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Intercâmbio de Mulheres Quilombolas realiza oficinas e discute retrocessos na luta

Joice nasceu pequenina, cabia numa caixa de sapatos, por isso o nome de infância Luninha, dado pela avó, que até hoje a identifica. Mas hoje ela é grande, tão grande em sua luta, que é referência como liderança-quilombola-mulher. O reconhecimento pela dedicação à causa, porém, também tem seus revezes. Joice teve de se mudar para um quilombo urbano, “pra não perder a vida”, lamenta. Ameaçada por posseiros, ainda tem dificuldade de voltar para a sua comunidade rural.

“Isso pra mim é um retrocesso. E tem militante que não tem esse olhar político pra enxergar o que está acontecendo: aos poucos a empresa [Aracruz Celulose, hoje Fibria, proprietária de parte considerável das terras em território quilombola, boa parte delas através de grilagem] vai abatendo os militantes que estão batendo de frente, até não ter mais movimento e território nenhum sair”, alerta Joice Luninha. A intenção, revela, é trazer uma formação para algumas mulheres leigas, para ajuda-las a enxergar as estratégias políticas de desmonte do movimento que estão em curso.

Além da Aracruz, o governo estadual é outro “posseiro” de porte a ocupar as terras do território quilombola no norte do Espírito Santo, mas o interesse de ambos em regularizar a situação é igualmente desprezível – “[Paulo] Hartung tem ações da Fibria”, comenta Joice –, a ponto de, até hoje, nenhuma titulação de terra ter ocorrido ainda, apesar de muitos reconhecimentos de território já terem sido aprovados.

Somente no Sapê do Norte, formado pelos municípios de Conceição da Barra e São Mateus, são cerca de 30 comunidades quilombolas e nenhuma delas conseguiu a titularidade de suas terras. E mesmo o acesso a políticas públicas é ínfimo, devido à excessiva burocracia e incoerência nas exigências de documentações. “As políticas públicas são mínimas, insuficientes e muitas até impróprias”, reclama Daniela Meireles, educadora da Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional (Fase).

A Fase é uma das entidades que apoiam a luta quilombola no Espírito Santo. O Grupo de Mulheres Quilombolas Coletivo em Ação, que tem a Joice como coordenadora, inclusive, foi contemplado com um edital da instituição voltado aos direitos das mulheres, para realização desse e outros intercâmbios, entre outras atividades.

Esse primeiro intercambio foi realizado nos dias 9 e 10 de julho, na sede do Centro de Defesa dos Direitos Humanos (CDDH) em Carapina, na Serra, e teve o apoio também do Sindibancários. Foram realizadas oficinas de turbante, de ervas medicinais e de segurança alimentar, além de rodas de discussões sobre a Lei Maria da Penha e a Campanha Nenhum Poço a Mais.

O próximo será no Sapê do Norte e vai novamente reunir mulheres de outros coletivos, de várias etnias, do meio urbanos e rural, para trocas de experiências, oficinas culturais, formação política e fortalecimento individual e coletivo nessa luta que, no fundo, é de toda as pessoas que buscam uma sociedade mais igualitária, livre e próspera de verdade. 

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