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Justiça aponta inconsistências na suspensão do bloqueio de R$ 10 bi

Mineradoras Samarco, Vale e BHP, Fundação Renova e governos têm dez dias para apresentar provas para uma decisão final

Leonardo Sá

O juiz Michael Procópio Ribeiro Alves Avelar, da 4ª Vara Federal de Minas Gerais – criada há menos de um ano para atender aos processos relativos ao crime da Samarco/Vale-BHP – publicou nessa quarta-feira (10) uma decisão que pode ser chamada de um “basta” nas manobras jurídicas empenhadas pelas empresas criminosas para não depositaram os R$ 10,34 bilhões pleiteados para garantir a inclusão de mais de 20 comunidades do litoral norte do Espírito Santo nos programas de reparação e compensação de danos executados pela Fundação Renova nas demais áreas atingidas.

No “Incidente de Divergência de Interpretação na Execução do TTAC – Deliberação CIF nº 58 e Deliberação CIF nº 390 – e atos derivados – ‘novas áreas'”, o magistrado determina o prazo de dez dias para que elas apresentem provas e argumentos concretos que embasem os questionamentos contrários ao depósito e ao reconhecimento prático dessas áreas como atingidas, cumprindo o que o Comitê Interfederativo (CIF), instância criada para fiscalizar a atuação da Renova, já decidiu em 2017, por meio da Deliberação nº 58.

A decisão é uma reação à sentença publicada há uma semana pelo desembargador Ricardo Machado Rabelo, membro do Tribunal Regional Federal da 6ª Câmara (TRF6), também recentemente criado para atender ao caso do crime das mineradoras. Nela, o magistrado contesta a decisão que Michael Procópio havia expedido no início de fevereiro, determinando o bloqueio bilionário para garantir o atendimento às comunidades negligenciadas há mais de sete anos pela Renova, concordando com os embargos e recursos impetrados pelas empresas e Fundação.

Em sua decisão, o juiz acentua a “insurgência e inconformismo” no pesar da balança da Justiça para o lado de maior poder econômico, jurídico e político do caso, e afirma não concordar com os pedidos feitos à sua Vara, decidindo por “negar provimento” aos mesmos, por considerá-los “manifestamente inadequados”, por tentarem rediscutir um tema já decidido.

Em outro ponto do despacho, exige que as embargantes informem com clareza o que contestam em relação às áreas que a Deliberação 58 determina inserir nos programas de compensação e reparação, já que, até o momento, passados quase sete anos da Deliberação, apenas dizem que não concordam com o CIF. “Ora, a Deliberação aponta dados para identificação das áreas, o que poderia ser trazido aos autos para discussão. Quanto aos programas, idem. A Fundação deveria indicar os que entende cabíveis, considerando padrões e critérios adotados nas regiões em que já atua, o que inclusive o CIF fez”.

Michael Procópio argumenta também a urgência de uma definição sobre a questão. “Entendo ser de interesse de todas as partes a celeridade sobre a definição se essas áreas devem ou não ser objeto dos programas de reparação, considerando que as Instituições de Justiça e a sociedade, em havendo dano, almejam uma resposta rápida; que as poluidoras e responsáveis, aqui compreendidas as empresas mineradoras, possuem interesse em célere reparação, considerando o maior ônus que os danos ambientais intercorrentes lhes acarretam em virtude do decurso de mais de sete anos do rompimento; e, por fim, que a Fundação Renova, como instrumento de reparação, sem interesse próprio que não a consecução desse fim, deve também buscar reparar o Meio Ambiente no menor prazo possível”.

Assim, decide o juiz: “intimem-se as partes para que indiquem as provas que pretendem produzir, permitindo que o Juízo, não mais em cognição sumária, mas exauriente, conclua sobre a procedência ou não dos pedidos envolvendo a Deliberação n. 58/2017 do CIF”.

As empresas, a Renova e o CIF devem apresentar de uma vez, portanto, todos elementos concretos para que a justiça possa dar uma decisão definitiva sobre o bloqueio e as áreas a serem incluídas, encerrando essa fase, que já se estende, de liminares e embargos. O prazo é dez dias para os entes privados e até 20 dias úteis para os órgãos federais que compõem o CIF.

De toda a área pontuada na Deliberação, entre Nova Almeida, na Serra, até Conceição da Barra, norte do Estado, divisa com a Bahia, somente as comunidades de Linhares são atendidas pela Renova. Entre São Mateus e Serra, a exclusão atinge 21 comunidades, formadas essencialmente por pescadores artesanais e catadores de caranguejos, que estão, desde o rompimento da barragem, impedidos de exercer suas atividades econômicas tradicionais, sofrendo graves impactos ambientais, econômicos, sociais e culturais, além de graves problemas de saúde.

“É importante lembrar que, conforme nota técnica expedida pelo ICMBio, em conjunto com o Projeto Tamar, a visualização por sobrevoo e de imagens de satélite mostraram que a pluma sedimentar atingiu com diferentes intensidades e concentrações toda a região costeira do Espírito Santo, sendo que a área compreendida entre o município de Serra e a divisa com o estado da Bahia foi a mais atingida, pela presença frequente da mesma”, pontuou o procurador da República Carlos Bruno Ferreira da Silva, em setembro de 2022, data da petição inicial de bloqueio dos R$ 10,34 bilhões.

Os órgãos de Justiça que defendem os atingidos e o governo do Estado, por meio da Procuradoria Geral do Estado (PGE), apontam que, “ao longo dos anos, as empresas e a Fundação Renova simplesmente desconsideraram os municípios litorâneos de seus programas. Passados sete anos do rompimento da Barragem de Fundão, a área costeira/litorânea nunca foi atendida por ações de recuperação. Pode-se usar de maneira enfática a palavra ‘nunca’, porque pode até ser que em um ou outro programa específico tenha ocorrido alguma ação pontual em município litorâneo, mas essa ação foi esparsa e não é digna de nota dentro do cenário que o desastre acometeu no Espírito Santo e diante da omissão das empresas e da Fundação Renova”.

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