Fabio Massariol acatou pedido da Defensorias Pública Estadual sobre competência da Justiça federal no caso
Foi suspensa pela Justiça Estadual os efeitos da decisão que havia concedido a reintegração de posse do trecho da ferrovia Vitória-Minas que corta a Terra Indígena de Comboios, em Aracruz, norte do Estado. A decisão liminar havia sido concedida em ação requerida pela Vale.
Desde o dia primeiro de setembro, centenas de famílias Tupinkim ocupam os trilhos que passam pela aldeia Córrego do Ouro, reivindicando a revisão do acordo de compensação e reparação dos danos provocados nas comunidades indígenas pelo crime da Samarco/Vale-BHP.
Em sua sentença, o juiz Fabio Massariol, da 1ª Vara Cível, Família e de Órfãos e Sucessões de Aracruz, acatou o pedido feito pelas Defensorias Públicas Estadual e da União (DPES e DPU), salientando a competência da Justiça Federal para o caso, por tratar-se de litígio envolvendo interesses e direitos das comunidades indígenas. Argumentação que foi reforçada, nos autos, pelos Ministérios Públicos Federal e Estadual (MPF/ES e MPES) e pela Fundação Nacional do Índio (Funai).
“Considerando a incompetência deste juízo para processar e julgar a presente ação, coloca-se em xeque a viabilidade do cumprimento da liminar de reintegração de posse originariamente pleiteada, por força de possível competência absoluta da Justiça Federal, o qual deterá melhores condições para análise cumprimento da medida pleiteada”, disse o magistrado.
A decisão foi tomada um dia após uma reunião de conciliação realizada na última quinta-feira (29) sob coordenação de Fabio Massariol, envolvendo representantes da Vale, dos indígenas e das instituições de Justiça que defendem as comunidades, além da Secretaria de Estado de Direitos Humanos (SEDH).
Na ocasião, a Vale reapresentou basicamente a mesma proposta de acordo que já havia sido enviada pela Fundação Renova, com a qual o acordo contestado foi firmado. Proposta que vem sendo reiteradamente rejeitada pelos indígenas. Sem o acordo perante o juiz, restava em suspenso ainda um prazo ventilado pela Vale, no dia cinco de outubro, quando a ferrovia seria reintegrada à empresa definitivamente. Com a decisão do juízo de Aracruz, no entanto, o caso passará por nova análise da Vara Federal da Seção Judiciária de Linhares.
Durante o encontro, as lideranças Tupinikim expuseram as reivindicações das aldeias, que vão além dos auxílios financeiros e indenizações. “Falamos da nossa realidade, da perda do rio, da falta de respeito da Fundação Renova e das suas mantenedoras [Samarco, Vale e BHP Billiton] com o nosso território e a nossa cultura. Muitos espaços nossos foram violados, não podemos usufruir mais desses locais”, relata o Cacique Toninho, da aldeia Comboios.
As lideranças também reforçaram estarem abertas ao diálogo, mas precisam de uma reciprocidade tanto da parte da mineradora quanto da Justiça. “Se a gente tem que cumprir uma ordem judicial que a Vale pede, a Justiça também precisa entender e defender os nossos direitos. Não pode continuar vendo só um lado”, complementou.
Os doze anos de atraso da mineradora em relação à entrega do Plano Básico Ambiental Indígena (PBAI) foi outro ponto ressaltado. “A Vale está inadimplente com a comunidade por não construir o PBAI. O juiz ficou comovido e ficou de pedir uma reunião com o juiz da Vara Federal de Minas Gerais”, conta.
Nesta terça-feira (4), uma comitiva de indígenas será recebida pela Sexta Câmara do Ministério Público Federal (MPF) em Brasília, para tratar das reivindicações feitas pela ocupação dos trilhos.
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