Ato em Aracruz teve início nesta quinta-feira e integra Jornada Nacional de Lutas

Mais de mil mulheres do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) ocupam uma área pertencente à empresa Suzano (ex-Aracruz Celulose e ex-Fibria) no município de Aracruz, no norte do Estado. O movimento teve início às 4h30, em frente à entrada da Vila do Riacho, e faz parte da Jornada Nacional de Luta das Mulheres Sem Terra, que ocorre desta quinta-feira a domingo (13 a 16) em todo o Brasil, para denunciar a violência do agronegócio e reivindicar a reforma agrária.
A Suzano, uma das maiores multinacionais do setor de papel e celulose, adquiriu a antiga Aracruz Celulose, acusada de grilagem de terras desde quando se instalou na região, ainda na década de 1970, durante a ditadura militar. O MST aponta degradação, concentração fundiária e violência contra povos tradicionais promovidos pela empresa, responsável por uma série de crimes, como “roubo de água, desvio e morte de rios, perda de diversidade, e uso de agrotóxicos associados ao câncer”. Destaca, ainda, que a empresa mudou de nome ao longo dos anos, mas o modelo devastador permanece.
“A lógica do agronegócio está presente no Brasil inteiro, por isso mulheres do Rio Grande do Sul, do Nordeste, do Norte, todas estão em luta porque essa empresa e esse modelo estão ramificados pelo país”, destacou a dirigente nacional do movimento no Espírito Santo, Lia.

Atualmente, há 22 áreas em conflito com a Suzano no Brasil, sendo seis no Espírito Santo. “No caso capixaba, muitas das terras eram áreas públicas, cedidas pelo governo ao mesmo grupo que permanece no comando da empresa. Nunca houve devolução dessas terras, apenas expansão”, denunciou a dirigente. De acordo com o MST, essas terras deveriam ser destinadas à reforma agrária, para garantir soberania alimentar e condições dignas para milhares de famílias acampadas no País.
Além disso, ela aponta os impactos socioambientais da monocultura do eucalipto e do intenso uso de agrotóxicos pela empresa. “Esse modelo é devastador para o meio ambiente. Toda a população capixaba sofre com os desastres ambientais que a Suzano provoca. A empresa utiliza um alto índice de agrotóxicos, contaminando os recursos naturais e a população do entorno, afirma a dirigente, que também enfatiza a violência contra comunidades tradicionais. “Os quilombolas, os indígenas e os camponeses sofrem há mais de 40 anos com esse modelo. A Suzano não apenas ocupa territórios históricos dessas populações, como também busca expandir suas plantações, prejudicando ainda mais o meio ambiente e as condições de vida das comunidades locais”, pontua.
A Suzano detém 2,7 milhões de hectares de terra no Brasil, sendo 1,4 milhão deles utilizados para monocultivo de eucalipto. De acordo com o MST, esse território poderia ser usado para assentar mais de 100 mil famílias camponesas e contribuir para a produção de alimentos. “A expansão da Suzano segue a lógica do latifúndio e da grilagem, impedindo que a terra cumpra sua função social”, critica a dirigente.
Ela também relaciona o modelo de agricultura hegemônico no país, privilegiado pelo Estado brasileiro e por empresas do capital internacional, aos problemas de carestia e insegurança alimentar da população. A expansão das monoculturas impede a produção de alimentos diversificados e saudáveis, o que contribui para o aumento do preço dos alimentos, reitera. “Ter terra é ter comida. O agronegócio não está preocupado com a fome da população, mas sim em maximizar seus lucros”, critica.
Lia destaca que o objetivo da ocupação é chamar atenção para as práticas da empresa e pressionar o governo federal a intervir na questão fundiária. “Houve uma tentativa de acordo para assentar as famílias que estão em terras da Suzano, mas nunca foi cumprido. Por isso, estamos aqui, para denunciar essa situação e pautar a reforma agrária na sociedade”, explicou.
A ocupação é parte de um conjunto de mobilizações pelo país, com o lema “Agronegócio é violência e crime ambiental. A luta das mulheres é contra o capital”. O MST convoca o apoio da sociedade, dos sindicatos e de parlamentares para ampliar a repercussão do ato e evitar o isolamento da luta. “Estamos abertas a receber todos os parceiros. Queremos que os deputados e senadores solidários à nossa luta tornem isso público e ampliem essa discussão”, pontuou Lia.
As mulheres sem terra reforçam que não têm previsão de desocupar a área. “Nosso ato pauta as necessidades do conjunto da classe trabalhadora. Seguiremos firmes até que nossa demanda por reforma agrária seja ouvida”, concluiu.

Denúncias
O cultivo intensivo de eucalipto exige grandes volumes de água, resultando na escassez hídrica em diversas regiões. De acordo com o MST, apenas em Conceição da Barra, também no norte do Estado, 156 córregos desapareceram devido às plantações, enquanto caminhões-pipa abastecem a empresa, deixando comunidades sem acesso à água. Além disso, há denúncias de privatização de cursos d’água e uso extensivo de poços artesianos para o tratamento da celulose.
O uso indiscriminado de agrotóxicos, incluindo pulverizações aéreas sem aviso prévio, compromete solos, cursos d’água e plantações de pequenos agricultores. Em São Paulo, o movimento aponta que são despejadas anualmente 717 toneladas de venenos nas plantações da empresa. Os principais produtos utilizados, como o herbicida Glifosato e o formicida Sulfuramida, são associados a sérios riscos à saúde. A empresa também é acusada de despejar dioxinas altamente tóxicas nos rios, contribuindo para a contaminação ambiental.

Comunidades tradicionais relatam casos de violência e intimidação, incluindo sobrevoos de drones sobre quilombos e lançamento de veneno sobre plantações. Caminhões da empresa deterioram estradas e causam acidentes frequentes. O MST aponta que a Suzano investe no desmatamento de vegetação nativa sob o discurso de práticas sustentáveis e suas emissões anuais de dióxido de carbono (CO²) ultrapassam as de alguns países, enquanto atrai bilhões de dólares em créditos verdes e investimentos internacionais.
A empresa também lidera a implementação de eucalipto transgênico na América Latina, permitindo o uso ampliado de agrotóxicos. No campo trabalhista, enfrenta mais de 2 mil processos por jornadas abusivas e más condições de trabalho, além de ser responsabilizada por mortes de trabalhadores no Maranhão. No Cerrado, sua expansão intensificou incêndios, reduziu a biodiversidade e agravou a escassez hídrica, afetando o equilíbrio climático da América do Sul.
Além dos impactos ambientais e sociais, há denúncias sobre ligações políticas da família fundadora da Suzano com setores da extrema direita no Brasil. Os Feffer, com fortuna superior a R$ 30 bilhões, financiam o Movimento Endireita Brasil, que tem entre seus integrantes parlamentares como Carla Zambelli e Ricardo Salles. A empresa também teria sido beneficiada por políticas ambientais flexibilizadas durante o governo de Jair Bolsonaro (PL), favorecendo a grilagem de terras e a exploração ilegal de recursos naturais.