A mobilização está envolvendo entidades representativas dos atingidos de todo o Estado: Baixo Guandu, Colatina, Linhares, Regência, Degredo, Povoação, Pontal do Ipiranga, Barra Seca, Usussuquara, Campo Grande, Barra Nova Sul, Barra Nova Norte, Nativo, Ferrugem, Ponta São Miguel, São Mateus, Barra do Sahy, Barra do Riacho, Vila do Riacho e aldeias indígenas tupiniquim de Pau Brasil, Córrego do Ouro e Comboios.
Passados 14 meses do crime, boa parte dos pescadores, ribeirinhos, trabalhadores do mar, do rio e do turismo, atingidos pela lama de resíduos de mineração e impunidade, ainda sequer recebem o auxílio emergencial de subsistência. E isso é o mínimo que se deveria ter sido providenciado às famílias que perderam parcial ou integralmente suas fontes de renda. Indenizações também já foram prometidas e proteladas incontáveis vezes.
Tampouco foram dadas respostas concretas sobre a situação da contaminação das águas e do pescado, ou sobre os problemas de saúde registrados em crianças, adultos e idosos que mais permanecem em contato com a água. Apesar das incontáveis solicitações, algumas já até judicializadas.
Cadastros infernizam a vida das comunidades
Mas incontáveis mesmo são os infames cadastros, refeitos seguidamente, infernizando a vida das pessoas, que precisam responder às mesmas perguntas, tirar fotos, provar, comprovar e … aguardar … um tempo que, considerando a urgência demandada pela fome, pelas contas, pelo aluguel … parece infinito.
“Dividir para conquistar” é talvez a única ação “eficiente” que a Samarco-Vale-VHP tem empreendido desde o rompimento da barragem de Fundão, no dia 5 de novembro de 2015. O crime jogou na cara do Brasil e do mundo, o tamanho da irresponsabilidade gerencial e incompetência técnica das empresas, ambas solidamente construídas ao longo das décadas, com conivência do Estado, e que contrastam, vergonhosamente, com as bilionárias publicidades corporativas.
Essa é uma estratégia de guerra que todas as grandes empresas sempre utilizam para enfraquecer a luta das vítimas de seus crimes socioambientais. Incitar o ódio, a disputa, a animosidade, seja entre comunidades próximas, entre setores de uma mesma comunidade e mesmo entre pessoas de uma mesma família.
Qualquer um que visitar as comunidades atingidas pode perceber isso: “a ruptura da coesão social”, como bem resumiu Joca Thomé, coordenador nacional do Centro Tamar/ICMBio. Aumentos alarmantes de crimes, violência, uso de álcool e outras drogas, um caos social. Muito triste, mas que, para a empresa, é um grande resultado, pois “distrai” as pessoas e as tira de seu foco, de lutar, organizada e unificadamente, por seus direitos.
Documento da União
Enquanto a Samarco e a Fundação Renova gastam milhões com advogados – R$ 80 milhões até agora, pelo que se sabe – e com consultorias, com reuniões e apresentações que visam a embelezar relatórios, sites e releases corporativos, milhares de pessoas passam fome, são despejadas de suas casas, entram em depressão, têm suas famílias, suas comunidades, suas vidas totalmente desestruturadas.
O pescador Carlos Roberto Zotteli é uma dessas vítimas do descaso. “Ainda bem que tenho amigos. Ganhei cinco quilos de arroz do MAB [Movimento dos Atingidos por Barragens, que tem apoiado os atingidos no ES e MG] há um mês, e ainda tem na minha geladeira. Ganhei um feijão ontem, uma buchada … faço uns bicos”, narra, em lamúrias, como tem sobrevivido nos últimos 14 meses. Roberto conta que perdeu 15 kg, entrou em depressão e passou a beber. Está com a pensão alimentícia dos filhos atrasada há sete meses e tem medo de ser preso a qualquer momento. “Nunca passei por isso. A Samarco e a Vale mataram o meu rio, acabaram com a minha vida”, chora.
A grande reunião dos atingidos, na quinta-feira (12), será na Associação Comunitária de Barra do Riacho (ACBR), a partir das 15h. A coordenadora da Comissão de Emprego e Meio Ambiente da ACBR, Joice Lopes Miranda, conta que a mobilização faz parte da pauta de luta da Associação relacionada à dramática situação em que vivem a Barra e a Vila do Riacho, pressionadas pelos empreendimentos industriais e portuários que tem se instalado na região, sendo a Aracruz Celulose (Fibria) a pioneira. “Assinamos um Documento de União, uma Comissão de Amigos, que vão lutar juntos”, anuncia.