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Protestos contra o governo federal marcam último ato do acampamento indígena

Delegação do Espírito Santo, com quase 130 indígenas, volta de Brasília neste sábado

Alass Derivas/Apib

Na manhã desta sexta-feira (27), indígenas acampados em Brasília realizaram novos protestos contra o governo federal e projetos que ameaçam os povos originários no País. Segundo a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), este foi o último ato público do acampamento Luta Pela Vida que, desde domingo (22) reuniu mais de 6 mil pessoas, sendo quase 130 do Espírito Santo.

Nos atos, os indígenas carregavam faixas com os dizeres “fora genocida”, em referência ao presidente Jair Bolsonaro, além de queimarem um caixão de dez metros em frente ao Palácio do Planalto, com dizeres contra a tese do Marco Temporal. Para a tarde e à noite, a programação do acampamento ainda prevê a leitura do documento final da mobilização, o Pacto Pela Vida.

A delegação de Aracruz retorna ao Estado neste sábado (28), data prevista para encerramento da programação do acampamento. O grupo, que saiu do norte capixaba em três ônibus, partirá de Brasília às 6 horas.

Apesar do encerramento da programação neste sábado, algumas delegações de outras partes do País permanecerão acampadas, diante da suspensão do julgamento do Marco Temporal no Supremo Tribunal Federal (STF). A Corte chegou a ler o relatório inicial da ação nessa quinta-feira (26), mas a análise só será retomada na próxima quarta (1º).

Allas Derivas/Apib

 Em entrevista ao Século Diário logo após a suspensão do julgamento, o coordenador-geral da Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo (Apoinme), Paulo Tupinikim, demonstrou preocupação com as dificuldades financeiras para manutenção dos povos indígenas no acampamento. “Vamos traçar estratégias para nos mobilizar em nossas bases e avaliar o que vamos fazer, porque o pessoal já está bastante cansado também”, disse.

Após a volta ao Espírito Santo, a ideia é conversar com os caciques de Aracruz para decidir se haverá alguma mobilização local na próxima quarta-feira, dia da retomada da ação do Marco Temporal no STF. “Infelizmente eles estão querendo nos cansar, mas iremos continuar na luta”, garantiu Renato Tupinikim, da aldeia Caieiras Velha.

Para ele, que participa das edições do Acampamento Terra Livre (ATL) desde 2008, as mobilizações deste ano tiveram um significado ainda maior. “O acampamento ficou marcado pela organização dos próprios povos indígenas de vim para Brasília em plena pandemia. As marchas nos fortaleceram a cada dia”, aponta.

Maior mobilização pós-constituinte

Contanto com a participação de mais de 175 povos de diversas partes do País, o acampamento intitulado “Luta Pela Vida” é apontado como a maior mobilização indígena desde 1988. Foram mais de 6 mil manifestantes denunciando a agenda anti-indígena do governo federal, em plenárias, vigílias em frente ao STF, e protestos e atos culturais.

Uma das principais pautas do acampamento era o julgamento do Marco Temporal. O Recurso Extraordinário (RE) 1017365 estava na pauta das sessões do Supremo desde a última quarta-feira (25), mas não foi analisado sob alegação de uma outra ação que também estava na agenda da Corte. Nessa quinta, o ministro Luiz Fux, presidente do STF, afirmou que a suspensão era necessária em razão do número de sustentações orais [39] previstas para o caso.

Na prática, o recurso trata da ação de reintegração de posse movida pelo governo de Santa Catarina contra o povo Xokleng, referente à Terra Indígena (TI) Ibirama-Laklãnõ. No entanto, a ação tem repercussão geral, o que significa que servirá de parâmetro para outras 82 decisões no País.

Apib

Os possíveis impactos no futuro da demarcação de terras em todo o Brasil é o que motiva os pedidos de rejeição do Marco Temporal por parte dos indígenas. Caso a tese seja aprovada, só seriam consideradas terras indígenas os territórios que estavam sob sua posse no dia 5 de outubro de 1988, quando a Constituição foi promulgada. A medida afetaria, no Espírito Santo, terras demarcadas em 1998, 2002 e 2008, após intensa luta com a atual Suzano – ex-Aracruz Celulose e ex-Fibria.

Entidades argumentam que a tese é injusta por desconsiderar todas as violências sofridas pelos povos originários até a promulgação da Constituição, o que inclui remoções forçadas e expulsões. “Além disso, ignora o fato de que, até 1988, eles eram tutelados pelo Estado e não podiam entrar na Justiça de forma independente para lutar por seus direitos”, apontou uma nota da Apib.

Após a suspensão do julgamento nesta quinta, uma nova nota divulgada pela entidade afirmava que “a luta pela vida é incansável”.

“Pelo 3º dia consecutivo, os povos indígenas no Acampamento #LutaPelaVida percorreram toda a esplanada para acompanhar o julgamento do Marco Temporal no STF. E pela quinta vez, em dois meses, o julgamento foi adiado. Mas são 520 anos de resistência”, declara o texto.

Outra pauta do acampamento Luta pela Vida foi o Projeto de Lei 490/07, que tramita na Câmara dos Deputados e teve o texto-base aprovado na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ) em junho. Além de inserir a tese do Marco Temporal, o texto abre escopo para a instalação de bases, unidades e postos militares, expansão da malha viária, e exploração de alternativas energéticas em territórios indígenas, tendo como base a “política de defesa e soberania nacional”.

O projeto já havia sido alvo de protestos em Aracruz no mês de junho. Representantes dos povos Tupinikim e Guarani percorreram o centro do município denunciando a gravidade da matéria. “Um povo sem território, é um povo sem vida, pois não tem como exercer sua cultura, sua crença, seus diferentes modos de vida e de agir sobre o território […] Quando se toca no nosso território tradicional, toca na nossa vida, se toca na nossa sobrevivência, se toca na nossa identidade”, disse a professora indígena Andrea Cristina Almeida na ocasião.

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