O deserto verde quase dobrou de tamanho no Espírito Santo em menos de quatro décadas. A conclusão vem dos dados sistematizados pela iniciativa MapBiomas, que também apontou um aumento ainda maior em âmbito nacional no mesmo período, entre 1985 e 2021, quando a área ocupada com silvicultura aumentou em quase seis vezes.
No Estado, o monitoramento parte da marca de 93 mil hectares de plantios de eucalipto em 1985, registrando um aumento contínuo ano após, chegando a 125 mil ha em 1990 e saltando (o primeiro grande salto) para 141,6 mil em 1991 (13% a mais).
Em 1992, ano da ECO 92, ainda um leve crescimento, alcançando 143,7 mil. No ano seguinte, no entanto, há uma queda importante, baixando a área de silvicultura para 135 mil (7% a menos). O comportamento de redução anual se mantém, de forma leve, por nove anos, quando, em 2003, os monocultivos chegam a 129,5 mil.
Em 2004 ocorre o segundo salto, que eleva a área de deserto verde para 135,7 mil hectares (4% mais) e inaugura um período de oito anos de contínuos aumentos significativos, chegando a 168,3 mil ha em 2011 (24% mais que em 2004).
Somente em 2012 ocorre uma nova queda, porém menos aguda e mais curta, de apenas dois anos. É o ano de realização da Rio+20 e de publicação do Novo Código Florestal, estabelecendo um marco de regularização ambiental. Os números nesse biênio são 165,4 mil ha em 2012 e 161,7 mil ha em 2013.
Em 2014 o aumento é retomado, mantendo-se até os dias de hoje. Inicialmente tímido, em cerca de 1 mil hectares por ano, a partir de 2017 se acentua e volta a ser menos agressivo durante a pandemia, em 2020 e 2021. Veja: 162,1 mil em 2015; 163,5 mil em 2016; 166,5 mil em 2017; 173,7 mil em 2018; 179,4 mil em 2019; 181,3 mil em 2020; e 181,5 mil em 2021 (12% mais deserto verde em 2021 que em 2013).
Entre 1985 e 2021, portanto, o crescimento total da área ocupada com plantios de eucalipto no Espírito Santo foi de 95%, saltando de 93 mil hectares para 181,5 mil. Quase o dobro de deserto no Estado em 37 anos.
Uso do solo que mais cresce no ES
A série histórica retratada pelo MapBiomas mostra pela primeira vez o comportamento geral da expansão da silvicultura no Brasil durante quase quatro décadas, com dados por bioma, estado e município, sendo uma fonte privilegiada de estudo da dinâmica do deserto verde nos diferentes territórios onde ele se estabelece.
E corrobora o comportamento captado pelo Atlas da Mata Atlântica do Espírito Santo, lançado em 2018 pelo governo do Estado, por meio do Programa Reflorestar, com análise da área plantada com monocultivos de eucalipto no Espírito Santo entre 2007-2008 e 2012-2015.
Segundo a publicação, “a eucaliptocultura foi a atividade que mais cresceu, passando de 5,8% (2007/2008) para 6,8% (2012/2015), o que representa um aumento efetivo de 45.341,9 hectares em sua área plantada”.
Mais de 300 mil hectares
A conversão dos pontos percentuais para área em hectares mostra, no entanto, a diferença entre os dois estudos. O Atlas aponta crescimento de um ponto percentual entre 2007 e 2015, equivalente a 45,3 mil hectares. Uma regra de três simples chega a uma área total de 308,3 mil hectares de eucaliptais em 2015.
Considerando que – conforme observou o gerente do Reflorestar, engenheiro florestal Marcos Sossai – a dinâmica do mudanças do uso do solo no Estado se manteve até 2020, quando foi feito novo imageamento (ainda não publicado), é razoável considerar que os monocultivos continuaram se expandindo, dinâmica mostrada pelo MapBiomas. Em quanto? Só a segunda edição do Atlas para precisar, mas certamente maior que os 181,5 mil hectares medidos pelo levantamento nacional.
A diferença entre os dois números absolutos se deve à escala das imagens captadas por cada um, explica o coordenador técnico do MapBiomas, Marcos Rosa. “Nós usamos o LandSat de 30 metros. O Atlas é de um metro ou menos”, compara.
Seis vezes mais no Brasil
Na análise geral dos dados do Brasil, a silvicultura também é destacada, tendo aumentado em quase seis vezes, enquanto a agricultura triplicou de tamanho. Conforme o MapBiomas, em 2021, a agricultura ocupava 62 milhões de hectares, três vezes mais que os 19 milhões mapeados em 1985. Já a silvicultura passou, no mesmo período, de 1,5 milhão de hectares para quase 9 milhões de hectares mapeados em 2021 – uma expansão de 598% ao longo de 37 anos.
O estudo também mostra que os municípios com mais de mil hectares de silvicultura passaram de 250 em 1985 para 1.052 em 2021. Ou seja, 802 municípios incorporaram a atividade em menos de quatro décadas. Segundo o mapeamento, o bioma com maior área proporcional dedicada a plantios de árvores é a Mata Atlântica, com 4%, seguido de perto pelo Pampa (3,9%) e pelo Cerrado (1,6%).
O levantamento identifica ainda em que tipos de terrenos os monocultivos são instalados. Segundo os dados levantados em âmbito nacional, envolvendo a Mata Atlântica, Cerrado e Pampa, no período de 1985 a 2020, “a origem das áreas convertidas para silvicultura foi equivalente entre áreas naturais e antrópicas. Entretanto, houve uma estabilização da conversão sobre áreas naturais e aumento da conversão sobre áreas antrópicas, sobretudo entre 2006 e 2015”.
Lavouras temporárias
Esses e outros dados são do mais recente levantamento do MapBiomas, feito a partir de imagens de satélite e classificação automatizada.
A quase totalidade da área cultivada no Brasil é de lavouras temporárias, como soja, arroz, cana-de-açúcar, algodão e outras culturas. Juntas, elas ocupam quase 60 milhões de hectares – extensão superior a de países como França e Espanha. A expansão nos últimos 37 anos foi de 3,3 vezes, passando de 18,3 milhões de hectares em 1985 para 59,9 milhões de hectares em 2021. O crescimento se deu principalmente nos biomas Cerrado e Pampa. No entanto, também houve um avanço no bioma Amazônia, abrangendo municípios dos estados do Amazonas, Rondônia, Acre, Roraima e Pará.
Novo Código Florestal
De forma geral, entre 1985 a 2021, a expansão da agricultura se deu majoritariamente sobre áreas de pastagens e já previamente antropizadas. Após a definição do marco de regularização ambiental de 2008 pelo Código Florestal de 2012, houve um aumento de conversão de áreas de pastagem para agricultura temporária, nos biomas Amazônia e Cerrado.
Por exemplo, entre 1996 e 2008, na Amazônia, cerca de 1 Mha de pastagem foram convertidos para agricultura temporária, e no Cerrado, cerca de 5 Mha. Já entre 2009 e 2021, na Amazônia, a conversão da pastagem para agricultura foi três vezes maior, enquanto no Cerrado esse aumento foi cerca de 1,12x após o marco temporal de 2008.
Acesso público e gratuito
O MapBiomas é uma iniciativa multi-institucional, que envolve universidades, ONGs e empresas de tecnologia, focada em monitorar as transformações na cobertura e no uso da terra no Brasil, para buscar a conservação e o manejo sustentável dos recursos naturais, como forma de combate às mudanças climáticas. Todos os dados, mapas, métodos e códigos do MapBiomas são disponibilizados de forma pública e gratuita no site
mapbiomas.org.