O local foi o Centro de Convivência de Campo Grande/São Mateus. A organização do evento foi primordialmente dos próprios atingidos e contou com apoio do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) e do Fórum das Entidades em Defesa do Rio Doce, que congrega cerca de 40 instituições, entre elas a Defensoria Pública Estadual e a Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), esta, encarregada da transcrição de todos os depoimentos, para posterior elaboração de um documento a ser disponibilizado para as comunidades, para a própria Defensoria Pública, para os Ministérios Públicos Federal e Estadual e outras instituições que se fizerem necessárias mobilizar.
Incrível verificar o poder de organização das comunidades, com muito pouca tradição em mobilização social. O chamamento para a criação do Fórum Norte ocorreu há pouco mais de dois meses, apenas, às vésperas da audiência pública realizada na Assembleia Legislativa, em 29 de junho.
“Foi muito emocionante. Ficou uma sensação que é um momento histórico. A minoria ali era de movimento social, de militância. A maioria está começando agora a trabalhar de forma coletiva, mas com uma vontade muito grande de fazer essa união acontecer”, observa Cristiana Losekann, professora do Departamento de Ciências Sociais e membro do Núcleo de Estudo, Pesquisa e Extensão em Mobilizações Sociais (Organon), da Universidade Federal do Estado (Ufes), e representante da universidade no Fórum Estadual.
Essa união das comunidades era talvez o passo mais importante que faltava ser dado para que a situação caótica em que se encontram os atingidos ao norte da foz possa começar a se reverter. Apesar de todas as provas científicas da contaminação do mar e dos peixes – disponibilizadas desde o início do ano pelos órgãos ambientais federais e estaduais ao Ministério Público Federal – as comunidades localizadas ao norte da Foz do Rio Doce, nos municípios de Linhares e São Mateus, ainda não foram reconhecidas como atingidas pelo crime da Samarco/Vale/BHP, e se encontram, há dez meses, em situação de completo abandono e humilhação.
A pesca não foi proibida, porém, simplesmente não acontece mais e o pouco pescado que ainda é coletado não consegue ser vendido, pois não há consumidores aptos a arriscarem a saúde. Tampouco o turismo se sustentou depois da chegada da lama. O resultado, do ponto de vista socioeconômico, é de caos: trabalhadores sem renda, famílias passando necessidade, sendo despejadas e se desestruturando, aumento da prostituição, da criminalidade e do consumo de drogas lícitas e ilícitas. Há dez meses.
Durante a Assembleia de criação do Fórum, vários depoimentos repetiam essa triste realidade, enfatizando também a necessidade acompanhamento médico para os problemas de saúde que começaram a surgir intensamente entre os moradores, principalmente pescadores e crianças, que vivem mais em contato com a água contaminada. A falta de informação e o abandono também foram muito relatados.
O encontro mostrou como é possível, para os atingidos, se organizar politicamente e “como as comunidades podem se proteger da estratégia de divisão e rivalidade feita pela Samarco”, observa Haulleu Vallim, articulador dos fóruns locais.
A partir de agora, fica estabelecida uma dinâmica interna deles, semelhantes aos demais fóruns regionais, em consonância com o Fórum Estadual. “Comunidades vão se unir para ações de protesto, paralisações de rodovias, entre outras. As lideranças trocaram telefones, vão começar a articular”, conta Monica Silva Pazzinato, presidente da Associação de Moradores do Pontal do Ipiranga.