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Entidades pedem reunião com cônsul holandês sobre salvaguardas do Porto Central

Carta é uma das ações que a campanha antipetroleira ‘Nem um poço a mais’ realiza em Presidente Kennedy

As entidades e organizações integrantes da campanha antipetroleira “Nem um poço a mais” pedem uma reunião com o consulado da Holanda no Espírito Santo, para discutir compensações socioambientais robustas referentes à instalação do Porto Central no sul do Estado. A carta com o pedido ao cônsul, Andreas Schilte, será concluída durante o encontro que a Campanha realiza nos dias 25 e 26 de outubro em Presidente Kennedy e entregue após o evento.

A intenção é reeditar os alertas e pedidos feitos em uma primeira carta, entregue em decorrência das atividades realizadas no município em cinco de agosto, dia de Nossa Senhora das Neves, quando a pequena igreja histórica recebe, anualmente, antes da pandemia de Covid-19, cerca de 50 mil romeiros, configurando a segunda maior mobilização religiosa do Espírito Santo, atrás apenas das romarias de Nossa Senhora da Penha, em Vila Velha. Até o momento, essa primeira carta não teve resposta do consulado.

Vitor Taveira

Como representante do governo e da sociedade civil holandesa no Espírito Santo, o cônsul já foi e será novamente alertado sobre “as violações de direitos humanos e a destruição da natureza, implicadas na instalação do Porto Central e na expansão da exploração offshore no Sul do Espírito Santo”.

Empresas holandesas, enfatiza a Campanha, estão diretamente envolvidas em empreendimentos no País. “A Holanda é um país abaixo do nível do mar e tem muita tecnologia em dragagem, que exporta para vários países, especialmente na área de portos. Uma delas, a Van Oord, é acionista do Porto Central. O Porto de Roterdã não é mais sócio, se tornou consultor”, explica Marcelo Calazans, coordenador da Federação dos Órgãos para Assistência Social e Educacional (Fase) no Espírito Santo, acrescentando que o cônsul Andreas Schilte, até o momento, tem atuado politicamente no sentido de favorecer a participação do país no empreendimento. “Tem sido um agente muito importante em favor do Porto”, avalia o coordenador.

Para a campanha antipetroleira, as condicionantes estabelecidas na Licença de Instalação (LI) refletem a forma como o atual governo federal lida com questões ambientais e sociais. “Licenciado sob um governo fascista e racista como o de Bolsonaro, o Porto Central não dá garantias e salvaguardas concretas para questões fundamentais, mal definidas e pouco observadas nas condicionantes do licenciamento”, sublinham as entidades na minuta de carta.

Divulgação

Quatro pontos saltam aos olhos: as comunidades pesqueiras, que perderão toda a sua área de pesca no mar, rio e alagados; as mulheres, que estarão vulneráveis diante da chegada de dois mil trabalhadores para a construção do porto; a restinga bem preservada e protegida que será desmatada; e a tradicional Igreja Nossa Senhora das Neves, que ficará “enclausurada” numa ilha cercada pelas instalações petroportuárias.

São cerca de 400 famílias que vivem da pesca artesanal, nas margens esquerda (Espírito Santo) e direita (Rio de Janeiro) do rio Itabapoana, que deságua na Praia das Neves, balneário de Presidente Kennedy, que faz divisa com o estado fluminense, além de comunidades pesqueiras até Marataízes, que também serão impactadas. “Irão perder o acesso aos alagados. Primeira obra será dos píeres. Está previsto o fluxo de 80 caminhões de pedra por dia, que devem ser retiradas da região de Cachoeiro de Itapemirim”, ressalta Marcelo.
Sobre a segurança de mulheres e meninas, a Campanha lembra os desastres já provocados em Barra do Riacho/Aracruz e em Povoação/Linhares, no norte do Estado, e muitas outras comunidades costeiras que tiveram seus modos de vida destruídos por portos, como no Rio de Janeiro e Pernambuco, e onde, após o retorno dos trabalhadores da construção para seus estados, têm que lidar com centenas de meninas e mulheres grávidas, que terão filhos sem pais. “São sociedades sem édipo, que sofrem o chamado ‘aborto masculino'”, metaforiza Marcelo.
A preocupação com a Igreja de Nossa Senhora das Neves é compartilhada pela paróquia local e pela Diocese de Cachoeiro de Itapemirim. O bispo, Dom Luiz Fernando Lisboa, já declarou publicamente suas preocupações, que são objeto de estudo e reivindicação da Comissão dos Bens Culturais da Diocese, que trabalha pela transformação da igreja em Santuário.
Segundo a arquiteta Cora Augusta Duarte Aguieiras, integrante da Comissão, a história do santuário tem início no século XVII, por ação dos jesuítas que viviam em Reritiba (atual Anchieta) e, a caminho de São Pedro da Aldeia, em Cabo Frio, no RJ, pernoitavam na Praia das Neves.

Já a destruição da restinga é calculada em 1,1 mil hectares, o que provocará um prejuízo ambiental imenso para a biodiversidade da região. 
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Ao consulado holandês, as entidades da campanha perguntam se os investidores dos países baixos “repetirão, no sul do Espírito Santo, os danos que causaram em Suape (PE), na vida marinha e na sociedade da região”. Perguntam também “que tipo de desenvolvimento está sendo proposto? Para quê e para quem?” e “que órgãos de governo e quais empresas holandesas estão envolvidas na exploração petroleira e em sua infraestrutura, na bacia do Espírito Santo e na bacia de Campos?”.

Os questionamentos também são feitos por entidades holandesas como a Both ENDS, que monitoram o processo de instalação do Porto Central, bem como outros empreendimentos que recebem investimentos holandeses no mundo. “Recentemente, elas venceram um processo judicial na Nigéria, obrigando a Shell a reduzir em 45% as emissões de carbono naquele país, para que cumprisse os compromissos internacionais com o clima firmados pela Holanda. Elas irão nos ajudar a pressionar o consulado holandês a atuar em defesa das comunidades e do meio ambiente no caso do Porto Central”, relata.

Nos dias 25 e 26, sublinha o coordenador da Fase/ES, o foco das atividades será as condicionantes ou salvaguardas presentes na Licença de Instalação, compreendidas pelos membros da Campanha como “puras abstrações”. “Igreja e pescadores tentaram negociar separadamente com o porto e não conseguiram nada. Mulheres nem constam no plano de compensações. Sobre a restinga, tudo também muito abstrato. Não há quaisquer garantias sobre esses temas”, avalia. O objetivo do evento, ressalta, “é empoderar as comunidades para que elas possam negociar melhor com o porto, porque as salvaguardas de hoje não salvam nem guardam nada”.

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