Na contramão do que é realizado em diversos outros países no mundo, o Brasil permanece na inércia e não dá prioridade à criação de Unidades de Conservação (UCs) costeiras e marinhas. O descaso é ainda mais aparente quando se percebe que a criação dessas áreas protegidas sequer é mencionada nas propostas dos candidatos à Presidência e não está presente em nenhum dos programas de governo, que também desconsideram ações que poderiam compatibilizar o uso e a conservação do território marinho. As considerações são levantadas por Marcia Hirota, diretora-executiva da Fundação SOS Mata Atlântica, e Leandra Gonçalves, bióloga e consultora da entidade, em artigo publicado no portal O Eco.
Para as ambientalistas, o cenário ilustra o conflito entre preservação ambiental e exploração dos recursos naturais na costa oceânica brasileira, questão que seria facilmente resolvida caso houvesse um planejamento e políticas mais equilibradas, que tratassem da exploração mas, também, da sustentabilidade dos recursos naturais e dos ecossistemas costeiros e marinhos.
No artigo, elas ressaltam que falta clareza sobre o papel das áreas protegidas ao governo brasileiro, que também não compartilha com a sociedade as informações sobre planos e interesses em territórios públicos, uma prática governamental que leva a tensões sociais e causa dificuldade de entendimento do real papel das áreas protegidas para o país. De acordo Hirota e Gonçalves,allém da recuperação e conservação da biodiversidade marinha, é fundamental que se enxergue essas áreas como polos de transformação social. “Isso precisa mudar. E em ano eleitoral, quem tem boas propostas será rei ou rainha”, decretam.
As ambientalistas lembram que, em 2012, o Congresso Brasileiro de Unidades de Conservação aprovou por unanimidade o manifesto pró-UCs apresentado por entidades da sociedade civil. No documento, foram enumeradas 19 Unidades de Conservação cujos processos se encontravam em estágio avançado e dependiam apenas do empenho por parte do governo federal para se tornarem realidade. “Entenda-se por empenho não apenas vontade para destravar processos prontos, mas sobretudo força política para enfrentar conflitos em áreas que apresentam com grandes obras de infraestrutura”, ressaltam.
Entre as áreas protegidas enumeradas, cinco possuem área no perímetro marítimo do Espírito Santo, são elas: Área de Proteção Ambiental (APA) do Banco dos Abrolhos, que também engloba o sul da Bahia; a Reserva de Vida Silvestre (Revis) da Baleia Jubarte; a Reserva de Desenvolvimento Sustentável Foz do Rio Doce, na área onde estão sendo planejados, por exemplo, os portos da Manabi e Imetame, e também onde se instalou o Estaleiro Jurong; o Parque Natural (Parna) e APA Arquipélago Sul Capixaba e Francês, e o Parna e APA Federal da Ilha de Trindade Arquipélago Martins Vaz.
O manifesto foi assinado por 72 especialistas de todo o país e proposto por 43 instituições, entre elas a Fundação SOS Mata Atlântica, a Associação Ambiental Voz da Natureza, a Reserva da Biosfera da Mata Atlântica (RBMA), o Projeto Albatroz, o Instituto Baleia Jubarte e a WWF-Brasil. Dois anos depois de sua aprovação no congresso, nenhuma das unidades apontadas no documento foram efetivamente criadas.
No Brasil, partiram do legislativo as últimas iniciativas de criação de UCs na zona costeira e marinha, que deram origem ao Monumento Nacional das Ilhas Cagarras (RJ, 2010) e Parque Nacional Marinho da Ilha dos Currais (PR, 2013). Do Executivo, as últimas áreas foram criadas há cinco anos, sendo a Reservas Extrativistas da Prainha do Canto Verde (CE) e do Cassurubá (BA). De acordo com o Greenpeace Brasil, as três áreas marinhas protegidas mais relevantes do país foram criadas antes de 1988, que são a Reserva Biológica do Atol das Rocas e os Parques Nacionais de Abrolhos e Fernando de Noronha.