A ação, movida pelo Ministério Público Federal (MPF) em fevereiro de 2016, destaca que a pesca na região impactada pelos rejeitos do desastre socioambiental causado pelo rompimento da Barragem de Fundão, em Mariana (MG), pode aumentar os danos ao meio ambiente, trazer riscos à saúde da população e à sobrevivência da vida marinha.
Na decisão, a Justiça considerou que, “ao contrário do argumento de base invocado pela Samarco, não se extrai dessa manifestação oficial da Anvisa [Nota Técnica Anvisa n. 8/2019] uma afirmação categórica quanto à segurança do consumo de peixes e crustáceos capturados na foz do Rio Doce e região costeira adjacente, depois de a área ter sido atingida pelos rejeitos da barragem de Fundão”.
A Justiça destacou, ainda, que a fiscalização quanto ao cumprimento da medida de interdição da pesca decretada, ainda provisoriamente, cabe ao Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama), ao Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e ao Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Iema), nos termos de suas respectivas atribuições.
Auxílio financeiro
A decisão, salienta o MPF/ES, reforça o entendimento de que a Fundação Renova não pode cortar o pagamento do auxílio financeiro emergencial (AFE) dos pescadores profissionais localizados em 39 municípios capixabas e mineiros atingidos pelo rompimento da Barragem de Fundão, da Samarco/Vale-BHP, em novembro de 2015.
Com a manutenção da proibição da pesca na região, em função da permanência de elevados níveis de contaminação do pescado na foz do Rio Doce, ao menos os pescadores estão resguardados deste direito, havendo ainda outras categorias profissionais que precisam de proteção.
Liminar
A impossibilidade de suspender o AFE às diversas populações atingidas pelo crime no Espírito Santo e Minas Gerais já havia sido decidida liminarmente no início desta semana pela Justiça Federal, ao julgar pedido feito pela Advocacia-Geral da União (AGU) junto à 12ª Vara Federal de Belo Horizonte.
No processo, a AGU refuta a alegação da Renova de que alguns moradores estavam recebendo o auxílio sem cumprir os requisitos e destaca a situação de vulnerabilidade das comunidades desde o vazamento dos rejeitos de minério há quase cinco anos, situação agravada pela pandemia de Covid-19.
Por meio da Procuradoria Federal no Estado de Minas Gerais, a AGU alertou ainda que a decisão da Renova violava as normas legais e o próprio acordo que rege o processo de reparação e foi celebrado com as empresas responsáveis.
A Justiça acolheu os argumentos da AGU e concedeu medida para suspender a interrupção do pagamento. “Pretende-se que a vida econômica e social dos atingidos pelo desastre retorne, e que as pessoas não precisem mais receber o auxílio. Inclusive, é isto o que as comunidades locais querem: voltar com sua vida ao normal. Mas, para tanto, é necessário que haja a plena recuperação dos danos e demonstração de ausência de risco tanto na qualidade da água, quanto na pesca e geração de alimentos. Cabe ao poluidor fazer esta prova”, avalia o Procurador Federal Marcelo Kokke. “Com a decisão, mantém-se o fluxo de responsabilidade das empresas, que em auxílio financeiro e indenizações já pagaram valores na ordem de R$ 2,5 bilhões desde o desastre”, finaliza.
Na liminar concedida à AGU, alguns cartões, de algumas categorias de atingidos, e o MPF está avaliando o que pode ser feito para proteger essas pessoas.
Direitos humanos
Para as Defensorias, a tentativa de suspensão é “uma violação ao Direito Humano à Alimentação Adequada, que visa garantir o acesso a alimentos com quantidade e qualidade suficientes, presente no art. 6º da Constituição Federal de 1988 e no artigo XXV da Declaração Universal dos Direitos Humanos – um aumento indevido da exposição da saúde das populações atingidas aos riscos advindos da pandemia de Covid-19, nos termos da Resolução nº 01/20 da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH)”.