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Evair de Melo é financiado por invasores de terras indígenas, denuncia dossiê

Documento aponta relações entre políticos e agronegócio que sustentam pautas como Marco Temporal e CPI do MST

Pedro Valadares/Câmara dos Deputados

O deputado federal Evair de Melo (PP) é um nome de destaque entre os políticos ligados a invasões de terras indígenas em diversos estados do país, listados no dossiê “Os Invasores – Parte II – Os Políticos”, publicado pelo De Olho nos Ruralistas – Observatório do Agronegócio no Brasil.

O capixaba é um dos vice-presidentes da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), onde se concentra a maior parte dos parlamentares financiados por empresários donos de fazendas sobrepostas a territórios de povos originários, e também integra a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).

Segundo o relatório – feito a partir do cruzamento de bases de dados fundiários do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) –, 18 integrantes da FPA receberam R$ 3,6 milhões em doações de campanha de fazendeiros ligados a sobreposições em TIs. Além dele, destacam-se o presidente da frente, Pedro Lupion (PP-PR), outro vice-presidente, Arnaldo Jardim (Cidadania-SP), a coordenadora política e ex-ministra da Agricultura Tereza Cristina (PL-MS), e outros nove diretores.

A frente tem ainda três congressistas que possuem fazendas em terras indígenas registradas em nome de empresas ou parentes: o senador Jaime Bagattoli (PL-RO) e os deputados Dilceu Sperafico (PP-PR) e Newton Cardoso Júnior (MDB-MG).

No caso de Evair de Melo, a doação para campanha foi no valor de R$ 20 mil, segundo o dossiê, e partiu do fazendeiro Adelar Mateus Jacobowski, titular da Fazenda Frei Gabriel, que disputa uma área limítrofe à TI Menkü, no Mato Grosso, avançando em 2,58 hectares sobre o território.

No geral, o estudo conclui que, das 1.692 sobreposições de fazendas em terras indígenas – exposto na primeira parte do dossiê, publicada em abril –, “42 pertencem a clãs políticos nacionais e regionais [que], juntos, concentram 96 mil hectares em áreas sobrepostas a TIs — o equivalente à soma das áreas urbanas de Rio de Janeiro e Belo Horizonte”. O Mato Grosso do Sul lidera entre os estados, com 17 casos, seguido de Mato Grosso e Maranhão, com sete cada.

“Essa frente política conta hoje com 300 deputados e 47 senadores, constituindo o principal bloco de oposição ao terceiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva (PT)”, afirma o Observatório, ressaltando que o presidente eleito “não recebeu nenhuma doação de invasores de TIs”.

O número, salienta o documento, equivale a 58% dos assentos na Câmara e no Senado e é “mais que suficiente para aprovar projetos de lei e instaurar Comissões Parlamentares de Inquérito (CPI)”. Como exemplos, além da CPI do MST, estão a aprovação do PL 490/2023, que tenta legalizar a tese do Marco Temporal e fragilizar a homologação de terras indígenas no país. Essas ações parlamentares são ainda complementadas por campanhas do “braço logístico” da Frente, o Instituto Pensar Agro (IPA).

“As doações de invasores de terras indígenas aos membros da FPA possuem um caráter ideológico: entre os fazendeiros que promoveram campanhas ruralistas, cinco financiaram a tentativa de reeleição de Bolsonaro, em 2022. De Olho nos Ruralistas identificou 41 proprietários rurais com áreas incidentes em TIs que doaram para a campanha do ex-presidente. Esse grupo concentra 107.847,99 hectares em sobreposições — o mesmo tamanho de Hong Kong”, pontua o documento.

O dossiê lembra ainda das ramificações internacionais da Frente, por meio de uma “cadeia de financiamento multimilionária composta por 48 associações do agronegócio, que recebem dinheiro de 1.078 empresas brasileiras e multinacionais — e repassam parte dessa verba ao Instituto Pensar Agro (IPA)”, entre elas JBS, Cargill, Syngenta, Bunge, Amaggi e Bom Futuro, conforme detalhado no dossiê “Os Financiadores da Boiada”, publicado em julho de 2022 pelo De Olho nos Ruralistas.

Prefeito de Linhares

Para além do Congresso Nacional, as invasões de terras indígenas também envolvem prefeitos de várias regiões do país. Do Espírito Santo, figura na famigerada lista o atual gestor de Linhares, no norte do Estado, Bruno Margotto Marianelli (Republicanos), que assumiu o cargo após Guerino Zanon (PSD), de quem era vice, desistir do cargo para concorrer ao governo do Estado, no ano passado.

Reprodução

Segundo apuração do Observatório do Agronegócio, a fazenda do prefeito linharense, Flor do Norte, está registrada em nome de seu pai, Zilmar Marianelli, e possui 273,27 hectares sobrepostos à TI Comexatibá, do povo Pataxó, no município de Prado, extremo sul da Bahia. “Em posse da família pelo menos desde 2010, as terras não aparecem entre os R$ 332 mil em bens declarados por Bruno durante as eleições de 2020”, acrescenta o documento.

Bruno Marianelli também é apontado como membro de um grupo de fazendeiros que lidera a formação de uma rede de Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPNs) na região, como forma de evitar tanto a delimitação do território Pataxó quanto a ampliação do Parque Nacional do Descobrimento (PND). A RPPN de Marianelli foi criada em 15 de janeiro de 2010 pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).

O Relatório Circunstanciado de Identificação e Delimitação da TI Comexatibá, apresentado em 2006 pelas antropólogas Leila Silvia Sotto-Maior e Sara Braga I Gaia, cita o dossiê, “mostra que a proposta de manejo do entorno do PND apresentada pelos fazendeiros considerava como principal ameaça ao ambiente a ‘invasão pelos índios Pataxó’, ao mesmo tempo em que pintava os proprietários rurais como defensores do parque — apesar do farto histórico de desmatamento na região” e que “entre os proprietários que compuseram a iniciativa, o relatório lista Dionísio Marianelli, parente do prefeito capixaba”.

As 72 páginas do dossiê listam vários outros parlamentares e prefeitos que atuam com veemência no ataque aos direitos dos povos indígenas e na criminalização de movimentos sociais que buscam a justiça fundiária no Brasil.

Com bases nos dados levantados, o Observatório pergunta: “Quem são os reais invasores de terras no Brasil? Os movimentos populares que lutam pela reforma agrária e pela demarcação de terras indígenas, direitos consagrados na Constituição de 1988? Ou os grileiros que invadem milhões de hectares na Amazônia, no Cerrado e nos demais biomas brasileiros? O que impacta mais a segurança pública e o ambiente: a ocupação temporária de poucos hectares dentro de fazendas improdutivas, buscando provocar uma reação política do Estado, ou mega invasões de áreas públicas, em geral acompanhadas de desmatamento, com fins meramente especulativos?”

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