Os camponeses do Estado encerraram 2015 sem qualquer condição de garantir a produção de alimentos em decorrência da seca, o que já comprometeu a colheita do ano que se inicia e ainda ameaça a de 2017. Mas, apesar da gravidade da situação, com consequências para toda economia dos municípios do interior, o governo Paulo Hartung (PMDB) há dois meses ignora o pleito do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA) de realizar reunião para debater a pauta da entidade.
O pedido de uma audiência com o governador já foi feito pessoalmente ao vice-governador César Colnago (PSDB) e ao secretário da Casa Civil, Paulo Roberto, porém, sem qualquer resultado. Pedidos de empenho para tratar a questão também já foram feitos aos deputados estaduais do PT Padre Honório e José Carlos Nunes, igualmente sem providências.
“Não há sequer retorno”, pontuou Valmir Noventa, coordenador do MPA. Os camponeses, segundo ele, estão completamente abandonados diante do grave problema da seca. “Além do governo e dos deputados, as prefeituras e os vereadores não têm propostas para minimizar os impactos”, afirmou.
Com o cenário cada vez mais dramático e sem conseguir sensibilizar o governo estadual, o MPA vai endurecer a mobilização com um ciclo de protestos que começam ainda em janeiro, mês de “muita luta”, como definiu a liderança camponesa. No último mês de novembro, os camponeses realizaram atos em onze municípios capixabas.
“A pauta do campo é nossa total prioridade em 2016. Vamos continuar no campo, cumprindo nosso papel de produzir alimentos, e o governo tem que cumprir o dele de apresentar soluções para a atual situação da agricultura familiar, uma das piores da História”, exigiu Noventa.
Ele lembra que a produção camponesa movimenta todo o comércio das cidades do interior. “Se o campo não produz renda, a economia do município não sobrevive. O comércio está parado”, alertou.
A situação afeta, ainda, a sociedade da área urbana, que depende da produção de alimentos saudáveis para o consumo de suas famílias.
Noventa destaca que o governo Hartung já deveria ter decretado situação de emergência devido à seca prolongada. Em vários lugares, falta água até para o consumo humano. É a própria política de incentivo ao agronegócio do governo Hartung, como aponta a liderança, a responsável por agravar a seca no Estado. “Esta pauta precisa ser tratada com urgência”, enfatizou.
Além do MPA, aguardam sinalização do governo do Estado a Via Campesina, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem terra (MST), o Sindicato dos Trabalhadores Rurais (STR), a Federação dos Trabalhadores na Agricultura no Estado (Fetaes), as Associações de Pequenos Agricultores e as igrejas.
As entidades assinam a ampla pauta de reivindicações encaminhadas aos governos do Estado e federal – este, ao contrário da gestão estadual, já se reuniu com os camponeses por meio dos Ministérios de Desenvolvimento Agrário, da Integração Nacional e Casa Civil.
Reivindicações
A pauta de mobilização cobra, com urgência, a anistia completa das dívidas relacionadas ao crédito rural, ao invés da prorrogação, como tem feito o Banco do Brasil, já que, sem renda, as famílias não têm condições de arcar com os créditos.
Também são pontos da pauta a criação de um fundo social para socorrer as famílias, no valor de R$ 5 mil cada, com o objetivo de produzir alimentos em pequenas áreas para abastecimento dos próprios camponeses, feiras e programas de fornecimento de alimentos.
O poder público deve garantir, ainda, a compra de 30% dos alimentos dos camponeses para escolas e instituições, como determina a lei, e que a cada ano aumente em no mínimo 10% o volume de compras.
Outra demanda é a construção de barragens que atendam às necessidades do campo, sem custo financeiro às famílias, priorizando aquelas que produzem culturas alimentares para abastecimento dos mercados locais. O custo deve ser do Estado, municípios e empresas controladoras e exploradoras de água.
A médio e longo prazos, os movimentos sociais do campo cobram um sistema de crédito amplo e desburocratizado, que tenha como principal foco a produção de alimentos saudáveis. Hoje, segundo apontam, o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) mantém uma relação de dependência das famílias camponesas à indústria de insumos e máquinas, induzindo os agricultores a continuarem nas práticas atuais do modelo agrícola e na linha da monocultura – mais de 90% do crédito aplicado no Estado vai para café e pimenta-do-reino.
As entidades exigem ainda que não seja permitido o desmatamento de novas áreas no Estado e cobram o reflorestamento em todas as propriedades que garantam retorno econômico, social e sustentável para as famílias, assim como a recuperação massiva das nascentes do Estado. Também querem o pagamento por serviços ecossistêmicos-ambientais feitos pelos camponeses nas áreas em preservação e recuperação.
O governo do Estado deve criar ainda um programa amplo de troca dos sistemas de irrigação atual por sistemas mais econômicos no uso da água, com juro zero e subsídio de 50%, com 15 anos para pagar.
Em relação à água, os camponeses exigem a realização de um estudo do potencial hídrico subterrâneo no Estado; legislação para regulamentar a construção de poços; coleta e retenção das águas das chuvas dos telhados (construções) no campo e na cidade, por meio de cisternas ou tanques; e cumprimento da lei de descontaminação das águas usadas nas indústrias e comércio, antes de retornarem aos rios.
E, por fim, que seja implantada em todas as escolas da rede de ensino estadual disciplina sobre a questão ambiental e alimentar.