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Como salvar as lagoas de Linhares da contaminação da Samarco/Vale-BHP?

Uma sentença judicial publicada nessa terça-feira (27) pelo juiz da Vara da Fazenda Pública Estadual e Municipal, Registros Públicos e Meio Ambiente da Comarca de Linhares, Thiago Albani Oliveira Galvêas, condenou a Samarco/Vale-BHP a tomar uma série de medidas para impedir a contaminação do complexo lacustre linharense, o segundo maior do país, com a água do Rio Doce, contaminada com rejeitos de mineração após o rompimento da barragem de Fundão em Mariana/MG, no dia cinco de novembro de 2015.

A ação – nº: 00170450620158080030 – foi impetrada pelo Município e, em novembro, já havia recebido liminar favorável. A empresa recorreu, alegando não ter mais responsabilidades a cumprir com o Município. Na decisão final, o juiz determino multa, em caso de descumprimento, de R$ 50 mil/dia, que pode ser aplicada contra as empresas controladoras, Vale e BHP Billiton.

Nesta quarta-feira (28), as primeiras medidas já estão sendo executadas, com a abertura de uma vala ao lado da barragem provisória no Rio Pequeno. A barragem definitiva, com comportas que possibilitem o controle do fluxo dos dois lados – do Rio Pequeno para o Rio Doce e vice-versa –, precisa estar concluída até o último dia útil de outubro de 2018.

Em sua sentença, o juiz Thiago Albani Oliveira Galvêas afirma que “É incontroverso que, em determinadas épocas, as barragens devem ficar fechadas, seja para se evitar o ingresso das águas supostamente contaminadas do Rio Doce, ou a saída de águas das Lagoas em período de secas, como medida mitigatória. Outrossim, também é incontroverso, que em determinados períodos o curso de água deve ficar aberto, seja para entrar a água do Rio Doce quando comprovadamente isenta de sedimentos nocivos, como pode ocorrer em épocas em que não há cheias e elevação dos materiais sedimentados, ou mesmo para escoar naturalmente a água represada nas lagoas, fazendo com que a natureza siga seu curso e ciclo naturais.

Sem segurança

As duas barragens irão substituir o sistema atual, que foi feito de forma provisória, em novembro de 2015, e funcionam sem qualquer segurança. “Não possuem nem ART [Anotação de Responsabilidade Técnica]! Nenhum técnico, nem os da Samarco, quiseram atestar“, revela Lucas Scaramussa, secretário de Meio Ambiente de Linhares.

Recentemente, a barragem provisória foi incrementada com um sistema de bombeamento que retira água do Rio Pequeno – pequeno corpo hídrico de 10 km que liga a Lagoa Juparanã ao Rio Doce, e é historicamente o responsável pelo abastecimento de água da cidade – passando por cima da barragem, com uma capacidade de 600 litros por segundo.

O volume é superior ao utilizado para o abastecimento da população, em torno de 400 litros por segundo, mas bem inferior à cota de cheia da Lagoa Juparanã, que é de 15 mil l/s. “É como esvaziar uma piscina com um balde”, metaforiza o secretário.

Esse sistema provisório e inseguro, explica Lucas Scaramussa, só conseguiu prevenir a contaminação porque estávamos, até então, passando por uma grave crise hídrica, a maior da história recente do país. Riscos de contaminação do complexo lacustre aconteceram em janeiro deste ano e uma próxima cheia, um pouco maior, pode trazer danos irreparáveis.

Hoje, Linhares e a vizinha Sooretama estão sofrendo com alagamentos, decorrentes desse sistema simplório de barragens feito pela Samarco. Grandes áreas de produção agropecuária de Linhares e áreas urbanas de Sooretama – Patrimônio da Lagoa, com 700 habitantes, às margens do Rio São José, que alimenta a Lagoa Juparanã – estão alagados, tomadas pelo transbordo do Rio Pequeno e Rio São José.

Na enchente de 2013, lembra Lucas Scaramussa, o Patrimônio da Lagoa também alagou, mas apenas com “a água barrenta do Rio Doce”. “A sorte é que o rompimento da barragem em Mariana só veio em 2015”, diz, referindo-se à contaminação com os rejeitos de mineração, que poderia ter trazido consequências muito piores. “Pontal do Ipiranga, Povoação Regência … 70 km debaixo d' água “, recorda.

Situação ainda está longe do ideal

O secretário enfatiza, no entanto, que o futuro sistema de barragens com comportas, que será construído até outubro, é a solução possível para o momento, porém, o ideal é que a Lagoa Juparanã voltasse a ter comunicação permanente com o Rio Doce, que é a situação natural.

Os municípios acima da lagoa, cerca de 14, não possuem adequado tratamento de esgoto. Esse material contaminante, portanto, está parado dentro da Lagoa Juparanã, fazendo proliferar algas, inclusive cianobactérias, o que pode prejudicar o abastecimento de água da cidade, caso a contaminação não consiga ser revertida pelas Estações de Tratamento de Água (ETAs).

Rejeitos continuam descendo o Rio Doce

As barragens da Samarco também estão produzindo impactos graves sobre o ecossistema lacustre. O isolamento da lagoa, que antes se comunicava permanentemente com o Rio Doce, interfere na piracema dos peixes, no repovoamento de algumas espécies vindas do Rio Doce, e na proliferação de algas e “apodrecimento” da água da lagoa. 

É o que destacou o juiz em seu despacho: “A Lagoa Juparanã é a maior lagoa do Brasil em volume de água doce e a segunda maior em extensão geográfica. Há 26 km de comprimento por até 5,5km de largura. No idioma Tupi, Juparanã quer dizer 'mar de água doce”. A Lagoa Nova é tão importante quanto a lagoa Juparanã para Linhares. São exatamente estas duas lagoas, além do Rio Doce, que são utilizadas para fornecer água para a população de inúmeros municípios, mas principalmente para Linhares, com a ressalva de que o Rio Doce não é atualmente opção segura para utilização da água, restando apenas as duas lagoas”.

A sentença judicial vem, portanto, reafirmar uma verdade que a empresa insiste em negar, que é o comprometimento severo da qualidade da água do Rio Doce, mesmo passados mais de dois anos do crime, insistindo que a água pode ser tratada e então consumida pela população.

O secretário Lucas até admite que seja verdade, mas, no caso das lagoas de Linhares, o fato de as águas ficarem mais represadas, potencializa os efeitos nocivos dos metais pesados e outros contaminantes dos rejeitos de mineração, que escorrem do Rio Doce e estão sendo sedimentados no fundo do leito do rio e no fundo do mar, voltando à tona a cada “ressaca” do mar ou cheia do rio. “Os rejeitos continuam armazenados em Candongas, e escorrendo pelo Rio Doce”, conclui.

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