente nessa esfera. Entretanto, o processo acabou retornando para a esfera estadual.

Mobilização

Desde o segundo semestre do ano passado, a ONG Gaya Religare já realizou dezenas de denúncias sobre a situação do Morro de Guaibura. A comunidade alerta que a construção do condomínio de luxo provoca destruição em uma área de preservação ambiental e provoca cerceamento às suas práticas culturais.

Mesmo assim, a Prefeitura de Guarapari e o Instituto de Defesa Agropecuária e Florestal do Espírito Santo (Idaf-ES) emitiram licenças de instalação para o Manami Ocean Living, contrariando parecer do Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Iema).

Em janeiro deste ano, a comunidade também encaminhou um pedido à Funai, para o reconhecimento da existência do povo Borum M’nhag Uipe na Vila de Guaibura. O pedido teve como base uma pesquisa realizada ao longo do ano de 2023 por Potira de Almeida, moradora e integrante da Gaya Religare, para resgatar as origens indígenas da comunidade.

Governo ES

Atualmente, o Morro de Guaibura está cercado, impedindo o livre trânsito de moradores. Até mesmo o pedido para que uma equipe da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) fizesse uma vistoria no local foi negado pelo juiz. Segundo Juliana Souza, 90% de suas práticas culturais ficaram inviabilizadas. Também se tornou comum encontrar espécies de animais mortas no entorno e pássaros que antes utilizavam as árvores empoleirados em fios de alta-tensão.

No último dia 20 de março, a ONG encaminhou uma denúncia ao Ministério Público Federal (MPF), na qual argumenta que foi descumprido o Termo de Adesão da Prefeitura de Guarapari com a União, para a transferência da gestão das praias marítimas urbanas.

“Tal denúncia expõe claro desrespeito por parte da Prefeitura de Guarapari a tal Termo de Adesão, além de descumprimento da legislação ambiental com a severa e iminente retirada de um ecossistema de extrema fragilidade, sem possibilidade de reversão do dano (manguezal). Para além disso, a prefeitura, em proveito da confiança transferida pela União, em seus atos administrativos ultrapassa a omissão, promovendo e encorajando a ocupação desordenada, ignorando e agredindo nosso povo, que em uma longa luta para sobrevivência manteve o Morro da Guaibura”, diz a denúncia.

“Os efeitos deletérios aos aspectos paisagísticos, ambientais e urbanísticos por um condomínio em construção sobre um costão rochoso podem ser tratados como uma aberração na gestão pública, se não um ato criminoso”, continua o texto.

No mês passado, houve também uma agenda na Assembleia Legislativa com assessores dos parlamentares do Partido dos Trabalhadores (PT), incluindo o senador Fabiano Contarato; os deputados federais Jack Rocha e Helder Salomão; e os deputados estaduais João Coser e Iriny Lopes.

Um dos pontos abordados foi o questionamento da constitucionalidade da Portaria 011-R de 2016, da Secretaria de Estado do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Seama) e do Iema, que derrubou o tombamento da Mata Atlântica que havia sido feito pelo Conselho Estadual de Cultura (CEC). 

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