Próximo do final de seu primeiro mandato, a presidente Dilma Rousseff titulou apenas nove territórios quilombolas no País, todos parcialmente, repetindo a lentidão nos processos que marcou as gestões de seus antecessores, Lula e Fernando Henrique Cardoso. Nenhuma delas no Espírito Santo, onde há oito processos em andamentos, porém alvos de sucessivas manobras protelatórias da Aracruz Celulose (Fibria) para impedir a devolução das terras aos seus verdadeiros donos.
Nesse período, acumularam-se no Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) 1.400 processos de titulação, que aguardam por conclusão.
Os dados são da Comissão Pró-Índio, que concluiu levantamento em alusão ao Dia Nacional da Consciência Negra, nessa quinta-feira (20). A entidade lembra que os quilombolas têm pouco a comemorar. Somente este ano, foram ao todo seis terras regularizadas, sendo quatro parciais pelo Incra e duas pelo governo do Maranhão.
Atualmente, a Comissão aponta que há 140 terras quilombolas no País, onde vivem 229 comunidades, com 12.428 famílias, o que representa 5,8% das 214 mil famílias que a Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir) estima ser a população quilombola no Brasil.
Os estados com maior número de territórios quilombolas titulados são o Pará (54 terras) e Maranhão (52), resultado principalmente da ação dos governos estaduais.
A publicação dos relatórios de identificação e delimitação de terras quilombolas, ação inicial para o processo de titulação, também seguiu a passos lentos no governo Dilma. Em quatro anos, foram publicados 13 relatórios. Além disso, 16 portarias de reconhecimento como terra quilombola e 22 decretos de desapropriação, beneficiando apenas 23 comunidades.
Para a Comissão Pró-Índio, o quadro é reflexo dos complexos caminhos que envolvem a desapropriação de imóveis incidentes nos territórios quilombolas e das crescentes contestações judiciais dos processos em diferentes fases, como ocorre no Espírito Santo. “Questões políticas de diferentes ordens vêm emperrando essas publicações”.
A entidade lembra, ainda, dos processos em que os relatórios de identificação estão prontos, tecnicamente aprovados, mas que não são publicados, como ocorre com as terras indígenas.
No Espírito Santo, além da Aracruz Celulose, que explora desde a ditadura militar os territórios quilombolas em Sapê do Norte, formado pelos municípios de São Mateus e Conceição da Barra, há ainda ocupação das terras por usinas de cana-de-açúcar e álcool e fazendeiros.
A lentidão nos processos no Estado motivou ação civil pública do Ministério Público Federal (MPF-ES), ajuizada no ano passado, para garantir a regularização do território de São Domingos. O processo estava pronto para julgamento, última fase da publicação da portaria, desde janeiro de 2012. Em setembro último, porém, foi anulado pela Justiça Federal.
Outro território, Linharinho, teve seu Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (RTID) concluído este ano, graças a inquérito civil do MPF instaurado para apurar a excessiva demora na regularização. Este é o segundo procedimento que visa à regularização das terras. O primeiro, iniciado ainda em 2004, foi anulado pela Justiça, após recurso da Aracruz.
O Ministério Público instaurou, ainda, outros cinco inquéritos para acompanhar a situação das comunidades de Roda D'Água, Bacia do Angelim e São Domingos, localizadas em Conceição da Barra; e São Jorge e Serraria/São Cristóvão, em São Mateus, bem como o processo de delimitação de suas áreas.
Enquanto não têm suas terras regularizadas, os quilombolas não conseguem produzir alimentos para subsistência de suas famílias, nem manter sua cultura tradicional. Ilhados pelos eucaliptais, enfrentam quadro de miséria, resultado dos impactos ambientais e sociais gerados pela monocultura do eucalipto no norte do Estado.