“Uma falta de respeito aquela reunião, como se tudo estivesse certinho”. A reclamação é de Herval Nogueira, morador de Barra do Riacho e ativista socioambiental da Rede Alerta Contra o Deserto Verde, referente à reunião realizada nessa terça-feira (16) para apresentação do Estudo de Impacto de Vizinhança (EIV) do Terminal Portuário Imetame, no entorno da comunidade.
Organizada pela Prefeitura de Aracruz, por meio da Secretaria de Planejamento, Orçamento e Gestão (Sempla) e Imetame Logística Porto, a audiência pública “é um momento importante para que a comunidade conheça e opine sobre o EIV do Terminal Portuário Imetame, a ser implantado na ES 010, Barra do Riacho”, informa a prefeitura, em seu site.
Para as comunidades diretamente impactadas por mais esse empreendimento industrial, porém, a sensação é de temor e revolta. “Prefeitura e outros órgãos comemoram esse EIV sem que os analistas técnicos do Iema [Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos] tenham sequer analisado nossas propostas”, indigna-se Herval.
As propostas de condicionantes socioambientais, em número de 72, foram protocoladas no Iema no dia dois de abril último, fruto da mobilização de diversas entidades e cidadãos das comunidades localizadas no entorno da Imetame e outras gigantes instaladas na outrora bucólica região de pesca artesanal do litoral norte capixaba. Apesar da intensa degradação socioambiental, a identidade pesqueira de Barra do Riacho e suas vizinhas sobrevive. Na pequena vila que vê o rio Riacho desaguar no mar, a pesca artesanal gera 400 empregos diretos e indiretos.
A área de lazer a céu aberto dos moradores, no entanto, originalmente uma ampla faixa de areia à beira-mar, hoje restringe-se a menos de mil metros, espremidos entre um píer da Aracruz Celulose (Fibria) e as obras da Imetame.
A pequena “Praia do Sossego” já teve seu nome autoritariamente modificado para Praia dos Hóspedes pela papeleira, que construiu uma casa de hospedaria para os seus visitantes em negócios na região. Indignados, os moradores reafirmam a Praia do Sossego e lutam para que ela seja incluída como uma das condicionantes do licenciamento ambiental.
As propostas também foram protocoladas na Defensoria Pública Estadual e na Prefeitura de Aracruz, responsável pelo EIV.
Logística, offshore contêiner e granéis
O porto operará serviços logísticos que envolvem offshore, carga geral, container e granéis sólido, líquido e gasoso, em uma área de 560 mil metros quadrados. O setor empresarial e os órgãos públicos repetem, em defesa do projeto, a geração de empregos e investimentos.
Barra do Riacho é a comunidade mais próxima do núcleo industrial e também a mais destruída social, econômica e ambientalmente. A geração de emprego é uma questão crucial na localidade, outrora bucólica vila pesqueira.
Até hoje, passados 50 anos de usurpação do território da comunidade, de severa poluição da água e do ar, de inviabilização da pesca (atividade econômica tradicional e esteio da identidade cultural local), de perda de áreas de lazer, de violências e crimes, de desemprego e tantas outras mazelas, as comunidades impactadas aprovaram apenas três condicionantes nos diversos licenciamentos ambientais realizadas: um atracadouro para embarcações artesanais, um programa de menor aprendiz e um curso básico de informática.
A construção do projeto, bem como a ampliação do Portocel da Aracruz Celulose (Fibria) na região, só foi possível após mudança na poligonal feita pelo governo federal em 2015, a pedido do governo do Estado. Já a licença emitida ao Imetame, que era para offshore e cargas gerais, passou a ser também para contêineres e graneis sólidos, líquidos e gasosos.