Decisão alega ter como base mensagens de WhatsApp. MST nega ocupação e segue com Jornada Nacional pela Reforma Agrária
A Justiça Federal concedeu liminar em favor do pedido de Interdito Proibitório solicitado pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) para impedir um suposto ato que seria realizado pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) na manhã desta segunda-feira (18).
A autarquia federal alegou acesso a conversas de WhatsApp entre militantes do MST e apontou “preparativos para uma invasão do movimento à sede do Incra em Vila Velha”. O atendimento ao pedido foi feito pelo Juízo da 1ª Vara Federal de Serra de plantão, que publicou decisão nesse sábado (15), permitindo o uso de força policial para proibir a presença dos militantes.
Assinado pela diretora de Secretaria do juízo de plantão, Miele Picoli Haase, o Mandado nº 500001625002 intima a superintendência da Polícia Federal e o comando-geral da Polícia Militar do Espírito Santo para darem suporte à repressão da suposta atividade.
“É interditar para não dialogar”, ironiza Marco Carolino, da direção nacional do MST no Estado, negando a ocupação. “O que a gente quer é que o Incra abra diálogo com o movimento. Eles não querem conversar com o MST, mas as famílias assentadas e acampadas são de responsabilidade do governo federal”, aponta.
“A pergunta que fazemos para o Incra é: ‘o que eles têm desenvolvido de políticas públicas de habitação, crédito e outras, ligadas à reforma agrária? Tem muita propaganda, mas não tem nada materializado”, afirma. O atual cenário nacional e estadual, destaca, “é um retrocesso do ponto de vista do debate da concretude da reforma agrária”.
Jornada Nacional
O fato é que o MST realiza, de segunda a sexta-feira desta semana (18 a 22), diversas atividades relacionadas à Jornada Nacional de Lutas em Defesa da Reforma Agrária, que acontece em vários estados, com o tema “Reforma Agrária Popular: Por terra, teto e pão”. O objetivo é pautar a Reforma Agrária Popular e demais políticas públicas necessárias para prover justiça fundiária e fortalecer a Agroecologia, grande produtora de alimentos e empregos em todo o país.
A Jornada ocorre também como formar de lembrar as vítimas de um dos mais sangrentos episódios de conflitos de terra no Brasil, conhecido como Massacre de Eldorado dos Carajás, ocorrido em 1996, no Pará, quando 21 pessoas sem terra foram assassinadas pela Polícia Militar paraense e outras dezenas foram mutiladas. Desde então, o dia 17 de abril foi instituído como marco nacional e mundial da luta camponesa em defesa da Reforma Agrária e os sobreviventes do massacre lutam por justiça e contra a impunidade dos responsáveis pelo crime.
A mobilização capixaba irá acontecer na Grande Vitória, para onde integrantes e lideranças do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) começam a chegar. Para ajudar nos custos da permanência dos militantes na capital, o MST lançou uma vaquinha virtual, onde apoiadores podem doar qualquer valor via PIX ou Picpay.
No horizonte de atividades, estão manifestações diretas aos gestores do governo estadual e federal, encontros com parlamentares que apoiam a causa, diálogo com o movimento de luta pela moradia e com a sociedade em geral. “Vamos procurar pautar a reforma agrária em terras devolutas e patrimoniais do Estado, as políticas públicas para mulheres e juventude e fortalecer a relação campo-cidade”, acrescenta Carolino.
Nesse sentido, o militante destaca a atividade realizada por mulheres sem terra e quilombolas, por conta do Dia Internacional da Mulher, em oito de março. Infelizmente, passado mais de um mês do histórico encontro – foi a primeira vez que uma comissão de mulheres sem terra e quilombolas foi recebido por um governador capixaba –, ainda não houve qualquer medida prática .
“Foi uma atividade importante que as mulheres fizeram, mas que ainda não teve nenhuma ação prática. De fato, a retomada da Mesa de Resolução de Conflitos, que fez sua primeira reunião dia 23 de março, após 120 dias suspensa, por motivos ainda não devidamente esclarecidos, não tocou efetivamente em nenhum dos pontos da pauta de reivindicações.
Violência no campo aumenta
O líder sem terra ressalta ainda que violência no campo continua crescente em todo o país. Levantamento feito pela Comissão Pastoral da Terra (CPT) mostra que os “Conflitos no Campo de 2021” tiveram um aumento de 75% dos casos de assassinatos e de 1100% nas mortes em consequência de conflitos, comparados ao ano de 2020. No ano passado, foram 35 assassinatos decorrentes de conflitos no campo, mais da metade deles na Amazônia. O levantamento é feito anualmente pela CPT desde 1985.
“Enquanto isso, a paralisação da Reforma Agrária no país impera, e a impunidade sobre tais violências sofridas nas zonas rurais continuam sendo geradoras de mais conflitos e mortes. Além disso, ao longo do último ano, foram registrados dois massacres e o aumento de 76% dos casos de trabalho escravo reportados no campo”, salienta o MST, em sua página na internet. “De 1996 até agora mais de 300 camponeses foram executados devido aos conflitos no campo” e “desde 1985, mais de 90% das investigações dos casos nunca foram concluídas” complementa.
Títulos e armas não são solução
Assunto que sempre foi tabu no Brasil, a Reforma Agrária Popular acumula retrocessos durante o atual governo de Jair Bolsonaro (PL), que, ao invés de desapropriar as propriedades improdutivas do agronegócio para acolhimento das famílias que querem viver e produzir na terra, tem investido na concessão de títulos individuais de propriedade às famílias assentadas.
Sob comando de Bolsonaro, já foram emitidos 340 mil títulos. “Desta maneira, a família passa a ter acesso a crédito rural para investir no terreno e assistência técnica. Também elimina intermediários e ganha independência e liberdade para o desenvolvimento de atividades produtivas”, argumenta o Incra, em sua página eletrônica oficial, ao noticiar a chamada Campanha Abril Verde e Amarelo, “força-tarefa do Governo Federal voltada a ampliar a regularização fundiária no país, por meio da titulação de terras a beneficiários da reforma agrária e ocupantes de terras públicas”.
As justificativas, no entanto, são vazias de significado prático. “Sempre tivemos direito de acesso a políticas de saúde, educação e crédito nos assentamentos. Nunca foi o título de propriedade individual que garantiu esse acesso. Elas sempre foram aquém da necessidade, mas nunca tiveram a titulação como pré-condição”, afirma Carolino.
A tal Campanha Verde-amarelo, é, na verdade, “uma política de desmonte do governo Bolsonaro. O projeto dele é titular e armar os que têm propriedade privada, sem sinalizar nada para reforma agrária popular”.
O Espírito Santo tem mais de 800 famílias acampadas, sendo 60 mil no país. As titulações foram aceleradas logo após o impeachment da Dilma Roussef, quando o MST passou a denunciar o engodo.
Para colaborar com a Jornada
Para fazer uma doação de qualquer valor e ajudar na permanência dos militantes do MST em Vitória durante a Jornada Nacional de Lutas em Defesa da Reforma Agrária, basta fazer um PIX (telefone: 27996669767) ou PICPAY (@eliandra.fernandes) e enviar os comprovantes de doação para Eliandra (27-99729-3371).