O Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) concluiu o Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (RTID) da Comunidade Quilombola Linharinho, localizada em Conceição da Barra (norte do Estado), após recomendação do Ministério Público Federal (MPF). O relatório precisa, agora, ser analisado pela Diretoria de Ordenamento da Estrutura Fundiária do Incra e publicado no Diário Oficial da União e no do Espírito Santo, após aprovação.
A conclusão do documento foi recomendada no âmbito de inquérito civil instaurado para apurar a excessiva demora na regularização do território tradicional da comunidade. De acordo com o inquérito, este é o segundo procedimento que visa à regularização das terras quilombolas de Linharinho. O primeiro, iniciado ainda em 2004, foi anulado pela Justiça.
O RTID de Linharinho estava com sua elaboração congelada há quase um ano, desde o dia 31 de outubro de 2013. Essa comunidade teve 85% dos seus 9,5 mil hectares usurpados pela Aracruz Celulose (Fibria), empresa que usou de grilagem e intimidação para instalar seus eucaliptais nos territórios remanescentes. A empresa questionou a portaria de reconhecimento de Linharinho, obtendo vitória na Justiça em 2007. Após a anulação, somente naquela data foi aberto um novo processo, que pode levar de dois a três anos para ser concluído.
A territorialidade é ??uma das características essenciais da cultura quilombola, como considerou a procuradora da República Walquiria Imamura Picoli. “A preservação da cultura quilombola objetivada pelo constituinte só se torna efetiva na medida em que se assegura à comunidade étnica o território necessário à sua reprodução física, social, econômica e cultural, exatamente como consagrado no art. 3º, § 2º, do Decreto 4.887/03”.
No Estado, a situação dos quilombolas é especialmente precarizada pela lentidão nos processos que visam a recuperar os territórios usurpados pela Aracruz Celulose, por usinas de cana-de-açúcar e álcool e fazendeiros. Sem o reconhecimento da terra como tradicionalmente quilombola, as comunidades enfrentam dificuldades para sobreviver. Na região, onde antes havia fartura e preservação ambiental, predominam o cenário de miséria e destruição.
A elaboração do RTID é uma das fases do reconhecimento dos territórios quilombolas, previstos na Constituição de 1988. No artigo 68 de seu Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, é assegurado aos remanescentes das comunidades de quilombos a propriedade definitiva de suas terras, devendo o Estado emitir-lhes os respectivos títulos.
O MPF instaurou, ainda, outros cinco inquéritos para acompanhar a situação das comunidades de Roda D'Água, Bacia do Angelim e São Domingos, localizadas em Conceição da Barra; e São Jorge e Serraria/São Cristóvão, em São Mateus, bem como o processo de delimitação de suas áreas.
No Estado, oito comunidades quilombolas estão em processo de titulação, que já leva décadas. Também em Conceição da Barra, o território Angelim está com a elaboração de seu RTID congelada desde o dia 31 de outubro do ano passado. Na mesma situação está a comunidade Roda D'Água, localizada no mesmo município, que está com o RTDI em elaboração desde 4 de abril deste ano. Já a comunidade Retiro, em Santa Leopoldina (região serrana), teve a portaria do presidente do Incra publicada há mais de dois anos, em 31 de janeiro de 2012. Um dia antes, foi publicada a portaria dos territórios Serraria e São Cristóvão, em São Mateus (região norte). A portaria da comunidade São Pedro, localizada em Ibiraçu (norte do Estado), foi publicada no dia 23 de novembro de 2012, e desde então não houve atualização no processo.
A Procuradoria da República em São Mateus também mantém o Projeto Quilombos da Cidadania, que objetiva dialogar sobre deveres e direitos garantidos por lei, prestar contas dos procedimentos instaurados pelo MPF em virtude de representações de quilombolas, além de apresentar novas ideias para melhorar o dia a dia das comunidades.