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‘Ataque ao patrimônio cultural de Vitória’ vai ser denunciado ao Iphan

Calçamento de trilha com 200 anos no Parque Gruta da Onça infringe lei federal que protege sítios arqueológicos

A descaracterização de uma trilha de pedras construída há cerca de 200 anos dentro do Parque Municipal Gruta da Onça, no Centro de Vitória, vai ser formalmente denunciada ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), órgão que tem o registro da trilha como um dos três sítios arqueológicos identificados na unidade de conservação.

Edson Valpassos

O caminho de pedras atravessa todo parque, unindo, em zigue-zague, sua parte mais baixa à mais alta e, segundo estudos que embasaram o registro do sítio histórico, foi provavelmente construído por escravos com objetivo de facilitar o trânsito de animais de carga com mercadorias da Fazenda do Barão de Monjardim, no atual bairro de Jucutuquara, para comercialização no então Mercado da Capixaba, na costa sul da ilha de Vitória, próximo de onde hoje é a Vila Rubim.

A trilha foi restaurada há cerca de cinco anos pelo projeto Caminhos da Capixaba, a partir da capacitação de moradores do entorno do Parque para o trabalho e registrada, no Iphan, como Caminho Antigo da Gruta da Onça.

Atropelando todo o registro histórico, no entanto, a gestão do prefeito Lorenzo Pazolini (Republicanos) e seu secretário de Meio Ambiente (Semmam), Tarcísio Foeger, iniciou uma descaracterização profunda do sítio arqueológico, lançando concreto armado sobre o solo, após retirada e amontoamento das pedras seculares, como parte de um conjunto de obras para melhorias do parque.

Edson Valpassos

“É um ataque ao patrimônio cultural da cidade. Está tudo registrado, não podem alegar desconhecimento. Há documentos e estudos sobre o lugar. Vamos debater no Iphan como restabelecer o caminho original e quais as punições cabíveis contra o município, com base na Lei Federal nº 3.924, de 1961”, explica o arqueólogo Henrique Valadares, que trabalhou no registro dos sítios arqueológicos da Gruta da Onça. A lei, ressalta, é o principal regramento federal que protege os sítios arqueológicos do país. A partir de sua publicação, em 26 de julho de 1961, a data foi declarada Dia Nacional do Arqueólogo.

Biólogo e coordenador do Caminhos da Capixaba, Edson Valpassos Reuter Mota acrescenta que, para além dos dois séculos de história relacionados à Fazenda Monjardim, a trilha remete há três mil anos, quando os índios usavam o trajeto para se deslocar do interior da ilha até o mar. “Em Fradinhos era tudo manguezal. Eles só tinham acesso ao mar nessa parte da ilha pela prainha onde hoje é a Capitania dos Portos”, conta, referindo-se ao prédio histórico localizado a poucos metros da entrada do parque da Gruta da Onça.

Em Fradinhos, a cerca de cem metros do limite do parque, Edson conta que o projeto localizou dezenas de riscos em pedras, próximo a um curso d’água, que indicam tratar-se de um local usado pelos índios para amolar suas ferramentas. “Conseguimos resgatar essas histórias, que estão sendo apagadas pela atual gestão”, lamenta. “Toda a região é um grande sítio arqueológico e histórico inserido no Revis [Refúgio de Vida Silvestre] de Fradinhos e que merece atenção por parte do município”, roga.

Edson Valpassos

“É muito relevante o escoramento de pedras que ameaçam desabar com chuvas fortes, o melhoramento da sede do parque, a acessibilidade…mas tudo isso precisa ser feito com acompanhamento de pessoas que têm conhecimento da área, respeitando os trabalhos anteriores, como o Caminhos da Capixaba, e a legislação”, pondera o ex-coordenador, citando, para além da Lei Federal 3.924/1961, o Sistema Nacional e Estadual de Unidades de Conservação.

“Questionamos essa estupidez. Se essa obra tivesse sido apresentada ao conselho gestor do parque, em hipótese alguma teria sido aprovada”, aponta, ressaltando que a gestão de Pazolini exonerou o gerente do parque e desmobilizou o conselho, deixando a unidade com seus mecanismos de controle social desativados.

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