O desembargador substituto Raimundo Siqueira Ribeiro deferiu o recurso impetrado pelo produtor rural Julio Cesar Velten, proprietário do terreno previsto para a construção dos muros da barragem do Rio Jucu Braço Norte, na região do Córrego do Onça, em Viana.
Em seu despacho, o desembargador se coloca “contra a decisão do juiz de Direito da Vara Cível e Comercial de Viana, que nos autos de uma ação de desapropriação movida pela Cesan [Companhia Espírito Santense de Saneamento], deferiu liminar em favor da empresa”. E determina que a Cesan contrate uma avaliação judicial que indique um valor mais justo para a indenização com vistas à desapropriação, entendendo que não houve “prévia e justa indenização”.
“A Cesan não tem mais a posse da área”, comemora Julio Cesar. “E sem a titularidade da Cesan, o Idaf [Instituto de Defesa Agropecuária e Florestal do Espírito Santo] não pode dar a licença de operação pra construção”, explica.
O leilão para a construção da Represa do Rio Jucu Braço Norte foi realizado no dia 21 de agosto e teve como vencedor o consórcio Serveng Civilsan, com uma proposta de R$ 96,7 milhões.
Mas diante da decisão do desembargador, a construção não pode ter início. “A Cesan fez uma licitação sem ter a titularidade da área e sabia que isso poderia acontecer. A Cesan se apressou em licitar e talvez assinar um contrato em fim de mandato. Atropelou as etapas, nem consulta pública teve ainda”, expõe.
Valores justos
Em sua decisão, o desembargador relata que o valor depositado pela Cesan em juízo, de R$ 94,1 mil, é muito inferior ao valor de mercado apurado pelo produtor rural, de R$ 633 mil. “O valor de mercado é ainda maior que o registrado pelo desembargador: R$ 747 mil”, retifica Julio Velten, que recorreu da decisão do juiz em agosto último, após dois anos de frustradas tentativas de negociações extrajudiciais diretamente com a Cesan.
Além disso, o documento cita diversos outros processos de indenização relativos à construção da Represa do Rio Jucu, em que é possível verificar discrepâncias de valores entre terrenos semelhantes.
“Creio que, na situação posta, a alegação do recorrente de que o valor atribuído à área não corresponde ao valor de mercado aparentemente procede, pois em outros processos foi verificado que a avaliação da Cesan não corresponde à avaliação do mercado”, afirma Raimundo Siqueira Ribeiro.
Em uma ação estudada pelo desembargador, ele diz que “não pude deixar de perceber que o valor lá indicado, ao menos em aparência, se mostra irrisório, sobretudo se for levado em consideração que em diversas ações de desapropriação promovidas pela autora com o mesmo objetivo desta, o valor da avaliação de imóveis rurais localizados na mesma região (estrada para o Córrego Onça, em Viana), e possivelmente com características semelhantes (à exceção das áreas e benfeitorias) se mostra consideravelmente superior.
Em outra ação citada, o desembargador destaca a orientação do juiz para que a Cesan seja intimada a “esclarecer tais fatos”, ou seja, a discrepância de valores entre propriedades semelhantes na região.
No caso de Julio Velten, no entanto, destaca o desembargador, ”o juiz de origem não fez a mesma ressalva, apenas destacou que, caso eventual discrepância venha a ser apurada ao longo da instrução processual, será plenamente possível a complementação, assinalando que, teoricamente, também é possível a paralisação das obras, caso evidenciado qualquer prejuízo à parte contrária pela autorização de imissão na posse sem sua oitiva”.
Nesse contexto, prossegue o togado, “ao menos a princípio, entendo demonstrada a necessidade de realização de uma avaliação judicial prévia”.
Por fim, argumenta, “registre-se que nos autos do agravo de instrumento relativo a um dos processos de desapropriação mencionados pela agravante, o E. Des. Ewerton Scwab Pinto Júnior atribuiu efeito suspensivo ao recurso, determinando que se aguarde a realização de avaliação judicial prévia para imissão na posse, oportunidade em que destacou que ‘a prudência se evidencia nesse caso, na medida em que a posse provisória da agravada permitirá o início da realização das obras de implantação da barragem do Rio Jucu, com a inundação do terreno antes que seja realizada a avaliação judicial para fins indenizatórios’”, menciona.
Posto isso, conclui, “pelos fatos e fundamentos anteriormente expostos, defiro o pedido de atribuição de efeito suspensivo ao presente recurso, a fim de obstar a imissão da agravada na posse do imóvel expropriado antes da realização de uma avaliação judicial prévia”.
Números
A Barragem do Rio Jucu é uma das maiores das 60 previstas no Programa Estadual de Barragens. Com capacidade de armazenamento de 23 bilhões de litros de água, objetiva servir de segurança hídrica para o abastecimento direto de cerca de 64% da população metropolitana.
O espelho d' água do lago da barragem ocupará uma área de 14 hectares e a barragem terá 50 metros de altura. O conceito básico do projeto é funcionar como sistema de acúmulo de água no período úmido para uso no período seco, ou seja, o lago deverá trabalhar como uma enorme caixa d'água para suprir as necessidades de abastecimento em períodos de forte estiagem.
Para a sua construção, quase oitenta proprietários rurais precisam ser desapropriados. A maioria é descendente de imigrantes alemães, instalados há gerações na região. Para muitos, deixar a sua terra é algo inimaginável, tamanho sentimento de pertencimento ao lugar.
Boa parte dos proprietários ajuizaram ações requerendo indenizações mais justas e muitos, a exemplo, de Julio Velten, já estão tendo seus pleitos atendidos na Justiça.