Quantas toneladas de pó preto foram lançadas no período? Majeski aponta: outras CPIs já retornaram
Já são vinte meses de estagnação nas investigações sobre os termos de compromisso e licenças ambientais que legitimam a perpetuação da escandalosa poluição do ar emitida pelas gigantes da Ponta de Tubarão, Vale e ArcelorMittal.
Suspensa em setembro de 2019 pelo presidente Marcelo Santos (Podemos), a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) das Licenças continua sem atividade, ao largo de outras que reiniciaram suas atividades durante a pandemia da Covid-19. A falta de justificativa permanece, tanto para a decisão de suspensão quanto para a negativa em retornar.
Na semana em que o Espírito Santo se destacou como um dos estados que registrou maior aumento no tamanho da área desmatada de Mata Atlântica – 462% mais desmatamento entre 2019-2020 do que em 2018-2019 – o vice-presidente da CPI das Licenças, Sergio Majeski (PSB), reclama: mais um pedido de retomada das investigações continua sem reposta.
“No dia 14 de maio formalizei um requerimento para a retomada das reuniões ordinárias da CPI das Licenças, paralisadas em setembro de 2019. Embora a pandemia tenha prejudicado os trabalhos no último ano, outras CPIs e comissões já retornaram às atividades em 2021, demonstrando que é possível também a volta da CPI das Licenças”, argumentou o parlamentar.
O pedido, importante ressaltar, foi feito dois dias após a Comissão de Meio Ambiente da Assembleia Legislativa receber a ArcelorMittal para a apresentação dos investimentos de controle ambiental feitos no âmbito do Termo de Compromisso Ambiental (TCA) firmado em 2018 com o governo do Estado e o Ministério Público Estadual (MPES). Na ocasião, a siderúrgica afirmou que 76% das metas previstas até setembro deste ano já estão cumpridas, “resultado de R$ 40 milhões em investimentos”. Uma semana depois, foi a vez da Vale se apresentar e exaltar suas ações, sem as necessárias contestações dos deputados estaduais.
Nascida morta
A CPI foi criada em fevereiro de 2019 para investigar denúncias de irregularidades relativas às licenças ambientais e aos TCAs que, supostamente, deveriam forçar uma redução na emissão de poluentes a partir do Complexo Industrial de Tubarão.
Em abril, no entanto, Marcelo Santos incluiu duas pautas sem absolutamente nenhuma relação com o foco único dos trabalhos: “a forma como o Instituto Estadual de Meio Ambiente (Iema) libera projetos a serem executados e também investigar irregularidades na emissão dos chamados Documentos de Origem Florestal (DOF) e a possível inexistência de regular fiscalização do órgão responsável por isso, o Instituto de Defesa Agropecuária e Florestal (Idaf), segundo define correspondência oficial da Assembleia Legislativa.
Mas desde a sua criação, a tentativa de sufocá-la na prática foi explícita, quando os parlamentares articularam para não permitir a participação mais ativa de Majeski, negando-lhe a presidência, como seria o natural, considerando o histórico da Assembleia Legislativa, que costuma delegar ao deputado proponente o cargo máximo ou, ao menos, a relatoria. “Me colocaram como vice, que não quer dizer nada, é praticamente como um membro comum da CPI”, criticou, na época, o deputado.
Em seguida, prossegue, o presidente, Marcelo Santos inseriu o tema das licenças gerais, incluindo operações do Instituto de Defesa Agropecuária e Florestal (Idaf). Algo completamente arbitrário, visto que o objetivo da Comissão é investigar a Vale e a ArcelorMittal. “Desde o começo a gente já sentia manobras no sentido de fugir do foco do que é realmente necessário”, afirma.
ES estagnado no segundo ciclo de desenvolvimento
E ao proteger as poluidoras, as elites políticas e econômicas que subjugam o Espírito Santo continuam a aprisionar o Estado num ainda eterno segundo ciclo de desenvolvimento. “São 50 anos de um modelo econômico baseado numa industrialização retardatária, com uma produção que depende muito de matéria-prima não renovável. Setenta por cento do nosso PIB [Produto Interno Bruto] vem da Petrobras, Vale, ArcelorMittal e Suzano [dona da antiga Aracruz Celulose e Fibria]. Com exceção da Suzano, todas as demais têm como matéria-prima insumos não-renováveis”, explanou, há um ano, o economista e professor aposentado da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) Arlindo Villaschi.
Aprisionam o Estado e se enredam numa trama em que elas próprias são subjugadas, como pondera o também professor da Ufes Ueber José de Oliveira, autor do livro o livro Elites Capixabas no Golpe de 64 – o Bipartidarismo e a convergência de agendas desenvolvimentistas (1964-1982). “As elites capixabas perderam parcialmente o controle da agenda político-econômica, hoje controlada pelas empresas vinculadas aos grandes projetos e capital estrangeiro”, expõe.