Fotos: Leonardo Sá/Porã
Está confirmada a previsão de que a Vale e ArcelorMittal poderão continuar lançando poluentes no ar pelo período de oito anos, com autorização legal. É que só daqui a nove anos, padrões de emissões considerados civilizados – a chamada Meta 3 –serão exigidos em Vitória.
O prazo está contido no Projeto de Lei n° 136/2014, que estabelece novos padrões de qualidade do ar para o município de Vitória, aprovado pela Câmara de Vereadores nesta terça-feira, às 19h49. A discussão do projeto começou às 16 horas. O projeto foi aprovado com uma emenda, que os apoiadores da matéria original rejeitaram. Não faltaram acusações de que foram feitas alterações só para beneficiar as poluidoras.
O advogado Nelson Aguiar, que se tornou militante contra o pó preto, acompanhou boa parte da discussão do projeto na Câmara de Vitória. Ele assinalou que, no mérito, o projeto não tem valor algum. “O projeto é inconstitucional. É inútil, pois fere a Constituição Federal quanto a indisponibilidade do ar. Os prazos são dilatados. Se os poluentes estão fazendo mal à saúde hoje, vão continuar afetando a poluição com respaldo no que está sendo aprovado, para que as empresas possam poluir sem mudar nada durante dois anos. É como se desse a um matador dois anos de prazo para parar de matar. Um absurdo”.
Para ele, os poluentes têm que ser medidos por órgão estatal, e não pelas próprias empresas. Destacou ainda que a Organização Mundial de Saúde (OMS) preconiza o padrão zero de poluição como essencial à vida com qualidade.
O projeto original aprovado foi apoiado pelo chamado Grupo Trabalho Interinstitucional (GTI) Respira Vitória, formado por 20 organizações da sociedade civil, inclusive representantes do empresariado, e foi apresentado pelo vereador o vereador Serjão Magalhães (PSB). O vereador destacou que o GTI se reuniu por três anos. Neste período, o vereador foi acusado de manobrar em favor das poluidoras. Seus críticos apontam o fato de ele ter recebido financiamento de campanha das empresas poluidoras em sua campanha derrotada à Assembleia Legislativa.
A Vale destinou verba ao vereador por meio das subsidiárias Minerações Brasileiras Reunidas (MBR) e Salobo Metais. Na prestação de contas final divulgada pelo sistema do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o vereador declarou que recebeu R$ 40 mil da ArcelorMittal e R$ 30 mil da Salobo Metais, além das verbas que lhe foram destinadas por meio da candidatura de Paulo Foletto (PSB), referentes a R$ 10 mil da MBR e R$ 15 mil da ArcelorMittal. Recursos que totalizaram investimentos de R$ 55 mil da siderúrgica e de R$ 40 mil da mineradora.
Indiferentes a isto, os ambientalistas ligados ao Juntos SOS ES Ambiental e de algumas outras organizações da sociedade civil compareceram às galerias da Câmara de Vitória em apoio ao projeto do vereador. Só deixaram o local em protesto contra a introdução da emenda aprovada. Eraylton Moreschi Junior (foto à dir.), presidente da Juntos, atribuiu a responsabilidade pela emenda ao presidente da Câmara, Namy Chequer (PCdoB), assinalando que a emenda é só para manter lei de autoria do vereador.
Somente os vereadores Marcelão e Reinaldo Bolão, ambos do PT, votaram contra a aprovação do projeto. O vereador Max da Mata (PSD) deixou o plenário antes da votação. Votaram sim ao projeto do vereador Serjão e na emenda apresentada em plenário os vereadores Davi Emanuel (PSB), Devair Ferreira (PRB), Fabrício Gandini (PPS), Luizinho (SDD), Luiz Emanuel (PSDB), Namy Chequer, Neuzinha (SDD), Rogerinho (PHS), Sérgio Magalhães, Vinicius Simões (PPS), Wanderson Marinho (PRP) e Zezito Maio (PMDB).
Os observadores assinalaram que o projeto será sancionado pelo prefeito Luciano Rezende (PPS), considerando sua posição em relação às poluidoras. O prefeito é acusado de não fiscalizar as empresas poluidoras e, como o vereador Serjão, também recebeu financiamento para campanha eleitoral das poluidoras.
As empresas gratificadas pelo projeto ArcelorMittal Tubarão e a Vale são as principais responsáveis pela poluição do ar na Grande Vitória. A ArcelorMital tem uma segunda unidade, em Cariacica. São toneladas de poluentes, alguns cancerígenos, outros que produzem doenças alérgicas e respiratórias, e outras que deprimem o sistema imunológico, facilitando a instalação de várias doenças.
O projeto de lei aprovado determina que, nos três primeiros anos, os padrões atuais serão mantidos. É a chamada meta intermediária um. Haverá uma meta intermediária dois e, na sua meta final, a lei será aplicada somente em nove anos. A justificativa dos apoiadores é que os prazos darão tempo às empresas e órgãos gestores para se adaptarem à nova legislação.
O município de Vitória é o mais impactado pelos poluentes do ar lançado pela Vale e ArcelorMittal. A degradação ambiental do município tornou Vitória a capital mais poluída do país. Nada muda em termos de exigência legal pelo município de Vitória.
No caso do dióxido de enxofre (SO2), que produz doenças alérgicas, respiratórias e baixam a imunidade, Vitória é líder nacional na concentração deste poluente. Pelo projeto aprovado na Câmara, Vitória terá de esperar nove anos para alcançar metas estabelecidas pela Organização Mundial de Saúde (OMS) em relação a este poluente, que é de 20 microgramas por metro cúbico. A primeira meta, média para aplicação imediata a partir da entrada em vigor da lei, é de 60 microgramas por metro cúbico em 24 horas.
Para o monóxido de carbono (CO) o projeto aprovado fixa o índice de 31 Partículas Por Milhão (ppm) por uma hora.
Para o dióxido de nitrogênio (NO2), será permitida a concentração de 200 microgramas por metro cúbico por uma hora. Só daqui a nove anos será exigido atingir 40 microgramas por metro cúbico.
Para o ozônio (O3), a meta final será de 100 microgramas por metro cúbico a cada oito horas.
Para as PM 10, material particulado inalável, as metas começarão em 110 microgramas por metro cúbico por dia. Daqui a nove anos, a lei prevê a aceitação de 50 microgramas por metro cúbico por dia. Para PM10 só serão aceitos 20 microgramas por metro cúbico por ano, mas isto no futuro: em nove anos.
Para as PM 2,5, partículas inaláveis foi estabelecido que não haverá limite para este tipo de poluente nos próximos três anos. Após três anos da entrada em vigor da lei, será padrão 50 microgramas por metro cúbico em 24 horas. Ao final dos nove anos, as taxas devem chegar a 25 microgramas por metro cúbico por 24 horas
As Partículas Totais em Suspensão (PTS), compostas pelo pó de minério da Vale e pelo carvão da ArcelorMittal, o limite que a lei estabelece é de 150 microgramas por metro cúbico por 24 horas, de imediato.
O projeto de lei determina providências que o município terá de adotar para fazer cumprir a lei.