“Empresas precisam começar a sentir o custo da demora em reparar os danos”, afirma procurador-geral do ES
Está agendada para o dia 18 de outubro, a audiência judicial para avaliar o pedido feito pela Procuradoria Geral do Estado (PGE) para que o Espírito Santo seja admitido como polo ativo na ação civil pública de R$ 155 bilhões impetrada pelo Ministério Público Federal (MPF) em 2016.
A audiência será coordenada pelo juiz Michael Procopio Ribeiro Alves Avelar, que assumiu em meados de 2022 a 12ª Vara Federal, em Belo Horizonte, no lugar do juiz Mario de Paula Franco Junior, mas já dentro do Tribunal Regional Federal da Sexta Região (TRF-6). Criado há um ano e instalado em meados de agosto, a nova Corte Regional da Justiça Federal tem, até o momento, a única atribuição de cuidar dos processos referentes ao crime cometido pela Samarco, Vale e BHP Billiton contra o Rio Doce, em novembro de 2015.
Paralisada em função de acordos extrajudiciais firmados pelos entes públicos e instituições de Justiça com a Fundação Renova e as mineradoras – entre eles o Termo de Ajustamento de Conduta da Governança (TAC-Gov), homologado em 2018 pelo juízo da 12ª Vara, e a repactuação conduzida durante 14 meses pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) –, ação de R$ 155 bilhões teve tramitação retomada após o insucesso da repactuação, tendo como um de suas primeiras medidas a análise do ingresso do Espírito Santo no polo ativo. Na mesma audiência, devem ser julgados também os pedidos idênticos feitos pelo estado de Minas Gerais e a União.
A diferença entre os três pleitos, explica o procurador-geral do Estado, Jasson Hibner Amaral, é que nenhum órgão público estadual capixaba pode ser responsabilizado pelo rompimento da barragem de Fundão, em Mariana. “O Espírito Santo foi uma das vítimas do desastre. Nós não temos qualquer competência para fiscalizar uma barragem de rejeitos em Minas Gerais”, explana.
O pedido de retomada da ACP 155 bi já havia sido feito em 2020 pelo MPF, o Ministério Públicos de Minas Gerais (MPMG) e as Defensorias Públicas da União e dos dois estados atingidos (DPU, DPES e DPMG), em função da não contratação das Assessorias Técnicas Independentes (ATIs) para as comunidades atingidas, conforme estabeleceu o TAC-Gov.
As ATIs são essenciais para o equilíbrio de forças necessários à devida reparação e compensação dos danos. O assessoramento visa possibilitar que as comunidades atingidas possam compreender as negociações em curso e fazer frente aos milionários departamentos jurídicos das mineradoras criminosas. Passados quatro anos da determinação, no entanto, menos de uma dúzia delas, das 21 estabelecidas no acordo, foram de fato contratadas.
O exacerbado poder jurídico das empresas e mesmo a truculência com que atuam contra os atingidos – vide a multa de R$ 5 mil por pessoa por minuto de descumprimento de liminar de reintegração de posse estabelecida em liminar concedida pelo juiz da 1ª Vara de Aracruz, Fábio Massariol, atendendo a pedido da Vale contra a ocupação indígena sobre os ferrovia que atravessa a Terra Indígena Comboios – é o principal motivo da negativa sistemática das empresas em cumprirem os acordos extrajudiciais firmados nos últimos sete anos.
O custo da postergação
Na avaliação do procurador-geral do Estado, as empresas se valem da demora do processo judicial para investir o dinheiro que deveria financiar a reparação e compensação dos danos em outros aspectos de seu interesse e distribuir lucros exorbitantes entre seus acionistas, que chegam a R$ 100 bilhões por ano.
“O que as empresas têm feito é questionar todas as deliberações [extrajudiciais, expedidas pelo Comitê Interfederativo (CIF), criado para fiscalizar as ações da Fundação Renova] e perícias técnicas, para protelar o dever de reparar e compensar o dano que elas já se declaram responsáveis. Não se discute mais a responsabilidade delas sobre os danos, o que se discute é o que isso custa. O que a gente está fazendo agora, de forma enérgica, com esse bloqueio de R$ 10 bilhões, é fazer com que as decisões judiciais em favor das vítimas façam com que elas comecem a sentir o peso e o custo da demora de reparar o dano”.
O bloqueio de bens da Vale e da BHP Billiton, peticionado nessa segunda-feira (26), é um dos instrumentos disponíveis dentro do sistema processual para acelerar decisões em processos complexos, como é o caso Samarco/Vale-BHP. “Temos um sistema processual que prevê uma série grande de recursos, as varas do poder Judiciário estão assoberbadas com grande número de processos, existem, todavia, instrumentos que permitem antecipação de parte do pagamento. É nesses instrumentos que nós apostamos agora”, explica Jasson Hibner, ressaltando que a impressão captada a partir dos primeiros contatos com o novo juiz é de que “o pedido não deve demorar para ser atendido”.
A estratégia é essencial para que a Justiça possa de fato fazer justiça às vítimas do maior crime ambiental do país e da mineração mundial, cometido por duas das maiores mineradoras do mundo, que só têm visto seus lucros e poderio econômico, político e jurídico crescer após a tragédia, que continua impune. Tende a forçar também a agilização da reparação e compensação, por meio de acordos extrajudiciais.
“A partir do momento que consigamos obter decisões antecipatórias que firam as empresas, que acarretem desembolso e impactem no fluxo financeiro, é mais provável que elas levem mais a sério a necessidade de fazer um acordo”, pondera.
Quanto custa a desassistência aos atingidos do litoral norte nos últimos sete anos?
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