Em uma decisão rara, a Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da Primeira Região (TRF 1) anulou, nessa quarta-feira (17), a homologação consolidada por seu Núcleo de Conciliação do acordo firmado entre a Samarco/Vale-BHP, a União e os governos do Espírito Santo e Minas Gerais, no crime do rompimento da barragem em Mariana (MG). A decisão é considerada uma vitória da sociedade civil.
“As populações atingidas não se conformavam com o prejudicial acordo entre o governo e a Samarco, que beneficiava em torno de R$ 1 bilhão as empresas envolvidas. Além disso, o governo não tem legitimidade para atuar em nome da população atingida, principalmente os indígenas”, ressaltou o procurador regional da República Felício Pontes, que fez a sustentação oral do pedido de anulação.
De acordo com o MPF, a homologação tinha que ser revista porque violava a competência do juízo de primeiro grau, além de impedir a participação de outros legitimados que já haviam pedido para ingressar na ação como coautores. A Quinta Turma do TRF-1 seguiu por unanimidade o voto do relator Néviton Guedes, que julgou o Sistema de Conciliação do TRF1, responsável pela homologação, incompetente para julgar o caso.
Com a anulação, a ação civil pública (nº69758-61.2015.4.3400) do Ministério Público será julgada pelo Juízo da 12ª Vara Federal da Seção Judiciária de Minas Gerais, cuja competência para cuidar dos processos relativos ao caso foi definida pelo Supremo Tribunal de Justiça (STJ).
O TRF1 também negou provimento ao agravo de instrumento interposto pela Samarco que pretendia se livrar do depósito imediato no valor de R$ 2 bilhões para execução do plano de recuperação integral dos danos.
Além do depósito, a empresa deverá, no prazo de 10 dias, comprovar que não há mais vazamento de volume de rejeitos que ainda se encontram na barragem e contratar empresas que possam iniciar imediatamente a avaliação da contaminação de pescados por inorgânicos e o risco causado ao consumo humano.
Também ficou determinado o prazo de 15 dias para apresentação de estudos e adoção de medidas para impedir que o volume de lama lançado no Rio Doce atinja o sistema de lagoas e a proteção das fontes de águas mineral mapeadas pelo Departamento Nacional de Produção Mineral (
DNPM).
E, em 20 dias, a Samarco/Vale-BHP deve elaborar estudos de mapeamento dos diferentes potenciais de resiliência dos 1.469 hectares diretamente atingidos, com objetivo de se averiguar a espessura da cobertura da lama, a granulometria, a eventual presença de metais pesados e o PH do material, bem como a adoção imediata de medidas para a retirada do volume de lama depositado nas margens do Rio Doce, seus afluentes e as adjacências de sua foz.
O MPF também informa que será decretada a indisponibilidade das licenças de concessões para exploração de lavra existentes em nome das empresas envolvidas, bem como dos direitos decorrentes. A Samarco e suas acionistas, a Vale a anglo-australiana BHP Billiton, deverão apresentar em 45 dias um plano global de recuperação socioambiental da Bacia do Rio Doce e de toda a área degradada e, no prazo de 30 dias, um plano global de recuperação socioeconômica para atendimento das populações atingidas.
A Procuradoria ressalta que o rompimento da barragem de Fundão é a pior tragédia socioambiental da história do País, responsável por 19 mortes e a destruição do distrito de Bento Rodrigues, desalojando inúmeras pessoas ao longo do curso dos rios atingidos pelos rejeitos.
“A lama que desceu da barragem seguiu o curso do rio Doce, chegando ao oceano Atlântico, no Espírito Santo. A força e o volume dos rejeitos destruíram estruturas públicas e privadas, áreas agrícolas e pastoris, áreas de preservação permanente e a biodiversidade aquática e terrestre, além de assorear cursos d´água e interromper o abastecimento de água de inúmeras populações dos estados mineiro e capixaba. De tão graves, os danos socioambientais e econômicos ainda não puderam ser completamente mensurados, até porque, continuam a ocorrer”.
Em caso de descumprimento das determinações, a multa diária às empresas será de R$ 150 mil por cada medida fixada.