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Corte inglesa decide em setembro se julga BHP Biliton contra crime no Rio Doce

No ES, ação defende 40 mil pessoas físicas, além de jurídicas, prefeituras, aldeia indígena e companhias de água

Leonardo Sá

A Corte britânica conclui nesta sexta-feira (31) a audiência de jurisdição que subsidia a decisão que será tomada sobre aceitar ou não fazer o julgamento da BHP Billiton pelo crime que devastou o Rio Doce em novembro de 2015, após o rompimento da Barragem de Fundão em Mariana (MG), de propriedade da Samarco, mineradora brasileira da qual as multinacionais BHP e a Vale são controladoras. 

A audiência, que teve início há oito dias, é uma espécie de duelo jurídico, onde as partes expõem seus pontos de vista sobre a viabilidade do julgamento do maior crime ambiental da história da mineração mundial ser feito no país de origem de uma das responsáveis.

A realização de julgamentos nos países originários dos réus e não apenas no território onde o fato ocorreu é prática já estabelecida pelo Direito Internacional e muito comum na União Europeia e em outros países, expõe o advogado Gabriel Gava, integrante da coordenação da ação no Espírito Santo. A Petrobras, por exemplo, foi responsabilizada nos Estados Unidos por prejuízos aos acionistas decorrentes da Operação Lava Jato. No caso do Rio Doce, a decisão da corte inglesa deve ser anunciada em setembro. 

“Estamos confiantes. Há um bom argumento quanto à ineficácia dos procedimentos da Fundação Renova para reparar as pessoas, demorado, burocrático e excludente, porque não reconhece grupos informais, como pescadores não profissionais e lavadeiras. Também não houve a participação dos atingidos na construção do programa, o meio ambiente não foi reparado e, entre os que tentaram cadastro, a maior parte não tem resposta sobre a sua indenização”, argumenta. 

A solicitação foi feita em novembro de 2018 e defende milhares de atingidos no Espírito Santo e Minas Gerais. Entre os capixabas, estão mais de 40 mil pessoas físicas, três prefeituras (Baixo Guandu, Colatina e Marilândia), uma aldeia indígena, mais de 100 pessoas jurídicas e algumas companhias municipais de água. Em solo mineiro, apenas as prefeituras são 25. O valor da ação é de cinco bilhões de libras, o que equivale a R$ 35 bilhões.

“Existe uma descrença na Justiça brasileira, onde muitos processos estão parados. O que os atingidos querem é a reparação integral e de modo efetivo e rápido”, declara Gabriel Gava.

“No nosso entendimento, a Justiça inglesa por ter um julgamento mais técnico, a partir de provas. Há mais chances de ter uma definição mais rápida e justa do processo”, explica.

A pandemia de Covid-19, ressalta, só intensifica o sofrimento dos atingidos, pois milhares deixaram de trabalhar com peixe, com comércios e serviços relacionados à pesca e ao turismo nas comunidades impactadas pelo rejeito de minérios e agora estão ainda mais fragilizados do ponto de vista econômico e de saúde. A situação, salienta, “demanda uma velocidade de atuação que não existe no Brasil”.

Além do tempo, há também os próprios entendimentos de reparação plena e os valores alcançados. As indenizações por privação de água, por exemplo, estão sendo julgadas a partir do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR) 040/2016, que definiu o teto de R$ 1 mil para cada vítima. “Às vezes um atraso em voo gera um dano moral de R$ 6 mil. E por ter ficado uma semana sem água, a indenização é de R$ 1 mil. Não tem reparação integral com um sistema desses”, acentua o advogado.

Pedro Domingos, coordenador-geral da ação no Espírito Santo, conta que a possibilidade de acionar a corte inglesa foi discutida em um painel da IV Conferência Internacional sobre Direito Ambiental, organizado pela Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Espírito Santo (OAB-ES), em junho de 2018, quando Pedro era presidente da Comissão de Meio Ambiente da Ordem capixaba.

“Naquele momento se discutiu sobre a possibilidade de o direito de reparação do dano ambiental ser imprescritível e obrigatória a regulação pelo direito internacional. Entendemos que nenhum país poderia alegar soberania para impedir reparação ambiental. Posteriormente, fizemos uma pesquisa e fomos convidados pelos sócios do [escritório internacional de advocacia] PGMBM para fazer uma ação”, relata o coordenador.

O PGMBM é uma parceria entre advogados britânicos, brasileiros e americanos, voltada a vítimas de transgressões por grandes corporações. Além dos atingidos pelo crime da Samarco/Vale-BHP, a empresa também defende milhares de consumidores afetados em todo o Reino Unido e no mundo em diversas alegações contra a Volkswagen, a British Airways, a Bayer, e outras grandes empresas multinacionais.

O município de Linhares aceitou a proposta da Renova, de R$ 5 milhões. Já Baixo Guandu, Colatina e Marilândia – aos quais foram propostos os valores de R$ 2 milhões, R$ 4,3 milhões e R$ 681 mil, respectivamente – rejeitaram a troca. Na ocasião, o prefeito de Baixo Guandu, Neto Barros (PCdoB), classificou a proposta da Renova de “indecente e ilegal”.

Os valores são tão pífios e a proposta tão coberta de imoralidade e ilegalidade, disse Neto Barros, que o escritório inglês de advocacia SPG Law propôs pagar as mesmas quantias a todos os municípios que o contrataram – mais de 25 no total – para acionar a Justiça do Reino Unido em busca de indenizações pelos danos decorrentes do crime.

Além das boas chances de serem vitoriosas, as ações podem render indenizações ainda maiores ao final, explicou o prefeito, quando então o escritório receberia o estorno dos valores pagos antecipadamente. E, caso não saiam vitoriosos, os municípios não teriam que estornar qualquer quantia ao então SPG Law.

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