quinta-feira, novembro 21, 2024
24.4 C
Vitória
quinta-feira, novembro 21, 2024
quinta-feira, novembro 21, 2024

Leia Também:

Assembleia deveria abandonar CPI sobre pó preto, opina promotor

Em solenidade do Dia do Meio Ambiente, Marcelo Lemos elogia TCAs com poluidoras como ‘os melhores da América Latina’

Facebook

Em meio à assinatura de decretos e projetos de lei e da posse dos membros do Fórum Capixaba de Mudanças Climáticas (FCMC) pelo governador Renato Casagrande (PSB), durante solenidade virtual em alusão ao Dia Mundial do Meio Ambiente, realizada na manhã desta sexta-feira (5), chamou atenção o discurso do promotor do Centro de Apoio Operacional da Defesa do Meio Ambiente (CAOA) do Ministério Público do Estado do Espírito Santo (MPES), Marcelo Lemos Vieira, devido à sua falta de sintonia com as prerrogativas científicas e de participação social, que ele mesmo enfatizou como fundamentais de serem respeitadas no tocante aos temas tratados na solenidade. 

Em primeiro lugar, Marcelo Lemos elogiou a condução da crise da Covid-19 pelo governo do Estado, enfatizando a tomada de decisões com base na ciência, o que contraria o posicionamento dos especialistas que subsidiam tecnicamente a Sala de Situação de Emergência em Saúde Pública, e que têm afirmado que não há absolutamente nenhum embasamento científico que justifique a decisão de reabertura do comércio, de rua e de shoppings centers. A Matriz de Risco, inclusive, citada como justificativa técnica para a decisão, carece de um indicador fundamental, que é o Índice de Transmissão (Rt), cuja inclusão já foi solicitada pelo Ministério Público Federal (MPF).

Em seguida, o promotor, responsável pelo Defesa do Meio Ambiente no órgão ministerial estadual, disse que “em vez de CPI do pó preto, a Assembleia [Legislativa] podia contribuir muito mais discutindo o processo legislativo, trabalhando o processo legislativo pra que a gente tivesse uma legislação que pudesse nos dar um norte pra trabalhar”. E a gente agora, complementou, “tem a chance inédita de trabalhar essa questão do controle da qualidade do ar com base legal, com participação da sociedade”, disse, referindo-se ao Projeto de Lei que estabelece a Política Estadual de Qualidade do Ar, assinado por Casagrande durante a solenidade e que será apreciado pela Assembleia Legislativa.

Ao final da cerimônia virtual, a fala foi rebatida pelo presidente da ONG Juntos SOS ES Ambiental e conselheiro do Conselho Estadual de Meio Ambiente (Consema), Eraylton Moreschi Junior, membro suplente no FCMC. O ambientalista lembrou da existência de legislação sobre o tema desde 2013, o Decreto 3463-R, criado com colaboração do Grupo de Trabalho Respira Vitória, com participação da sociedade civil. Mas que ainda não foi regulamentado, apesar do prazo para tal ter se extinguido em dezembro de 2014.

Outro ponto dissonante com a realidade foi o elogio aos Termos de Compromisso Ambiental (TCAs) firmados em 2018 entre as poluidoras Vale e ArcelorMittal e a gestão de Paulo Hartung, com mediação do MPES e Ministério Público Federal (MPF). “Estamos retomando a discussão da comissão que trata dos TCAs da Vale e da Arcelor. Talvez os termos de compromisso mais importantes da América Latina, talvez até das Américas, em relação à poluição atmosférica. Não estamos atrasados, estamos bem à frente de muitos países”, exaltou o promotor.

Os acordos, no entanto, não apresentam metas objetivas de redução dos poluentes pelas duas empresas, apenas medidas genéricas, que podem, inclusive, deixar de serem executadas, “em caso de inexistência de viabilidade técnica ou outro fator determinante”, segundo afirmou o perito judicial Luiz Roberto Charnaux Sertã Junior, em parecer contratado pela 4ª Vara Federal Cível de Vitória no julgamento do recurso impetrado pela Vale no âmbito da Ação Civil Pública movida em 2013 pela ONG Associação Nacional dos Amigos do Meio Ambiente (Anama). No recurso, a mineradora pede a suspensão da perícia judicial prevista no trâmite da Ação. A Ação, inclusive, chegou a ser suspensa pelo juízo em 2018, sob justificativa de que os TCAs, sem qualquer meta objetiva, poderia substituir a finalidade da Ação.

“O país tem como princípio fundamental a defesa do meio ambiente, mas também tem como princípio fundamental a livre iniciativa econômica”, disse Lemos. “Então nós temos que unir esses dois princípios, defender o meio ambiente, mas também temos que ter atividade econômica, que gera riqueza. Esse é um desafio. Equação difícil às vezes de fazer”, argumentou, para em seguida dizer que “a pandemia [de Covid-19] é uma oportunidade ímpar de fazer um estudo da qualidade do ar, com paralisação de quase 80% da movimentação de veículos” e que o levantamento está sendo providenciado junto com o Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Iema).

Os argumentos também foram contestados pelo presidente da Juntos SOS ES Ambiental, que informou a ocorrência de redução de poluição do ar durante a pandemia apenas em duas estações de monitoramento, e mesmo assim de forma pouco significativa, enquanto na Vila Capixaba, em Cariacica, houve aumento de quase 100% no último mês de abril, em relação ao mesmo período de anos anteriores.

“Para a poeira sedimentável [pó preto], a pandemia não trouxe os efeitos esperados. O que leva a uma reflexão para revermos o inventário de fontes e a participação atribuída à poluição veicular”, recomendou Eraylton Moreschi. 
“Senhor governador Renato Casagrande, quando sairemos do discurso para a participação efetiva da sociedade na prática da gestão das políticas públicas do Estado do Espírito Santo?”, questionou o ambientalista, citando o descumprimento do artigo 186 inciso 10 da Constituição Estadual, que determina essa participação na elaboração, execução e acompanhamento das políticas públicas. “As políticas públicas de meio ambiente do Espírito Santo têm alijado a sociedade civil organizada”, enfatizou.

Mau humor

Em resposta, o governador Renato Casagrande disse que o secretário estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Seama), Fabrício Machado, tem orientações de estabelecer comunicação com a sociedade civil por meio dos conselhos ambientais e no atendimento direto. “É preciso que quem milita na área possa ver também a parte do copo cheio. A crítica é fundamental pra avançar, mas é preciso que a gente se alimente também dos resultados, porque se não viveremos sempre mal-humorados e sem condições de conviver adequadamente num ambiente produtivo”, alfinetou o governador. 

Plano Estadual de Mudanças de Adaptação às Mudanças Climáticas

Sobre o Fórum Capixaba de Mudanças Climáticas (FCMC), o representante titular do Consema, José Marques Porto, destacou que a posse do colegiado e consequente reinício de suas atividades se dá com mais de uma década de atraso, visto que a Política Estadual de Mudanças Climáticas foi publicada em 2009 mas não foi regulamentada. E, por falta de atividades, o Fórum, que foi criado em 2006 e reformulado por duas vezes, foi inativado, por anos, tendo sido recriado por Casagrande em 2019, mas somente agora está apto a funcionar e elaborar a Política Estadual de Adaptação às Mudanças Climáticas, sua principal finalidade. 
“Novas escolas construídas desde 2010, poderiam já ter elementos de sustentabilidade de edificação, como captação de água de chuva, iluminação natural, ventilação natural, energia solar, materiais não agressivos ao meio ambiente”, declarou Porto, citando um aspecto de atuação prática possível do Fórum daqui para frente.

“A pandemia não respeita quarentena, não faz distanciamento social. 2020 pode ser o ano mais quente da história, mais quente que 2016, só que dessa vez sem El Niño nem La Niña. O mês de abril já foi o mais quente registrado na história”, informa.

As medidas a serem tomadas com base na Política Estadual serão de curto, médio e longo prazo e têm no saneamento básico um dos principais alicerces, destacou, citando ações elementares como jogar lixo no lixo, aproveitar os aterros sanitários para geração de energia, não jogar agrotóxicos na água, coletar e tratar esgoto. “Não tem que inventar a roda não, é só fazer o dever de casa, atender aos objetivos do desenvolvimento sustentável”, resumiu, citando ainda uma “urgente atualização do estudo de vulnerabilidades climáticas”, em decorrência do derretimento acelerado das geleiras da Antártida, onde os termômetros marcaram inacreditáveis 18,8ºC no último mês de janeiro na estação brasileira instalada no continente.

O Fórum é presidido pelo governador Renato Casagrande, tendo como substituto o secretário Fabricio Machado, e secretaria executiva sob responsabilidade da Secretária Estadual de Ciência, Tecnologia, Inovação e Educação Profissional (Secti), Cristina Engel de Alvarez. São 24 membros, representantes de órgãos estaduais da administração direta e indireta, de representantes de conselhos estaduais, do setor acadêmico, de entidades sem fins lucrativos, de federações capixabas e da sociedade civil organizada.

Aplicativo

Além de dar posse aos membros do Fórum Capixaba de Mudanças Climáticas e de assinar o projeto de lei da Política Estadual de Qualidade do Ar, o governador também assinou, no evento, dois projetos de lei: um sobre a Fiscalização de Uso da Água e outro que altera a Lei Estadual nº 7001/2001; além do decreto de regulamentação da Política Estadual de Segurança de Barragens, alinhado ao lançamento de uma cartilha digital de Segurança de Barragens.

Também houve o lançamento de um Aplicativo sobre a Qualidade do Ar na Região Metropolitana da Grande Vitória. Desenvolvido pelo Instituto de Tecnologia da Informação e Comunicação do Estado do Espírito Santo (Prodest), o aplicativo permite acesso rápido e transparente aos dados registrados nas últimas 48 horas pela rede de monitoramento da qualidade do ar, espalhada pela Grande Vitória. A escala do índice de qualidade do ar sobre as concentrações dos poluentes atmosféricos é classificada entre boa, moderada, ruim e muito ruim. A funcionalidade está hospedada no aplicativo ES na Palma da Mão.

Mais Lidas