quinta-feira, novembro 21, 2024
29.4 C
Vitória
quinta-feira, novembro 21, 2024
quinta-feira, novembro 21, 2024

Leia Também:

Áreas quilombolas são invadidas para especulação imobiliária no norte do Estado

Entidades apontam aumento da tensão nas comunidades em torno de Itaúnas, em Conceição da Barra

Uma tensão existente há tempos se intensificou ainda mais nas últimas semanas em torno dos territórios quilombolas localizados nas proximidades de Itaúnas, em Conceição da Barra. “As Comunidades do Sapê do Norte gritam por socorro!”, diz a nota publicada em conjunto pela Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq) e a Coordenação Estadual das Comunidades Quilombola do Espirito Santo – Zacimba Gaba

De acordo com as entidades, a invasão do território por pessoas alheias tem se tornado insustentável, avançando sobre os territórios quilombolas de Angelim I, Linharinho, São Domingos e Córrego do Alexandre. As duas últimas estão em processo no Instituto de Colonização e Reforma Agrária (Incra) para reconhecimento do território, o que acaba sendo atrasado devido à ocupação indevida por pessoas não quilombolas. Os habitantes tradicionais pedem ajuda e chegaram a instalar placas para alertar contra as invasões que vêm ocorrendo.

Divulgação

Os movimentos destacam que não há qualquer direito ou legitimidade na ocupação dos territórios quilombolas quando é feita por terceiros, sejam fazendeiros, posseiros ou empresas, à diferença das retomadas do território pelos próprios quilombolas, que ocorre em virtude da demora na situação.

No Sapê do Norte, região que engloba os municípios de São Mateus e Conceição da Barra, há 32 comunidades reconhecidas e certificadas pela Fundação Cultural Palmares como quilombolas. Muitas delas possuem processo de titulação aberto há anos, mas ainda esperam pela entrega do título de propriedade coletiva à associação que representa cada uma delas.

“É sabido que aquele que está dentro do território quilombola com justo título receberá o devido pagamento pela desapropriação seguindo-se a fase de retirada (desintrução) destes invasores do território quilombola, conforme preconiza o Decreto Lei 4887/03”, apontam as entidades sobre possíveis interesse de posseiros no parcelamento e venda de lotes, assim como no recebimento de indenizações. Embora processos similares ocorram em outras regiões ocupadas por comunidades tradicionais, no entorno de Itaúnas a questão assume maior gravidade e pode estar se intensificando a partir do asfaltamento da via de acesso, que ajuda a valorizar ainda mais os terrenos.

No plano nacional o contexto também é complexo, sendo que tramita no Congresso Nacional o Projeto de Lei 2633/2020, chamado PL da Grilagem, que poderia favorecer a regularização de terras ocupadas por posseiros, enquanto o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, disse em reunião para que o governo aproveitasse que a imprensa está foca na cobertura sobre a Covid-19 para “ir passando a boiada”, no sentido de mudar as regras e normas que regem as questões relacionadas ao meio ambiente, agricultura e patrimônio cultural. A Fundação Cultural Palmares, criada para defender os direitos da população negra faz o contrário, chegando à beira de negar a existência de racismo no Brasil.

Causa estranhamento às comunidades e ao movimento quilombola que existam inúmeras ações de reintegração de posse contra os próprios quilombolas que retomam seus territórios já reconhecidos que foram invadidos monocultivo de eucalipto da Aracruz Celulose, Fibria e hoje Suzano, enquanto os posseiros ilegais passam imunes.

“Quando há retomada pela legítima Comunidade Quilombola, imediatamente, são retirados da terra, acusados de esbulhadores, são impedidos de circular em seu próprio território, perseguidos pela vigilância patrimonial da empresa, suas roças são arrancadas e envenenadas, conforme ocorreu nos autos do processo 0004271-48.2007.4.02.5001, mas quando se tratam de terceiros (brancos) não acontece nada! Aliás, acontece, permanecem indevidamente dentro do território quilombola e nada é feito pelas autoridades! Isso se chama racismo institucional, não é mesmo?!”, diz a carta publicada nessa terça-feira (2).

Os quilombolas ocupam essas terras há mais de um século, sendo que sofreram processo de pressão sobre a terra que levou ao êxodo e expulsão de milhares de famílias ao longo de décadas em favor das empresas de celulose, num processo que teve início durante a ditadura militar.

A Conaq e a Coordenação Estadual afirmaram repudiar veementemente as ocupações indevidas e irão adotar as providências cabíveis para que as áreas sejam retomadas e entregues para as associações quilombolas certificadas, que detêm legitimidade sobre essas áreas. Segundo as organizações, os quilombolas “resistem e resistiram por muitas e muitas gerações, pois têm consigo que a terra não pertence a eles, mas eles à terra!”.

Mais Lidas