Cerca de 70 famílias, incluindo quilombolas, desenvolvem há 10 anos projeto de agroecologia em Conceição da Barra
Desde o ano passado, a região do entorno da estrada que dá acesso a Itaúnas, em Conceição da Barra, norte do Estado, vem sofrendo com uma intensa ocupação de pessoas de fora nas áreas de uso tradicional quilombola que estão sob posse da empresa de celulose Suzano (ex-Fibria e ex-Aracruz Celulose). Movidos pela especulação imobiliária, associações recém-criadas estão loteando e vendendo terrenos, invadindo os territórios já reconhecidos como quilombolas, mas que ainda aguardam a titulação oficial.
Tudo isso vem sendo denunciado pelo movimento quilombola e, no próximo dia 11, está prevista a primeira ação de reintegração de posse na região, em favor da Suzano, para retirar essas pessoas forâneas das áreas ocupadas. Agricultores locais, porém, temem que nesse processo também sejam despejadas famílias quilombolas que atuam há até 10 anos nas chamadas áreas de retomada, onde ocuparam o território tradicional para garantir a sobrevivência e a produção alimentar por meio da agroecologia, dada a morosidade do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) na titulação dos territórios quilombolas já reconhecidos, como acontece em todo Brasil.
O grupo prepara uma carta com apoio de diversas entidades, para pressionar que as famílias locais sejam mantidas nas áreas de retomada. Segundo o coletivo, são cerca de 70 famílias que vivem e produzem alimentos em uma área de cerca de 200 hectares localizada na antiga fazenda Estrela do Norte, entre Itaúnas e a comunidade quilombola de Angelim.
Lá vem sendo desenvolvido o trabalho de agroecologia, por meio da implantação de sistema agroflorestal, aliando árvores nativas com outras frutíferas, e plantios diversos. Ao longo dos anos, tem sido realizado também o cuidado das nascentes e do Córrego Velha Antônia, e com implantação de saneamento ecológico e construções de casas no modo tradicional, com bioconstrução, e uso de placas solares para obtenção de energia elétrica.
Representantes do coletivo alegam que a retomada nunca teve conflitos com as comunidades do entorno e que a agricultura familiar ali praticada ajuda a abastecer de alimento a vila de Itaúnas. “Estamos sendo tratados como milicianos. Nossa retomada não é invasão. São áreas ocupadas há anos por necessidade, para sobrevivência, não para loteamento e venda”, relatou um dos moradores da retomada, que preferiu não se identificar.
A Polícia Civil investiga as diversas associações criadas especialmente no último ano, que vendem lotes na região para pessoas de diversos municípios do Espírito Santo e até de outros estados do Brasil.