Luiz Bandeira Filho visitou Foz do Rio Doce e diz que CNJ quer ver restabelecido o modo de vida dos atingidos
“Eu acredito que em menos de noventa dias, por volta de julho, nós teremos uma resposta a dar às comunidades [sobre as demandas relacionadas à reparação dos danos]”. A previsão foi anunciada na tarde desta quinta-feira (28) pelo conselheiro do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) Luiz Fernando Bandeira de Mello Filho, durante visita à Foz do Rio Doce, em Linhares, norte do Estado.
Em sua passagem pelo Espírito Santo, o conselheiro realizou três reuniões comunitárias, em Povoação, Regência e Comboios, com a participação de representantes da Defensoria Pública Estadual (DPES), Ministério Público Estadual (MPES), Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), do governo estadual e da Prefeitura de Linhares.
“Nós precisamos buscar um tipo de reparação pelo dano moral que as pessoas tiveram, por terem perdido seu lazer, sua vida no rio, mas também temos danos à saúde, aos imóveis, propriedades, lavouras, atividades turísticas. E é importante que esse processo de reparação busque trazer de volta a essas pessoas sua qualidade de vida, na verdade, ter o seu modo de vida restabelecido. Para isso que estamos trabalhando”, declarou Luiz Fernando.
“Claro que haverá dificuldades”, afirmou. “Existe um dano ambiental evidente, que teremos que conviver com ele por muito tempo ainda, mas pelo menos tentar reparar na medida do possível”.
O conselheiro ressaltou que “o CNJ não tem poder de decisão nessa matéria” e que a “missão” é ouvir as comunidades e levar suas vozes para a mesa de repactuação. “E, lá, tentar construir um acordo que atenda a essas preocupações. Essa é nossa missão e eu tenho fé que a gente vai conseguir chegar lá”.
Em cada uma das três reuniões, foi aberta falas de dois minutos para dez atingidos, para contemplar várias especificidades do território. Uma pauta comum a todas as comunidades, no entanto, foi apresentada pelo Conselho da Foz do Rio Doce, formado por pelas comissões de atingidos da região, além de associações de moradores, pescadores, comércio, cultura, artesanato, agricultura, turismo e surf de Regência, Povoação, Entre Rios, Areal, Comboios, Degredo e Pontal do Ipiranga, todas em Linhares.
Legitimidade
“O Conselho é deliberativo, está sendo construído desde 2018 e tem participado das Câmaras Técnicas do CIF [Comitê Interfederativo, instância responsável por fiscalizar a execução das ações de reparação e compensação conduzidas até o momento pela Fundação Renova]”, destacou Luciana Souza de Oliveira, representante da Comissão de Atingidos de Regência e Entre Rios e de grupos produtivos de Regência dentro do Conselho da Foz.
O primeiro ponto das reivindicações apresentadas, relatou, é o pedido para que o CNJ não considere a Comissão de Atingidos de Linhares, criada no início de 2020 de forma ilegal por um escritório de advocacia de Baixo Guandu.
“Não reconhecemos a comissão municipal de atingidos de Linhares. Nossa singularidade está contemplada no TTAC [Termo de Transação e Ajustamento de Conduta, firmado em março de 2016 entre a União, os estados e as empresas Samarco/Vale-BHP, estabelecendo 42 programas de reparação e compensação dos danos do crime], não precisamos de nenhuma entidade externa para nos representar”, afirmou Luciana.
Também relacionado às comissões ilegais, o Conselho da Foz pediu que o CNJ cobre dessas comissões uma resposta sobre o porquê delas exigirem a substituição das assessorias técnicas escolhidas pelas comunidades e suas respectivas comissões legítimas de atingidos.
Outros pontos apontaram a necessidade de reconhecimento dos surfistas de Regência como atingidos e o cumprimento, pela Fundação Renova, da Deliberação 58/2017 do CIF, que reconhece novas áreas atingidas ao norte de Povoação, como Pontal do Ipiranga.
Há pautas também relacionadas à saúde, incluindo a realização de um estudo toxicológico, com análises clínicas de urina, fezes, cabelo e unha dos atingidos, para verificar a presença, no corpo dos atingidos, de contaminantes já identificados no rio, mar, solo e nos pescados.
Em relação às compensações econômicas, o Conselho da Foz pede que seja retomado o pagamento do Auxílio Financeiro Emergencial (AFE) cortado ao longo do último ano pela Renova, além do início do pagamento do lucro-cessante, reafirmando repúdio que já havia sido feito no início de março. “Pouca gente recebeu o lucro-cessante”, conta Luciana Oliveira
Por fim, o Conselho também pede que os atingidos tenham cadeira na Mesa de Repactuação liderada pelo CNJ, já que, até o momento, somente as empresas criminosas e os órgãos de governo e de Justiça estão com presença garantida nas negociações.
Compromisso
A visita aos territórios atingidos, no Espírito Santo e Minas Gerais, havia sido anunciada há um mês pelo conselheiro Luiz Fernando, durante reunião realizada em Brasília a pedido da Comissão Externa da Câmara dos Deputados, responsável por acompanhar o processo de repactuação.
Dias depois, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) e do CNJ, ministro Luiz Fux, se comprometeu a incluir as reivindicações dos atingidos na pauta da repactuação, durante outra reunião da Comissão Externa, que teve presença do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB).