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Acordo de repactuação é rejeitado por 67% dos municípios atingidos 

Prazo para adesão termina e prefeituras apostam na justiça internacional 

Leonardo Sá

Dos municípios reconhecidos como atingidos pelo crime da Samarco/Vale-BHP no Espírito Santo e Minas Gerais, 67% rejeitaram as condições estabelecidas pelo acordo de repactuação. Ao final do prazo estabelecido, apenas 16 de 49 prefeitos formalizaram a adesão até a manhã desta quinta-feira (6). 

Homologado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em novembro de 2024, os termos da repactuação foram definidos na mesa de negociação conduzida pelos governo federal, os estados de Minas Gerais e Espírito Santo, Ministério Público Federal (MPF), Defensorias Públicas dos estados, Defensoria Pública da União (DPU) e pela Justiça Federal, sem a participação direta das prefeituras e das populações atingidas.  

O acordo prevê o repasse de aproximadamente R$ 132 bilhões em indenizações, programas e projetos de reparação social e ambiental, além de obras de infraestrutura. No entanto, prefeitos das cidades atingidas discordam das condições estabelecidas, especialmente quanto aos valores e prazos de pagamento, que se estendem por 20 anos.  

Dos onze municípios capixabas reconhecidos como atingidos, seis assinaram a repactuação: Anchieta, Fundão, Serra, Linhares, Conceição da Barra e São Mateus. Entre os demais, Aracruz, Baixo Guandu, Colatina e Marilândia optaram por continuar ações judiciais contra a BHP na Inglaterra, que foi abandonada apenas por Conceição da Barra e São Mateus, devido à cláusula do acordo que impede as cidades que aderirem a permanecerem com ações no exterior contra as mineradoras responsáveis pelos danos. Já Sooretama tem processo em andamento na Holanda contra a Vale.  

Em Minas Gerais, dez municípios aceitaram os termos do acordo: Pingo D’água, Bugre, Caratinga, Ponte Nova, Iapu, Santana do Paraíso, Marliéria, Córrego Novo, Sobrália e Rio Casca.  

O coordenador jurídico do Fórum Permanente dos Prefeitos da Bacia do Rio Doce, Samuel Lomas Santos, afirma que os prefeitos foram excluídos das negociações, o que é considerado um desrespeito às prefeituras e às populações locais.  Ele explica que as prefeituras reivindicaram 11% do valor do acordo, tendo como base o rompimento da barragem de Brumadinho, mas receberam apenas 4% a ser dividido entre os 49 municípios, com pagamentos anuais ao longo de 20 anos. 

Além disso, as prefeituras teriam que assumir a execução de programas e projetos não realizados pela Fundação Renova, que será extinta com a assinatura do acordo, transferindo à Samarco a responsabilidade pela intermediação com os municípios. Há preocupação sobre se os prazos estabelecidos para a conclusão das obras serão compatíveis com os trâmites legais de licitação e execução de projetos públicos e se os valores pactuados serão suficientes para finalizar as iniciativas previstas. 

A procuradora-geral de Marilândia, Isadora Junca do Carmo Pandini, criticou a falta de consideração às demandas municipais no processo de negociação, apesar de os problemas socioambientais afetarem diretamente essas localidades. “Os municípios foram os mais impactados, lidam diretamente com os atingidos e não foram ouvidos. A proposta da repactuação não atende às nossas necessidades. O que nos resta é confiar na ação na Inglaterra, onde os valores debatidos refletem melhor os danos reais sofridos”, afirmou. 

Ela também destacou que boa parte das indenizações será destinada aos governos federal e estaduais, enquanto as prefeituras continuam arcando com o aumento de despesas em áreas como saúde e infraestrutura. “Nosso município receberia apenas R$ 39 milhões ao longo de 20 anos, o que equivale a R$ 2 milhões anuais. Esse valor não gera impacto significativo no orçamento nem cobre os danos que sofremos”, ressaltou. Em sua avaliação, os valores pleiteados na Inglaterra oferecem uma reparação mais justa e com prazo de pagamento mais adequado. 

O rompimento da barragem de rejeitos da Samarco, controlada pela Vale e BHP, em 5 de novembro de 2015, resultou na liberação de 40 milhões de metros cúbicos de rejeitos de mineração, matando 19 pessoas e impactando mais de 2,5 milhões de pessoas em três estados. Os rejeitos percorreram 684 km do Rio Doce até alcançarem o mar em Regência, em Linhares. Até hoje, os atingidos sofrem com a desestruturação social e política, além das perdas ambientais e econômicas.

Nenhum dos réus envolvidos no crime da Samarco/Vale-BHP foi punido criminalmente. Dos 26 acusados inicialmente, 15 foram excluídos da ação penal, e a lentidão do processo pode levar à prescrição. Enquanto isso, os julgamentos internacionais na Holanda e na Inglaterra surgem como uma esperança para a responsabilização das empresas.

Final do julgamento

O julgamento na corte inglesa sobre a responsabilidade da mineradora BHP pelo colapso da barragem de Fundão, em Mariana (MG), em 2015, começou em outubro do ano passado e foi retomado nesta semana para as alegações finais. Entre os dias 5 e 13 de março, os advogados das vítimas apresentarão seus argumentos, enquanto a defesa da BHP fará sua manifestação entre os dias 10 e 12. A expectativa é que a juíza responsável pelo caso, Finola O’Farrell, anuncie a sentença até o meio do ano.

A ação coletiva, movida por aproximadamente 620 mil pessoas que reivindicam indenizações de até R$ 230 bilhões, contou com o depoimento de sete testemunhas que ocuparam cargos estratégicos na BHP. Durante o julgamento, os réus foram questionados sobre o grau de controle da empresa sobre a barragem, o conhecimento prévio sobre falhas na estrutura e as medidas adotadas após o crime. Além disso, a corte ouviu especialistas brasileiros em direito civil, societário e ambiental, uma vez que o julgamento se baseia na legislação do Brasil, assim como especialistas em geotecnia.

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