ONGs prestam solidariedade à ambientalista ameaçada em Ponta da Fruta e pedem criação de UCs para lagoas do bairro
Um conjunto de organizações e coletivos com atuação socioambiental em Vila Velha realiza neste sábado (3) um Ato Solidário em Defesa da Vida e do Meio Ambiente, em Balneário Ponta da Fruta, a partir das 10h, quando será feita uma visita exploratória e um planejamento estratégico para assinatura de um documento requerendo a criação de uma Unidade de Conservação (UC) que proteja os recursos naturais do bairro.
Um dos objetivos é também prestar apoio e solidariedade a presidente da Associação de Moradores local (AMBPF), Evelyn Neto, que foi ameaçada de morte em março por defender as lagoas de diversos tipos de degradação, proferidas por pessoas com terrenos na região.
Um mês depois, Evelyn falou sobre o caso durante o ato cultural e político em memória dos 30 anos do assassinato do biólogo e ambientalista Paulo Vinha, ressaltando tristes traços da realidade que permanecem, passadas três décadas. “Estamos vivendo a mesma realidade que Paulo Vinha viveu trinta anos atrás. As pessoas têm deixado de denunciar os crimes ambientais rotineiramente ao lado de suas casas por medo de morrer. A gente precisa primeiramente, para que essa sementinha de Paulo Cesar Vinha continue crescendo cada vez mais no nosso coração, no nosso dia a dia, da nossa vida, levar informação para as pessoas, e é o que eu tenho tentado fazer na minha comunidade”, declarou.
As organizações e coletivos que realizaram o ato por Paulo Vinha e integram a rede de apoio por Evelyn no próximo sábado se misturam, mostrando que a “sementinha de Paulo Cesar Vinha” que ela cita e cuja germinação e crescimento na sociedade foi o objetivo do ato de abril, está sendo bem cuidada e regada. São elas: Corrente do Bem; Fórum Diversidade de Vila Velha; Associação Intermunicipal Ambiental em Defesa do Rio Formate e seus Afluentes (Asiarfa); Instituto Lagoa Encantada (Fórum Desea); Museu Vivo da Barra do Jucu; Fórum Popular Em Defesa de Vila Velha; Federação Capixaba de Teatro (Fecate); e Comitê Popular de Lutas Paulo Vinha.
Um dos novos apoiadores da causa é o aposentado Moisés Moisés Leal, morador do Balneário Ponta da Fruta e entusiasta da proposta de criação de uma UC no bairro, já que o fato de integrar a Área de Proteção Ambiental (APA) Lagoa Grande – criada em 2006 com 2,7 mil hectares – não tem sido suficiente para garantir um uso adequado do solo e bens ecológicos.
“Há ofertas de compra e venda de lotes dentro de área de lagoa. Tem essa autorização que a Cesan [Companhia Espírito-Santense de Saneamento] recebeu para retirar água de uma das lagoas, que não é alimentada por nenhum recurso hídrico, só lençol freático, é muito desmatamento, poluição. Precisamos de uma unidade de conservação”, explana.
A prefeitura tem sido comunicada de todos os problemas e solicitações da comunidade, relata, porém ainda não tomou nenhuma providência. O documento com a petição do grupo ampliado, após assinatura dos presentes no ato solidário, será protocolado na Secretaria Municipal de Meio Ambiente e, possivelmente também, no Ministério Público Estadual (MPES), conta Moisés.
A ideia é que assim seja dado início ao processo de criação da unidade de conservação, a exemplo do movimento feito em favor da Lagoa Encantada, que, após quase uma década de mobilização popular na região do Vale Encantado – capitaneada pelo Fórum Desea e Fórum Popular de Vila Velha – foi transformada em projeto de lei e aguarda finalização do processo de tramitação para oficialização do Parque Natural da Lagoa Encantada.
Pensar global, agir local
O ambientalista tem consciência de que o trabalho feito no limite sul de Vila Velha tem interface com inúmeras outras iniciativas ao redor do mundo, empreendidas por pessoas e organizações conscientes da necessidade de aplicar no seu território as demandas globais decorrentes da crise climática. Ações, ressalta, que precisam ter eco entre os gestores públicos.
“Eu morei trinta anos no Rio de Janeiro, sempre estive em Petrópolis e nunca imaginei a destruição que aconteceu no ano passado lá. Só quando a população fica atenta e se mobiliza, é que consegue fazer as autoridades agirem”.
As ameaças a defensores do meio ambiente, igualmente, destaca, são uma realidade mundial, e precisam ser enfrentadas localmente por meio de redes potentes de solidariedade. Paulo Vinha em Vila Velha, Bruno e Dom na Amazônia, Bruno e Carmem em Santa Teresa e tantos ativistas e profissionais cotidianamente ameaçados no Brasil, um dos países mais perigosos para os defensores da natureza e dos direitos humanos, precisam contar com o apoio da sociedade para não serem calados à força.
“A gente tem que estar o tempo todo aceso, porque [as ameaças e violências] acontecem em diversos lugares, por pessoas interessadas somente no lucro e não no cuidado da natureza e da vida. E elas prejudicam a saúde de todos nós. A gente nunca sabe de onde vem, quando pode acontecer. Temos que estar sempre unidos e atentos”, afirma.
“Uma pessoa como a Evelyn que está trabalhando tanto por temas de interesse de toda a comunidade, ser ameaçada, é um absurdo, não podemos deixar. Ela merece receber essa solidariedade coletiva, para quem estiver fazendo essa ameaça perceber que não estão ameaçando alguém isolado, não. Existe uma coletividade em apoio a ela”, destacou.