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Criadores propõem regras para manejo de abelha sem ferrão

Ganham as abelhas, ganha a Mata Atlântica, ganham as lavouras, ganham os meliponicultores, ganham os jardins e hortas urbanas, ganham os consumidores. Criar abelhas sem ferrão (ASF) é uma atividade que só traz benefícios. Tem crescido e, por isso, precisa de regulamentação própria.

Com a meta de propor regras específicas para o manejo da Melipona capixaba, a Associação de Meliponicultores do Espírito Santo (AME-ES) realizou consulta pública no último dia 24 de junho. O objetivo é favorecer a sua conservação, visto que a Melipona é endêmica do Espírito Santo – só ocorre aqui e em nenhum outro lugar do planeta – e classificada como “em perigo” na lista vermelha nacional.

A ordenação legal da atividade é urgente. A Resolução nº 346/2004, do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), é a principal norma legal a orientar minimamente o manejo das Meliponas no Brasil, mas não faz qualquer direcionamento para as especificidades da espécie capxiaba.

Tampouco há legislação estadual ou mesmo um único meliponário licenciado pelo Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Iema). Cresce, no entanto, o interesse dos capixabas, seja para como hobby e terapia, seja pelo seu potencial econômico.

Das cerca de 300 espécies de ASF brasileiras, 45 delas, aproximadamente, ocorrem no Espírito Santo. Mas os números são subestimados, ressalva o engenheiro agrônomo Ricardo Braga, e membro da AME-ES. A entidade foi criada em agosto passado e reúne cerca de 50 meliponicultores.

Serviços ambientais

“Nossa meta é reconhecer as ASF como prestadoras de serviços ambientais diretos e indiretos, bem como reconhecer o Meliponicultor comercial, hobbysta ou conservacionista, como um parceiro na conservação do meio ambiente local e regional, em função dos relevantes serviços ambientais prestados pelas abelhas nativas sem ferrão”, explana Ricardo.

Os associados da AME-ES criam, em meliponários urbanos e rurais, aproximadamente 23 diferentes espécies de abelhas sem ferrão. Especificamente da M. capixaba, sabe-se que existem apenas dois meliponicultores conservacionistas.

A espécie vive em uma região muito pequena – possivelmente a menor área de ocorrência dentre todas as abelhas sem ferrão – estando restrita à Floresta Ombrófila Densa e Floresta Ombrófila Aberta, duas fitofisionomias da Mata Atlântica, numa altitude preferencial acima de 600 metros e temperatura média anual entre 18º e 23º, na região serrana do estado, limitando-se com o Caparaó. Há suspeitas de que ela seja originária também do Caparaó, ou que pode ser levada a povoar a região com sucesso, devido às semelhanças de clima, geografia e características da floresta.

Respeitar essa área de ocorrência – para a criação, venda e transporte de colônias e discos – é uma das proposições levantadas na consulta pública da AME-ES. Fora desse polígono, somente a criação para fins científicos, desde que autorizada pelos órgãos competentes.

Hibridação e outras ameaças

A AME-ES também propõe que o produtor deva deixar um quinto das colônias sem manejo de divisão ou coleta de mel, para possibilitar enxameamento para a natureza, de preferência em área legalmente protegida. Entre outras recomendações.

A Uruçú Nordestina (Melipona scutelaris) foi outra espécie alvo dos estudos da AME-ES, visando evitar sua expansão no território capixaba e consequente hibridação com a Uruçú capixaba, o que é uma das principais ameaças à espécie endêmica do Espírito Santo. Nesse sentido, a principal recomendação é pela proibição de criação e venda de colônias e discos da M. scutelaris nos locais onde ocorrem e onde se propõe expandir a ocorrência da M. capixaba.

 
Outras ameaças à Uruçu capixaba são o desmatamento, os agrotóxicos e transgênicos e a retirada dos ninhos na natureza, além da “legislação castradora”, que inibe a expansão da meliponicultura responsável.

Ricardo ressalta que, pelo fato da espécie estar em risco de extinção, boa parte da diversidade genética existente está nos meliponários. “Portanto as colmeias nos criadouros são importante fonte de variabilidade genética para a reintrodução em áreas de conservação”, diz.

Todo mundo ganha

A meliponicultura traz benefícios não só para as próprias abelhas sem ferrão, mas também para a floresta, os produtores os consumidores, as lavouras e as hortas e jardins urbanos.

As ASF são as principais polinizadoras da Mata Atlântica, sendo que algumas espécies de árvores são polinizadas exclusivamente por uma única espécie de ASF. As Apis, abelhas europeias e africanizadas, pousam sobre as flores, conta Ricardo, mas não necessariamente a estão polinizando. Além disso, por serem mais agressivas e predadoras das nativas, essas abelhas exóticas acabam prejudicando duplamente o potencial de polinização das espécies da Mata Atlântica.

Quanto às lavouras, no campo, e mesmo as hortas e jardins urbanos, a polinização promovida pelas abelhas nativas, sem ferrão, também melhora enormemente a produtividade e a qualidade dos grãos, frutos, flores ou outros itens produzidos.

Finalmente, o ser humano se beneficia de várias formas do manejo das gentis Meliponas. Como hobby, lazer ou terapia, a meliponicultura é excelente. Para o consumidor, o mel produzido é de qualidade superior, seja pelo sabor, valor nutricional – mais nutrientes e menos açúcar – seja em função das propriedades medicinais – cura e prevenção de diversas doenças.

Financeiramente também a atividade é um excelente negócio, pois o mel das jataís e uruçús é muito valorizado no mercado, cuja demanda só cresce e os preços estão em torno de R$ 100,00 a R$ 150,00 o litro.

Regulamentação

As propostas para regulamentação da criação da Melipona capixaba, elaboradas durante a consulta pública da AME-ES no dia 24 de junho, serão enviadas para os órgãos regulamentadores em nível federal, estadual e municipais.

Outros coletivos de Meliponicultores, em nível federal, também deram primeiros passos visando a regulamentação da atividade, a partir de 2012, com propostas que devem ser encaminhadas para o Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama) nos próximos meses. 

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