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Indígenas completam sexto dia de ocupação dos trilhos que cortam territórios

Empresas insistem na quitação geral de danos e rejeitam pautas apresentadas pelas comunidades

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As comunidades indígenas Tupinikim e Guarani de Aracruz, no norte do Estado, completam nesta sexta-feira (22), o sexto dia da ocupação dos trilhos da Vale que atravessam seus territórios. O motivo é exigir o cumprimento, pelas empresas Vale, Samarco e BHP Billiton, dos compromissos de revisar o acordo indenizatório referente ao rompimento da barragem de Fundão, em Mariana/MG, em cinco de novembro de 2015, o maior crime ambiental do País.

A ocupação teve início da noite do último domingo (17), após uma reunião com as mineradoras em que elas negaram a avançar com os pontos de pauta negociados há um ano, após uma ocupação de 43 dias sobre os mesmos trilhos. “Na primeira ocupação, conseguimos a retomada do pagamento do ASE [Auxílio de Subsistência Emergencial], mas os outros pontos elas não cumpriram”, informa o Cacique Toninho, da aldeia Comboios.

A pauta tem como pontos centrais a indenização individual dos indígenas atingidos, por CPF, e não por núcleo familiar, e a inclusão, no programa de indenização, de mais famílias atingidas, que ainda não foram indenizadas.

“Semana passada fizemos reunião com as mantenedoras e elas disseram que não irão falar de indenização, somente do PBAI [Plano Básico Ambiental Indígena]. As empresas não estão se comprometendo com o processo que tinha sido combinado. Não incluíram nenhuma família. Dizem que assinamos a quitação geral e não irão mais tratar de indenização”, relata o cacique.

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Somente em Brasília houve avanço na pauta de reivindicações, com a primeira reunião das comunidades e lideranças com uma equipe do governo federal que coordena a repactuação ampla dos programas de reparação e compensação de danos. Para além do governo federal, o processo está centralizado nas empresas criminosas, nos governos do Espírito Santo e Minas Gerais e nas instituições de Justiça em âmbito federal e estadual – Ministérios e Defensorias Públicas -, mas a mesa não contempla cadeiras para representação direta dos atingidos, conforme vem reivindicando também o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB).

“Semana passada fomos a Brasília, conversamos com a presidente da Funai [Joenia Wapichana], colocamos que a repactuação está acontecendo sem a consulta prévia, livre e informada dos territórios indígenas, e pedimos para fazer parte das reuniões sobre repactuação. Quarta-feira passada teve reunião online com Funai [Fundação Nacional dos Povos Índigenas] e Casa Civil”, conta Toninho.

Reintegração de posse

Na noite dessa quinta-feira (21), a tropa de choque da Polícia Militar do Espírito Santo foi até a ocupação para apoiar o cumprimento de uma sentença da Justiça Estadual de reintegração de posse, mas a Defensoria Pública da União e o Ministério Público Federal (MPF) interviram e a Justiça declinou do caso, que agora é tratado exclusivamente pela Justiça Federal.

Na manhã desta sexta-feira (22), o oficial federal entregou a liminar de reintegração de posse solicitado pela Vale, mas as comunidades estão decididas a não deixarem a ocupação enquanto não houver uma garantia de que as empresas irão retomar a negociação das pautas.

“Não podemos afrontar as autoridades, mas também não podemos deixar que nossos direitos sejam negados. Pelas comunidades, a decisão é só sair da linha férrea com decisões estabelecidas em termos. Até lá, continuará sem nenhuma operação nos trilhos”, anuncia o Cacique Vilmar (Tupã Atã), de Caieiras Velha. Além de Comboios e Caieiras, outras quatro aldeias se somam à mobilização: Irajá, Córrego do Ouro, Pau Brasil e Três Palmeiras.

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Ele explica que as negociações que vinham acontecendo com as empresas, com intermediação da Justiça Federal, foram suspensas uma decisão do novo juiz da 4ª Vara Federal, Vinicius Cobucci, que alegou que a Associação Indígena Tupiniquim de Caieiras Velha (AITCV) não tem competência para impetrar o pedido de revisão do acordo com a Fundação Renova. O juiz anterior, Michael Procópio Ribeiro Alves Avelar, estava conduzindo as audiências de conciliação extrajudicial, mas após denúncias de irregularidades no trabalho do perito designado para o parecer sobre a situação das comunidades e a sentença do novo magistrado, as negociações retrocederam.

“Ele não avaliou o mérito da ação, somente a representatividade da AITCV. Nós recorremos ao Tribunal Federal e aguardamos a decisão em segunda instância. Mas depois dessa sentença, as empresas recuaram das negociações e não aceitam mais tratar das indenizações, somente do PBAI”, explana.

Desde o início da ocupação dos trilhos, as empresas não se manifestaram. A DPU e o MPF acompanham a mobilização, com a atribuição de dialogar com a Justiça Federal em favor das comunidades.

Contexto favorável

A decisão das comunidades Tupinikim e Guarani de Aracruz de retomarem a ocupação dos trilhos se dá em um contexto de afirmação importante dos direitos dos povos indígenas no Brasil, com a derrubada da tese do Marco Temporal pelo Supremo Tribunal Federal (STF) nessa quinta-feira (21).

Também ocorre em um momento em que a justiça britânica negou o recurso da Vale para não ser julgada pelo crime contra o Rio Doce. A Corte de Apelação em Londres incluiu a mineradora, tornando-a ré no processo aberto em 2018 e que defende os direitos de mais de 700 mil atingidos no Espírito Santo, Minas Gerais, Rio de Janeiro e Bahia.

No litoral norte capixaba, outra vitória importante dos atingidos foi a sentença do juiz Vinícius Cobucci de decidir, no mérito, pela inclusão de dezenas de comunidades atingidas nos programas de reparação e compensação da Renova, ratificando a Deliberação 58/2017 do Comitê Interfederativo (CIF). 

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