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‘Há um ataque no Brasil inteiro contra as Unidades de Conservação’

Confrontado em evento na Ufes, Casagrande sinaliza reunião para debater Peduc

O governador Renato Casagrande (PSB) foi confrontado por ambientalistas durante a abertura da Reunião Regional da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), realizada nesta quarta-feira (19), em Vitória, em um novo protesto do Movimento em Defesa das Unidades de Conservação (UC) contra o Programa Estadual de Desenvolvimento e Uso Sustentável das Unidades de Conservação (Peduc), que transfere a gestão de áreas protegidas para o empresariado, com leilões previstos para 2025. 

Na entrada do evento, realizado no Teatro da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), em Goiabeiras, manifestantes exigiram do chefe do executivo capixaba a revogação do programa, idealizado pela Secretaria de Estado do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Seama), liderada por Felipe Rigoni, que prevê a concessão da gestão de seis parques naturais à iniciativa privada por um período de 35 anos. 

Durante o ato, o governador enviou um assessor para dialogar com os manifestantes e informou que estaria disposto a recebê-los para um debate sobre a questão. Nelson Lara, diretor do Sindicato dos Servidores do Poder Judiciário do Espírito Santo (SindijudES), foi um dos que cercaram Casagrande na chegada ao evento. Segundo ele, será formada uma comissão do movimento para participar dessa reunião, cuja data ainda será definida. O dirigente sindical destacou que o grupo pretende reforçar a necessidade de interromper o Peduc, que, segundo os ambientalistas, representa uma mercantilização da natureza e uma ameaça à conservação ambiental. 

Leonardo Sá

A manifestação teve o objetivo de expor contradições na política ambiental de Casagrande em um evento de visibilidade nacional, cujo tema era “Clima e Oceano: a Urgência de Construir um Futuro Sustentável”. Casagrande se projeta nacionalmente a partir da agenda de mitigação da crise climática e ocupa a presidência do Consórcio Brasil Verde – Governadores pelo Clima, iniciativa que diz reunir governadores comprometidos com políticas de sustentabilidade. No entanto, os manifestantes denunciam que sua atuação local desrespeita os princípios ambientais defendidos pelo consórcio e contraria interesses de preservação ambiental. 

Para o biólogo Walter Có, a comunidade científica precisa se posicionar diante do avanço de políticas que facilitam a exploração comercial de áreas naturais protegidas. “Há um ataque no Brasil inteiro contra as unidades de conservação”, criticou.

Ele também apontou que conceitos como sustentabilidade, educação ambiental e ESG – Environmental, Social and Governance”, que significa “Ambiental, Social e Governança – foram apropriados pelo sistema econômico, tornando-se ferramentas de validação para empreendimentos que, na prática, violam os princípios ambientais. Walter destaca que qualquer atividade lucrativa que envolva a natureza hoje se autodenomina sustentável, mesmo quando contraria os fundamentos dessa ideia. 

Leonardo Sá

O biólogo evidencia que os impactos ambientais deixaram de ser projeções futuras e se tornaram realidade concreta com a multiplicação de fenômenos como calor extremo, enchentes e instabilidades climáticas, além da alta no preço dos alimentos devido às dificuldades na produção agrícola. “Não é mais um prognóstico, é uma realidade, ou atuamos para enfrentar essa realidade, ou a tendência é piorar ainda mais e de forma acelerada, enfatiza.

A pesquisadora Beatriz Brito, que estuda a espécie de anfíbio Phyllodytes luteolus no Parque Estadual Paulo César Vinha, também expressou preocupação com o enfraquecimento dos órgãos ambientais, como tem sido registrado na atual gestão. Ela é colaboradora do Instituto Boitatá, que atua na preservação do sapinho-da-restinga (Melanophryniscus setiba), uma espécie microendêmica encontrada apenas dentro desse parque natural. Beatriz alertou que ameaças ao parque podem desencadear um efeito dominó em outras espécies vulneráveis.

“Ao invés de combater problemas como incêndios, caça e contrabando, o governo está adotando medidas que podem piorar a situação, retirando a gestão de quem realmente entende e se preocupa com a conservação”, observou. 

Leonardo Sá

O representante do coletivo de meio ambiente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Cleuser da Silva, também destacou o impacto social e econômico da concessão: “Vários parques estaduais e nacionais já foram concedidos para a iniciativa privada e os impactos negativos são evidentes. O que vemos aqui é um desequilíbrio entre economia, meio ambiente e sociedade. A concessão privilegia o fator econômico em detrimento dos demais e isso prejudica as populações locais e o meio ambiente. Esse programa de desenvolvimento sustentável não tem nada de sustentável”, asseverou.

Mais de R$ 8 milhões

O Peduc foi instituído pelo Decreto nº 5409-R e abrange os parques Paulo César Vinha (PEPCV), na região metropolitana; Itaúnas, em Conceição da Barra, no norte do Estado; Cachoeira da Fumaça (PECF), em Alegre; Forno Grande (PEFG) e Mata das Flores (PEMF), em Castelo, no sul do Estado; e Pedra Azul (Pepaz), em Domingos Martins, na região serrana.

Sem a realização de estudos e relatórios de impacto ambiental (EIA/Rima), os primeiros projetos de infraestrutura turística para os Parques Estaduais de Itaúnas e Paulo César Vinha foram apresentados pela consultoria Ernst & Young, contratada sem licitação por mais de R$ 8,6 milhões para a modelagem econômica das concessões. As propostas incluem a construção de teleféricos, tirolesas, restaurantes, hospedagens, piscina flutuante e estacionamentos para centenas de veículos. Especialistas alertam que esse modelo de exploração econômica pode colocar em risco a preservação ambiental dessas áreas protegidas. 

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