Demanda em 2019 era de 200 vagas apenas para extensão rural. Infraestrutura, carreira e gestão também são pauta
Uma medida de urgência e impacto pontual, que não sana integralmente nem mesmo as necessidades estruturais do principal órgão de apoio à agricultura familiar capixaba. Essa é a avaliação geral feita por servidores do Instituto Capixaba de Pesquisa, Assistência Técnica e Extensão Rural (Incaper) diante do edital do concurso público anunciado nessa segunda-feira (21) pelo governo do Estado.
O certame prevê 100 vagas para níveis técnico e superior, com salários entre R$ 3,3 mil e R$ 6,6 mil e taxas de inscrições de R$ 60 e R$ 80, respectivamente. “Serão 39 vagas para técnico em desenvolvimento rural, 33 para agente de extensão em desenvolvimento rural e 28 para agente de pesquisa e inovação em desenvolvimento rural”, detalhou o Sindicado dos Trabalhadores e Servidores Públicos do Espírito Santo (Sindipúblicos-ES).
Números, ressalta, que “atendem em parte” a demanda por concurso público feito em conjunto com a Associação dos Servidores do Incaper (Assin), que, por sua vez, é um dos itens da pauta de reivindicação apresentada ao governador Renato Casagrande (PSB). “Há outras necessidades que deveriam ter sido atendidas antes da abertura do concurso público”, afirma o Sindipúblicos.
A entidade menciona ainda a incidência feita ao diretor-presidente do Incaper, Lazaro Samir Abrantes Raslan, em que é destacada “a preocupação criada pelo trâmite dos projetos de lei complementar que intentam reestruturar carreiras de servidores. Além da insegurança gerada pelos projetos construídos sem a participação dos trabalhadores, esses não corrigem distorções históricas existentes na remuneração das diversas carreiras que compõe o quadro da autarquia”.
Recentemente, salienta, “os servidores do Incaper estiveram reunidos no Fórum Regional Estadual e estabeleceram cinco princípios norteadores”. Entre os pontos relacionados, estão a escolha dos gestores e corpo diretivo; a infraestrutura adequada de trabalho; e as condições para uma “extensão rural estratégica, multidisciplinar, plural participativa, diversa, contemporânea, digital, coletiva e que beneficie o atendimento familiar e comunitário”.
Agricultura familiar e agroecologia
Um ponto importante na crítica ao concurso lançado refere-se à falta de prioridade para a agroecologia, especialidade reivindicada especialmente pelas famílias agricultoras que anseiam apoio para libertarem-se dos pacotes de agrotóxicos embutidos em planos de produção voltados para monocultivos e commodities e querem se dedicar a produzir alimentos diversificados e saudáveis para si mesmas e para as famílias das cidades.
Atualmente, segundo análise do extensionista Fabio de Morais sobre dados do Portal da Transparência, há 629 servidores ativos no Incaper e apenas 13 dedicados a trabalhar com agroecologia e agricultura orgânica, ou seja, 2% do total.
À escassez de especialistas na produção sem venenos e com mais responsabilidade social, somam-se as dificuldades generalizadas do Incaper, como recursos minguados para combustível e diárias de viagens, o que, para um órgão que precisa atender ao cidadão em campo, em regiões afastadas das áreas urbanas e muitas vezes com estradas de baixa qualidade, quase inviabiliza o trabalho.
Mais de 400 vagas em aberto
Para além da agroecologia, fato é que as cem vagas de agora fazem cócegas na demanda geral da autarquia. Em maio de 2021, a Assembleia Legislativa aprovou em uma semana o Projeto de Lei Complementar (PLC) 8/2021 do Executivo, que extinguiu toda uma categoria de servidores por completo, a de auxiliar de Desenvolvimento Rural, estabelecendo a extinção imediata das 154 vagas em aberto na ocasião e, as 99 ainda ocupadas, na vacância, ou seja, à medida que os atuais servidores se aposentem.
Na ocasião, um manifesto divulgado pela Assin e Sindipúblicos informava que, à extinção das 253 vagas de auxiliar, somavam-se mais 169, de vários outros cargos importantes, como pesquisa e extensão rural, totalizando 422 vagas em aberto há mais de uma década. Naquele momento, o Incaper tinha apenas 520 servidores, num universo de 942 vagas originalmente existentes, antes da extinção do cargo de auxiliar.
‘Inanição’
Em agosto de 2019, o então presidente da Assim, Samir Rangel, ressaltou a analogia de que, sem concurso público há tanto tempo, “o Instituto que trabalha pela produção de alimentos pode morrer de inanição”.
Somente no tocante aos extensionistas, informou, a vacância era de mais de 200 vagas. A estimativa foi feita com base em levantamento de 2018, quanto previu-se um efetivo com menos de 576 servidores até o final daquele ano, considerando as aposentadorias em andamento.
A recomendação da Secretaria Especial de Agricultura Familiar e do Desenvolvimento Agrário (Sead), explicou, é de um técnico de Assistência Técnica e Extensão Rural (Ater) para cada 100 famílias de agricultores familiares. Assim, seriam necessários mais de 800 desses profissionais no Espírito Santo. Considerando a necessidade também de pesquisadores e de pessoal no administrativo, a vacância eleva-se bem acima dos 200 servidores. “Já temos escritórios com apenas um servidor, fazendo campo e administrativo”, disse.
Situação que, passados três anos, certamente se agravou.
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