Menos de um mês depois da morte de Augusto Ruschi, começaram os desmatamentos desenfreados em todo o Espírito Santo, inclusive em Santa Teresa, região serrana do Estado, terra natal do naturalista. As matas tinham perdido o seu principal defensor no Brasil e no mundo. Esta foi uma das lembranças do Patrono da Ecologia do Brasil, nesta sexta-feira (5), Dia Mundial do Meio Ambiente.
O centenário de nascimento de Augusto Ruschi foi lembrado em Santa Teresa, durante toda essa sexta-feira (5). Pela manhã, o governador Paulo Hartung (PMDB) esteve na solenidade de abertura, onde compareceram outros políticos.
A homenagem foi no Museu de Biologia Professor Mello Leitão, criado pelo cientista, hoje Instituto Nacional da Mata Atlântica (INMA). O evento foi iniciativa do instituto e da Associação de Amigos do MBML (Sambio).
À tarde, pessoas amigas de Ruischi reverenciaram o ambientalista. Se reuniram para uma conversa: “Um dedo de prosa sobre Ruschi – a velha guarda fala”.
Marilande Angeli (na foto acima, com os fotógrafos Rogério Medeiros à esquerda, e Paulo Bonino), sua segunda esposa, lembrou emocionada que Augusto Ruschi criou, sozinho, o Museu Mello Leitão, em 1949. E o sustentou durante toda sua vida. O museu é localizado no centro de Santa Teresa, em terreno que era da família do cientista.
Marilande não citou, mas o livro de registros do museu tem exatas 394.316 assinaturas de visitantes, marca atingida nesta sexta-feira. São visitantes de todos os estados do Brasil e de vários países, que se colocam em contato com a beleza da mata atlântica. O que por si só, dá a importância de apenas um dos trabalhos de Ruschi.
A lembrança dos desmatamentos desmesurados tão logo o cientista faleceu foi dela. Contou que ele brigava com o IBDF, o órgão ao qual cabia o licenciamento para o desmate, toda vez que ocorria alguma liberação. Como resultado desta atuação, o IBDF parou de dar tais licenças.
A morte do naturalista foi como que uma senha para liberar a destruição da floresta e de toda a sua biodiversidade. Até mesmo em Santa Teresa, onde vivia e pesquisava o cientista.
Ainda segundo o relato de Marilande Angeli, toda vez que via abertura nos morros para queimadas, Ruschi se indignava. Afirmava que a terra estava sendo ferida, e que ia cobrar. Relatou que compartilhou momentos de prazer e trabalho com o cientista. Assinalou que o projeto do naturalista era produzir dez livros, dos quais dois foram editados e a edição de um terceiro abortada, já praticamente pronta.
Ruschi escreveu dois livros sobre beija-flor, a pedido do governo do Estado, que doava exemplares a visitantes ilustres. Emocionada e causando emoção nos presentes, ela entendeu a homenagem ao cientista como um chamamento para a defesa do museu e de outros trabalhos do cientista, como as reservas biológicas Espírito Santo afora.
Exatas 103 pessoas assinaram o livro de presença no evento de homenagem a Ruschi. Presente, um de seus três filhos, Piero Angeli Ruschi (foto acima). Cientista em fase final de titulação como doutor, ele estuda o objeto de seu pai, os beija-flores.
Grande time
“Um dedo de prosa sobre Ruschi – a velha guarda fala”, reuniu um grande time. O fotógrafo Paulo Bonino, um deles. Frei José, e Angelo Zurlo, outros. Também presente o jornalista Rogério Medeiros, diretor-responsável de Século Diário, que relatou como acompanhou Augusto Ruschi por cinco décadas, e sua importância para a defesa do meio ambiente no pais.
A tarefa, primeiro do Jornal do Brasil, depois em outros jornais e revistas, durou cerca de 50 anos. Muitas das historias contadas em textos jornalísticos foram recontadas aos presentes ao evento sobre o centenário de nascimento de Augusto Ruschi. Boa parte um público jovem, ligado à Ciência.
Ângelo Zurlo destacou que Augusto Ruschi tinha tanto prestígio que falava com a rainha da Inglaterra. E que trouxe a Santa Teresa, na menos que Assis Chateaubriand, o Chatô, um dos homens públicos mais influentes do Brasil nas décadas de 1940 e 1960, destacando-se como jornalista e empresário. Foi o fundador dos Diários Associados.
Frei José (na foto abaixo, é observado por Marilande e Angelo Zulo) contou história do Guti, nome que os amigos dava a Augusto Ruschi, quando menino, entre outras. A esta época, Guti já carregava pequenos animais nos bolsos, e os estudava.
“Ruschi me conheceu menino. Me chamava Paulinho. Foi um homem correto, positivo. Não é isto que quero, dizia, se contrariado. Não ampliava as fotos que eu fazia. Me tornei fotógrafo graças a ele. Era companhia agradável”, relatou Paulo Bonino.
As homenagens na roda de conversa contou com uma ex-funcionária, a bibliotecária Ângela Vieira Abreu, e Rose Kollmann. A roda de conversa foi coordenada por Claudino de Jesus. Hélio de Queiroz Boudet Fernandes, que dirige o museu, falou ao final.
Sexo dos beija-flores
Rose Kollmann contou que assistiu a uma aula de Augusto Ruschi sobre o acasalamento dos beija-flores. Menina moça, se empolgou com o conhecimento, como suas colegas. Parecia pronta para limitar sua conversa a este ponto. Mas foi cobrada a contar toda a história.
Foi Rogério Medeiros que acabou por completar que durante o acasalamento, a fêmea assiste as evoluções de todos os machos pretendentes. Coloridos, empolgados em convencer a fêmea na escolha. Escolhido o parceiro, “na hora agá, o sexo dura três segundos”, explicou. Muitos sorrisos foram ouvidos no auditório.
Um dos presentes nas homenagens a Augusto Ruschi foi Sérgio Lucena, coordenador do programa de Biologia Animal, que oferece doutorado e mestrado, na Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes). Em entrevista, lembrou do caráter e temperamento fortes e da determinação do cientista. E também de sua visão de futuro.
O Patrono da Ecologia do Brasil nasceu no dia 12 de dezembro de 1915 e faleceu no dia 3 de junho de 1986. Foi sepultado no dia 5 de junho, coincidentemente, o Dia Mundial do Meio Ambiente.