Manifestantes cobraram revogação de programa idealizado pelo secretário
Um ato contra a privatização de seis parques estaduais reuniu, nesta quinta-feira (12), ambientalistas, moradores do entorno das unidades, comunidades tradicionais, movimentos sociais e pessoas preocupadas com o futuro das áreas protegidas no Espírito Santo, no Centro de Vitória. O protesto, que teve início às 16h, na Praça Oito, e culminou no Palácio Anchieta, sede do governo estadual, foi convocado pelo Movimento em Defesa das Unidades de Conservação do Espírito Santo, para reiterar a urgência de abandonar o Programa de Desenvolvimento Sustentável das Unidades de Conservação (Peduc), que prevê a concessão dos parques à iniciativa privada para exploração turística por 35 anos.
Idealizado pelo secretário de Meio Ambiente, Felipe Rigoni, com apoio do governador Renato Casagrande (PSB), o projeto é considerado uma ameaça à preservação ambiental e um risco de exclusão social. Além da marcha pela Capital, o movimento escreveu uma carta aberta ao governador, protocolada no sistema eletrônico do governo, em que reforça preocupações com os impactos ambientais e sociais da medida e pede a saída de Rigoni da pasta ambiental (Seama), acusado de priorizar interesses privados em detrimento do bem coletivo e do meio ambiente, como exige sua função.
O biólogo Walter Có, um dos porta-vozes do movimento, aponta que o governo tem assumido uma postura indiferente aos apelos da comunidade e de especialistas. Segundo ele, até o momento, as autoridades não ofereceram nenhum retorno às reivindicações apresentadas, ignorando tanto as demandas da sociedade civil quanto os alertas de profissionais da área ambiental. “Para o governo, parece que não tem nada acontecendo. A secretaria está focada nessa questão da privatização, enquanto as reais demandas ambientais do Estado, como a degradação, poluição atmosférica e das águas, continuam intangíveis”, criticou.
Na carta aberta endereçada ao governador, o movimento solicita o cancelamento imediato do programa de concessão, que abrange os parques estaduais de Itaúnas, em Conceição da Barra, no norte do Estado; Paulo César Vinha, em Guarapari; Cachoeira da Fumaça, em Alegre, região do Caparaó; Forno Grande e Mata das Flores, em Castelo, no sul do Estado; e Pedra Azul, em Domingos Martins, na região serrana. Está prevista a realização de um leilão para a concessão dessas unidades no primeiro semestre de 2025.
Os manifestantes alertaram para a gravidade de substituir a preservação por interesses econômicos privados, enfatizando que o Espírito Santo, com poucas áreas de conservação, deveria ampliar essas unidades em vez de ameaçá-las. “Esperamos que o governador entre para a história como defensor do meio ambiente, não como algoz”, expressa um trecho do documento.
Além disso, o movimento exige a substituição de Felipe Rigoni, apontado como responsável por uma condução autoritária do projeto e criticado por sua falta de expertise para gerir a pasta. Rigoni é associado a interesses privados, sendo conhecido como “embaixador do sal-gema”, devido ao seu empenho em viabilizar a mineração das jazidas capixabas, mesmo após o colapso das minas da Braskem, que provocou o afundamento de bairros em Maceió. “A prática de entregar cargos estratégicos a representantes de interesses empresariais precisa acabar”, afirmam os signatários da carta, reforçando a necessidade de lideranças comprometidas com a conservação ambiental.
Estruturas de grande impacto, como tirolesas, teleféricos, pousadas, restaurantes e estacionamentos para centenas de veículos estão previstas para serem implementadas em áreas sensíveis, cujo objetivo primordial é a preservação da fauna e flora, apontam especialistas que compõem o movimento. Eles alertam que os parques estaduais, por sua pequena extensão e fragilidade, não suportariam o impacto das novas instalações e do aumento expressivo do fluxo de turistas, necessários para viabilizar os lucros da concessão. “Essas áreas abrigam espécies ameaçadas de extinção que podem ser irreversivelmente prejudicadas”, ressaltam os autores da carta.
Eles também denunciam conflitos sociais já instaurados em localidades como a vila tradicional de Itaúnas, onde a instalação de um escritório temporário voltado ao Peduc na sede do parque evidencia a falta de comprometimento do governo em promover um debate amplo com os moradores, que reivindicam uma audiência pública convocada pela pasta de Meio Ambiente e têm criticado as reuniões realizadas pela Seama com grupos da comunidade separadamente.
Até então, as audiências públicas sobre o tema foram garantidas pela Comissão de Meio Ambiente da Assembleia Legislativa, que realizou uma audiência na sede da Casa de Leis e duas itinerantes, em Itaúnas e em Setiba. Em todas as ocasiões, os participantes cobraram participação popular efetiva no projeto.
Projetos milionários
Os primeiros empreendimentos, elaborados sem estudos de impacto ambiental pela consultora Ernst & Young Global Limited para os Parques Estaduais de Itaúnas e Paulo César Vinha, incluem grandes estruturas voltadas ao turismo de massa em áreas protegidas.
Na vila de pescadores, o plano prevê cinco polos de exploração turística. O primeiro, próximo ao Hotel Barramar, terá duas pousadas de 15 quartos, um restaurante e estacionamento para 200 veículos. O segundo, na antiga foz do Rio Itaúnas, replicará essas estruturas, conectadas por trilhas suspensas. A sede do parque será reformulada com escritórios, alojamento para 16 pessoas e um centro de visitantes, além de um memorial sobre a vila soterrada, cafés e lojas, e uma tirolesa. Mudanças também foram propostas para a área tradicional das barracas.
No Parque Estadual Paulo César Vinha, as intervenções se dividem em dois núcleos. O primeiro, perto da portaria principal, Lagoa de Caraís e Mirante do Alagado, incluirá teleféricos, uma torre de tirolesa e trilhas suspensas. O segundo, que cobre o acesso secundário, abrangerá a Lagoa Feia e áreas alagadas, com a instalação de 28 glampings e bangalôs, decks flutuantes, uma piscina e um restaurante.
De acordo com o contrato estabelecido com a multinacional, que recebeu R$ 8 milhões para elaborar os modelos de exploração econômica e turística das unidades de conservação, o prazo para a entrega dos projetos vai até janeiro do ano que vem, o que gera questionamentos sobre a possiblidade de integrar as demandas da sociedade na modelagem.