Zona de amortecimento do Parna Caparaó tem número crescente de empreendimentos não licenciados
O “êxodo urbano” é uma realidade em várias localidades turísticas do Espírito Santo, a exemplo do que ocorre em muitos lugares do Brasil e do mundo. Já consolidado nas regiões serranas de Santa Teresa, Marechal Floriano e Domingos Martins, mais próximas da capital, o movimento de mudança de famílias das cidades para o campo se expande também para o Caparaó Capixaba, próximo à divisa com Minas Gerais.
Seja como mudança definitiva de moradia ou como opção de lazer nos finais de semana e feriados, os novos endereços rurais se multiplicam em pequenas chácaras e sítios ou grandes condomínios, de padrão financeiro cada vez maior.
A busca por melhor qualidade de vida, com menos poluição e violência e mais tranquilidade é legítima e, a princípio, pode ajudar a dinamizar as economias locais, levando benefícios para todos os envolvidos. Na prática, no entanto, alertam gestores públicos nos municípios que recebem os migrantes urbanos, tem ocorrido intensa degradação ambiental e crescimento desordenado, criando as bases para transformar sonhos individuais em pesadelos coletivos.
“As pessoas estão procurando sair da cidade, fazendo um êxodo urbano. Principalmente na pandemia cresceu muito. Pessoas com pânico de ficar na cidade, dentro de apartamentos. Elas são bem-vindas, mas têm que deixar os vícios do modelo de desenvolvimento das cidades e virem ser parcerias na preservação e conservação da natureza”, pondera Dalva Ringuier, diretora-executiva do Consórcio Público Intermunicipal de Desenvolvimento do Território do Caparaó (Consórcio Caparaó), entidade responsável técnica pelo licenciamento ambiental de nove dos onze municípios do entorno do Parna.
“Elas têm que entender que estamos na zona de amortecimento do Parque Nacional do Caparaó. Antes de começar qualquer obra pra moradia ou empreendimento, tem que procurar o setor de meio ambiente das prefeituras e se enquadrar. Se puder ser feita a dispensa do licenciamento, vai dispensar. Mas se precisar licenciar, precisa cumprir todos os requisitos. Caso não faça esses procedimentos, corre o risco de embargo e multa, e talvez nem possa construir. Se for área de confluência com o parque, o parque pode até nem dar anuência”, explica.
Infelizmente, observa a diretora-executiva, há uma explosão de loteamentos e condomínios dentro dos três quilômetros definidos pela Resolução do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) nº 428/2010 como zona de amortecimento do Parque Nacional. Nessas áreas de entorno direto do Parque, explica Dalva, há atividades que são proibidas, como exploração mineral. Mas pequenos empreendimentos agrícolas e de turismo são permitidos, desde que estejam dentro da lei, principalmente em relação à proteção das Áreas de Preservação Permanente (APPs) e ao tratamento de esgoto.
“Não pode construir a menos de trinta metros de córregos, por exemplo. Tem que recuperar nascentes e não desmatar”, elenca a ambientalista, citando algumas diretrizes gerais que mais são desrespeitadas. “Há muitos loteamentos e condomínios sem licenciamento na zona de amortecimento do Parque. Muitas pessoas vindas de fora da região estão aterrando brejos, córregos … Tem ocorrido muito”, lamenta.
Com relação a condomínios e loteamento, complementa, é preciso ter cuidados extras, como prover toda a estrutura de acessos e ruas no padrão exigido em lei e nos Planos Diretores Municipais (PDMs), como energia elétrica, abastecimento de água e tratamento de esgoto. “O dono do condomínio tem que oferecer toda a infraestrutura, não pode ficar no colo do município. As prefeituras só podem aprovar com essas garantias”. E tudo isso, pontua, após feito o desmembramento da propriedade original, que deve ser requerido via projeto de lei aprovado na Câmara de Vereadores e sancionado pelo prefeito.
O primeiro passo, orienta, é procurar a secretaria de meio ambiente da prefeitura, onde todas as informações sobre os trâmites necessários serão fornecidas. “Dependendo da atividade, tem que fazer condicionante ambiental”, acentua.
E quem já empreendeu sem as devidas licenças, precisa se regularizar. As pousadas, informa, devem buscar seu alvará na prefeitura e pagar as taxas, que são pequenas, e fazer a regularização ambiental, quando necessário, no caso de ter havido desmates ou construções em áreas proibidas pela legislação.
Na região de maior adensamento turístico do Caparaó Capixaba, entre Pedra Menina/Dores do Rio Preto e Pedra Roxa/Ibitirama, passando por Santa Marta/Ibitirama e Patrimônio da Penha/Divino de São Lourenço, não só os sítios estão irregulares, como as obras dentro dos vilarejos. “As ruas não têm oito metros de largura, não seguem o PDM. A maioria tem três, quatro metros, não passam dois carros”, exemplifica.
Em Dores do Rio Preto, um dos dois únicos municípios que realizam o licenciamento ambiental completo na região, o secretário de Meio Ambiente, Juan Ricardo Carvalho Senna, reforça a orientação da diretora-executiva do Consórcio Caparaó. “Procure a Secretaria de Meio Ambiente antes de começar seu empreendimento”.
Juan cita uma vistoria feita nesta quinta-feira (20), onde um proprietário rural aparentemente vindo da região de Vitória, desmatou até o topo do terreno com maquinário pesado (foto acima). O relato do empreendedor, conta o secretário, é de que seus funcionários obtiveram autorização do Instituto de Defesa Agropecuária e Florestal (Idaf) para retirada de samambaias e eucaliptos, e acharam que a documentação era suficiente pra fazer todo o serviço planejado, que incluía melhorar a estrada de acesso ao terreno e fazer um novo paisagismo.
Denunciado, a prefeitura comprovou as infrações. “Ele vai sofrer autuação e seguir todos os trâmites: recuperar a área desmatada e é possível que também faça compensação ambiental, reflorestando uma área com o dobro do tamanho da que foi danificada”, conta.