Meta é concluir ao menos quatro processos este ano, dos 22 em andamento, afirma superintendente Penha Lopes
A Superintendência Regional do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária no Espírito Santo (Incra/ES) realiza uma força-tarefa para retomar a regularização de territórios quilombolas paralisados nos últimos anos em todo o Brasil. A meta é concluir ao menos quatro processos no Sapê do Norte, entre Conceição da Barra e São Mateus, no norte do Estado.
A força-tarefa visa contornar o orçamento exíguo herdado do governo de Jair Bolsonaro (PL) para o funcionamento da autarquia e sem qualquer provisão específica para as regularizações quilombolas. “Como ainda estamos executando atividades com orçamento do governo anterior e não havia nada reservado para o Espírito Santo, não conseguimos avançar nesses processos. Há falta de servidores, também. O que estamos conseguindo fazer é por meio da força-tarefa interna para fazer as vitorias das comunidades in loco e caminhar com os relatórios”, afirma a superintendente, Penha Lopes.
A gestora conta que, das 42 comunidades capixabas já certificadas pela Fundação Palmares, 22 estão com processos abertos no Incra e outras 20 precisam fazer a solicitação à autarquia. Das 22 em andamento, quatro estão com seus Relatórios Técnicos de Identificação e Delimitação (RTID) mais avançados, e são essas as prioridades para este ano. “Se conseguirmos outras alternativas, como equipes extras, vindas de outras superintendências, podemos avançar e concluir outras etapas de relatórios de mais comunidades”, acrescenta.
Os RTIDs envolvem estudos antropológicos e fundiários, com visitas às comunidades para identificar, entre outras questões, a cadeia dominial, identificando quem são os moradores tradicionais do lugar, os ancestrais que primeiramente ocuparam a área, as famílias descendentes, o uso atual feito das terras e os valores para possíveis indenizações de ocupantes não quilombolas.
“Estamos aguardando o concurso público nacional do Incra, com 742 vagas. Para o Espírito Santo está previsto virem novos profissionais de nível superior e a prioridade da chegada deles será para a pauta da regularização dos territórios quilombolas, que é prioridade da superintendência, ao lado da reforma agrária “, anuncia Penha Lopes, acrescentando o diálogo com outros órgãos federais, como o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), responsável pela aplicação das políticas públicas para as comunidades, como na área de fomento agrícola.
No Espírito Santo, contextualiza Penha Lopes, há que se ressaltar também a Mesa de Resolução de Conflitos Fundiários, coordenada pela Secretaria de Estado de Direitos Humanos (SEDH) e que tem o Incra como uma das entidades integrantes. O fórum vem intermediando o imbróglio formada pela expansão dos monocultivos de eucalipto da Suzano (ex-Fibria e ex-Aracruz Celulose) sobre as comunidades certificadas. Conforme denunciam os quilombolas, o recuo dos eucaliptais é uma pauta que não avança na mesa, mas outras demandas têm começado a sair da inércia, como a implementação de políticas públicas de acesso à água, energia elétrica e telefonia.
Etapas
As comunidades quilombolas com processos mais avançados de regularização são a de São Pedro, em Ibiraçu, e Roda d’Água e Córrego do Alexandre, em Conceição da Barra, que já publicaram o RTID. A primeira precisa de dotação orçamentária para efetuar as reparações e indenizações necessárias aos fazendeiros. As outras duas estão no período de contestação dos proprietários de terrenos afetados, que já foram intimados.
Também em Conceição da Barra, há várias com RTID em andamento, sendo que os quatro Angelins (I, II, III e do Meio) estão com os estudos mais adiantados. Outras nessa região aguardam a equipe da autarquia retomar os trabalhos, entre elas, Córrego do Macuco, Coxi e Morro da Onça, em Conceição da Barra, e Córrego do Chiado e Serraria e São Cristóvão, em São Mateus.
Justiça
Outra dimensão da luta pela regularização fundiária dos territórios quilombolas se dá no Poder Judiciário. Na Justiça Federal, caminha uma ação civil pública impetrada em 2013 pelo Ministério Público Federal (MPF), o Incra e a Fundação Palmares – ACP nº 0104134-87.2015.4.02.5003/ES – pedindo a nulidade dos títulos de propriedade emitidos pelo governo do Estado à então Fibria (atual Suzano e ex-Aracruz Celulose), referentes a imóveis rurais localizados dentro do Sapê do Norte, em áreas certificadas como quilombolas e cujas matrículas foram adquiridas de forma ilegal pela multinacional, conforme ficou demonstrado na Comissão Parlamentar d Inquérito (CPI) da Aracruz Celulose, realizada pela Assembleia Legislativa em 2002.
A ação pede também a suspensão de financiamentos à empresa para negócios em São Mateus e Conceição da Barra, por parte do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), além da indisponibilidade dessas matrículas por parte dos cartórios de registro de imóveis da região e do pagamento de uma multa de R$ 1 milhão pela Suzano às comunidades.
A primeira decisão judicial foi favorável às comunidades, assinada pelo juiz Nivaldo Luiz Dias. O caso subiu para a segunda instância, estando sob análise dos desembargadores do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF-2), sob o número 0000693-61.2013.4.02.5003.