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Aracruz Celulose (Fibria) recebe Licenças Prévia e de Operação em Linhares

A foto que ilustra a capa desta matéria e é reproduzida ao lado, foi feita em junho de 2006, durante uma visita à região do Farias, na zona rural de Linhares, norte do Espírito Santo, para uma reportagem sobre um crime ambiental cometido pela Aracruz Celulose (a mudança para Fibria ocorreria três anos depois).

Na imagem, consta parte do grupo de camponeses locais que, munidos de uma coragem quase sobrenatural, desafiaram sete tratores, viatura da Polícia Militar e seguranças particulares armados, dispostos a levar a cabo a derrubada da mata ciliar da margem oeste do Córrego Jacutinga, de propriedade da empresa.

Vizinhos dos eucaliptais da papeleira multinacional, na margem leste do Jacutinga, os camponeses acompanhavam, há trinta anos, a recuperação daquela faixa de vegetação nativa, na esperança de ver o combalido córrego recuperar ao menos parte da pujança de outros tempos, quando a água chegava na altura do peito de um adulto.

Ausentes na foto – mas cada vez mais presentes na luta camponesa local –, destacam-se Elias Alves e a esposa Ana Cristina Soprani, na época grávida de oito meses, que se sentou na frente dos tratores, impedindo a continuidade da devastação.

E é novamente Cristina quem me atende, nesta quinta-feira (11), quando procuramos o Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA) para comentar os impactos sociais e ambientais do deserto verde no município, diante da notícia da autorização, pelo Instituto de Defesa Agropecuária e Florestal do Espírito Santo (Idaf), para mais um plantio de eucaliptos pela Aracruz Celulose (Fibria).

Licenciamento simplificado

Nos comunicados públicos, a empresa informa a obtenção das Licenças Prévia e de Operação – LP nº 289/2017 e LO nº 352/2017 – para a atividade de Silvicultura com plantio de 729,72 hectares de eucalipto na Fazenda Nossa Senhora das Graças, aparentemente, uma consequência do chamado Licenciamento Simplificado adotado  no Espírito Santo, mais uma ferramenta estatal a serviço do agronegócio, na contramão da sustentabilidade e da justiça social.

Cristina conta que o ato impetuoso dos camponeses linharenses, há doze anos, aconteceu em meio ao processo de mudança para Fibria e de readequação das ações da empresa para obtenção do selo verde, que estava sendo contestado na época.

Como consequência, a papeleira foi obrigada a reflorestar e permitir a regeneração natural de áreas de Reserva Legal e Áreas de Preservação Permanente (APPs) em suas propriedades.

A movimentação intensa de vários povos tradicionais vítimas dos desmandos da Aracruz Celulose e do governo estadual chegou a ser registrada no documentário Rodeado de Inimigos, produzido, na época, por  cineastas noruegueses.

Nada disso, no entanto, foi suficiente para que os mananciais da região voltasse a correr.

Sete anos após a ação, uma crise hídrica sem precedentes na história do Estado golpeou fatalmente os fragilizados córregos e nascentes, como mostra a imagem ao lado, onde Elias caminha sobre o leito do que já foi um dos tantos córregos da região.

“O Córrego Jacutinga era um dos maiores e simplesmente secou. Tamanduá, Lama Preta, da Onça, em todos esses lugares, a gente não consegue mais identificar vestígios de água nos córregos”, relata Cristina.

O problema, diz a agricultora, é que apesar das margens estarem em regeneração, as nascentes e áreas de recarga sofrem com plantações de eucalipto, não só da Aracruz. No Jacutinga, ainda, a própria Prefeitura de Sooretama usou uma área de recarga do Córrego pra instalar um lixão, que foi aterrado.

Denúncias são ignoradas

A camponesa diz ainda que, desde antes do ato em 2006, até hoje, o MPA realiza seguidas denúncias contra os crimes ambientais da Aracruz Celulose e das sucroalcooleiras da região, todas sistematicamente ignoradas pelos órgãos ambientais.

E as denúncias são difíceis de serem feitas, pois não se pode adentrar nas propriedades. “É perigosa a presença dos trabalhadores”, alerta. Perigoso, mesmo em suas próprias terras, pois a pressão para que abandonem a região ao crescimento das monoculturas de eucalipto e cana continua.

“Temos várias histórias de propriedades usurpadas”, confirma Cristina, contando que as empresas mandavam soltar gado, que devoravam tudo, entre muitas outras estratégias de intimidação. “Continua, não mais tanto dessa forma, algumas vezes também, mas com outras formas, legalizadas pelo governo”, acusa.

Uma delas, destaca, é a apropriação da água, tornando inviável a sobrevivência do agricultor. “A gente não tem perspectiva de ter água”, lamenta, contando que mesmo as barragens da Aracruz Celulose registram escassez, tendo sido utilizados caminhões-pipa para irrigar os novos plantios, feitos em outubro e novembro de 2017. “Na fase inicial o eucalipto precisa de muita água superficial, depois a planta dá conta de ir até as profundezas do solo buscar o que precisa”, explica.

A expulsão camponesa continua

É aprofundando também cada vez mais seus poços artesianos que a empresa tem conseguido água necessária para expandir sua produção, à custa de “muitos agroquímicos e venenos muito fortes, que contaminam todo o solo e a água da região”, denuncia.

Os pequenos agricultores, ao contrário, sem recursos próprios ou apoio estatal para financiamentos, ficam sem água para produzir o alimento que abastece a mesa das famílias capixabas e brasileiras.

“Buscar água no subsolo é extremamente caro, montar uma irrigação que não seja tão prejudicial ao meio ambiente é caro. Enquanto o governo perdoa dívidas bilionárias do agronegócio, acirra a cobrança terceirizada contra os camponeses, um verdadeiro terror contra os agricultores. As pessoas se veem num momento de desespero. É uma situação institucionalizada de expulsão dos agricultores”, reclama.

O camponês é um sujeito que mantem viva a esperança. Mas não há uma consciência coletiva, ou seja, uma nova forma de se pensar a agricultura, de se fazer agricultura, de manejar o solo e todos os seus recursos. A gente não consegue visualizar uma possibilidade de ver água de novo”, lamenta a líder camponesa.

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