Confrontando as exigências da sociedade, que exige a retirada de todo o material lançado em Camburi pela mineradora Vale, destruindo a fauna e a flora da região, o Instituto Estadual do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Iema) quer deixar a situação como está.
Parecer técnico liberando a empresa de qualquer providência é completamente oposto da posição dos técnicos da Secretaria Municipal de Meio Ambiente (Semmam) da Prefeitura de Vitória.
Os pareceres técnicos sobre a poluição da Vale foram apresentados e discutidos no Conselho Municipal de Meio Ambiente (Comdema) nessa segunda-feira (2). O parecer dos técnicos do Iema – o GCA/CAIA-IEMA Nº 228/2014 – referiu-se ao “passivo ambiental da região norte da Praia de Camburi” sobre o processo 4369528/2014.
Os conselheiros representantes da sociedade civil condenaram a posição do Iema. O presidente da ONG Juntos SOS ES Ambiental, Eraylton Moreschi Junior, se irritou com a proposta que libera a Vale de qualquer providência, destacando que depois de tanto poluir, a empresa nada vai gastar ao não reparar os danos que produziu. Destaca que a sociedade exige a retirada de toda a montanha de minério que lançou em Camburi e que não provoque mais destruição ambiental com o processo de limpeza da área.
Já o presidente da Associação Capixaba do Meio Ambiente (Acapema), Mário Camilo, lembrou que o Iema procurou achar outros culpados pela poluição de Camburi. Mas não os identificou. Lamentou o desrespeito da Vale com o ambiente e em particular com o mar de Camburi.
A área destruída pela Vale, contaminada com diversos poluentes, é a porção norte da praia de Camburi, com 110 mil metros quadrados, onde foram lançados 170 mil metros cúbicos de minério. O minério foi derramado indiscriminadamente e criminosamente pela Vale entre os anos de 1969 e 1984.
Hoje praticamente não há peixe em Camburi, região que tinha grandes estoques de peixe antes da instalação das empresas poluidoras no Planalto de Carapina. Além da Vale, outra grande poluidora é a ArcelorMittal Tubarão.
Ao apresentar o seu parecer, os técnicos do Iema indicados por sua direção informam que se trata de atender à condicionante ambiental que obrigava a Vale a apontar o que fazer.
Foi produzido pela empresa Aplysia Soluções Ambientais, os “Estudos Complementares ao Projeto Recuperação da Região Norte da Praia de Camburi”, e pela empresa Econservation Estudos e Projetos Ambientais a “avaliação do nível de contaminação por metais da fauna bentônica e da ictiofauna presentes na região norte da praia de Camburi e adjacências”.
Em longo parecer, o Iema conclui que o minério formou “um corpo de sedimentos contendo minério de ferro em uma área de aproximadamente 110.000 m² distribuída ao longo de diferentes compartimentos do ambiente praial (faixa emersa com vegetação, pós-praia e porção permanentemente submersa do leito marinho), se mostrando ora aflorante ora recoberto por uma camada de sedimento”. Considera duas alternativas: A remoção total do sedimento por meio de dragagem e escavação e de capeamento da área destruída.
E prepara o discurso para proteger a Vale: “… diante dessas proposições, deduz-se que o ferro (ou minério de ferro) presente no sedimento não é a fonte de contaminação e que outras fontes de contaminantes ainda se encontram ativas, concluindo-se que o passivo de Camburi não é o problema atual de contaminação a ser resolvido e que a execução de qualquer uma das alternativas de remedição ativa avaliadas não seria suficiente para a melhoria da qualidade ambiental daquela região e da Baía do Espírito Santo como um todo, uma vez que a remoção do sedimento com ferro não cessará a(s) fonte(s) de contaminação”.
O Iema segue: “assim, parte-se do pressuposto que as fontes de contaminação devem ser identificadas e cessadas em um momento inicial, adotando neste sentido a alternativa de “não realizar nenhuma intervenção” (ou “nenhuma ação” do inglês “no action”), que identificamos como “Alternativa Zero” por desencadear uma série de procedimentos integrados que culminariam na definição futura da melhor alternativa de remediação”.
Os ténicos seguem propondo novos estudos sobre os poluentes. Tais estudos levam anos e anos a serem realizados.
Semmam
Diferentemente, o parecer técnico nº 86/2014 da Semmam rejeita completamente o capeamento do minério com areia por não ser medida “considerada adequada”. Os técnicos dizem que não concordam com o procedimento “por ser uma medida temporária; devido à continuidade da camada de minério de ferro “in loco”; devido à instabilidade da camada de capeamento; e pela frequência futura de utilização da praia pelos munícipes, onde crianças poderão escavar a areia e chegar facilmente ao sedimento, onde terão contato direto com o sedimento e água intersticial contaminados”.
Além disso, citam a quantidade de vegetação que será retirada e/ou soterrada para realização das atividades e alteração da linha de preamar. Já e em relação ao enrocamento aderente, apóntam que poderá ocorrer interferência na desembocadura do rio Camburi e alteração dos processos sedimentares de erosão e sedimentação diferenciados ao longo da praia. “Isto provocará alteração das características do local de ocorrência da vegetação de mangue, podendo culminar na morte destes indivíduos”.
A Remoção Total dos Sedimentos é a que atende a resolução do passivo ambiental, sendo considerada pela equipe técnica a referência para apresentação de uma proposta com tecnologia adequada para remoção, remediação e destinação final do corpo de sedimento contaminado.
Porém, a metodologia de dragagem apresentada pela Vale não foi considerada adequada pela equipe técnica da Semmam. Isso, “devido ao fato do sedimento estar contaminado e a forma de contenção proposta para os contaminantes dissolvidos ou em suspensão não ser eficiente durante o processo de remoção através da dragagem.
Considera a Semmam que a “remoção do sedimento com minério de ferro da parte emersa pode ser executada de forma independente da área submersa. O material removido deverá ser encaminhado para aterro industrial, devido sua toxicidade; toda matéria orgânica e inorgânica da limpeza da área de vegetação que sofrer intervenção, terá sua destinação final na central de materiais descartáveis (CMD) e no aterro de galhos e folhas – Fazendinha – que se encontram dentro da própria Vale”.
Os técnicos que produziram o parecer da Prefeitura de Vitória afirmam ainda que “as áreas onde haverá supressão de vegetação deverão ser recompostas por nativas, para viabilidade da restituição natural da fauna e flora local. Destaca-se que as duas alternativas (Capeamento e Dragagem/Remoção total dos sedimentos) para a recuperação da região norte da Praia de Camburi interferirão de maneira significativa e intensa nos ecossistemas, levando à perda de riqueza e diversidade de organismos, em ambas as técnicas, com suas respectivas metodologias”.
Cobram: “deve-se ressaltar que o impacto pode ser reduzido para o meio biótico, na área submersa, com a utilização de outras tecnologias mais eficientes para impedir a dispersão dos contaminantes. Ressalta-se ainda o fato do passivo da Vale estar situado em trecho do Parque Atlântico e esse possuir tipos de vegetação que são protegidas por lei, como por exemplo: restinga e manguezal (Área de Preservação Permanente – APPs), sendo que qualquer opção escolhida deverá trazer como ação a recuperação de todo ecossistema degradado”.
Os técnicos sugerem, então, que sejam apresentadas propostas para a remoção do corpo de sedimento com todo o material contaminado da área submersa, com uso de metodologias mais adequadas de remediação, tendo em vista que a metodologia apresentada de dragagem não mitiga o impacto causado por sedimentos contaminados nesta área. A remoção do sedimento emerso poderá ser realizada de forma independente do submerso, atendendo a legislação referente aos ecossistemas protegidos (restinga, manguezal, falésias, lateritas).
“Destacamos a necessidade de elaboração pela Vale S.A de planos e projetos a serem licenciados pelos órgãos de controle ambiental. Sugerimos ainda que a empresa executora apresente um Plano de Emergência e Contingência que abranja a execução total da obra. Recomendamos que a Vale S.A. contrate uma empresa terceirizada sob a coordenação do Iema e demais órgãos ambientais para a supervisão do controle de qualidade total dos serviços a serem executados. É importante que para a continuidade do biomonitoramento seja analisada a composição da comunidade e o nível da contaminação por metais pesados e outros, antes, durante e após a execução da remoção do sedimento, apresentando o resultado a cada trimestre”.