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Manifesto contra privatização dos parques marca Campanha da Fraternidade 

Iniciativa da Arquidiocese de Vitória foi aplaudida nesse domingo até por Casagrande 

Arquidiocese de Vitória

Em sintonia com o Jubileu da Esperança proclamado pelo Papa Francisco, a campanha da fraternidade deste ano, que tem como tema “Fraternidade e Ecologia Integral”, foi marcada pela apresentação de um manifesto da Arquidiocese de Vitória contra o Programa Estadual de Desenvolvimento e Uso Sustentável das Unidades de Conservação (Peduc), da gestão de Renato Casagrande (PSB), que estabelece a transferência de seis parques naturais para exploração econômica pelo empresariado por 35 anos. O documento, lido durante a celebração desse domingo (9) no Ginásio Dom Bosco, em Vitória, foi aplaudido de pé pelo público, inclusive pelo governador.

Intitulado “Manifesto da Esperança: não à privatização dos Parques Estaduais”, o texto expressa preocupação em relação aos leilões programados para este ano voltados à concessão dos parques Paulo César Vinha (PEPCV), em Guarapari; Itaúnas, em Conceição da Barra, no norte do Estado; Cachoeira da Fumaça (PECF), em Alegre; e Forno Grande (PEFG) e Mata das Flores (PEMF), em Castelo, ambos no sul do Estado; e Pedra Azul (Pepaz), em Domingos Martins, na região serrana. 

O manifesto, assinado por diversos grupos da sociedade civil, faz referência ao livro de Levítico para reafirmar que “a terra não será vendida, pois pertence a Deus” (Lv 25,23). Ele enfatiza que os parques estaduais são patrimônio coletivo e não devem ser explorados por empresas privadas, o que poderia restringir o acesso da população mais pobre e comprometer a preservação ambiental. “Como cristãos, afirmamos que nossos parques e reservas ecológicas são um dom de Deus para todos os capixabas e queremos que eles continuem assim, pertencendo a todas as pessoas”, destaca o texto, que reforça a reivindicação pelo cancelamento do programa e um amplo debate com a sociedade capixaba, a academia e os movimentos ambientais. 

A coordenadora da Comissão de Promoção da Dignidade da Pessoa Humana (CPDH), Edinete Rosa, que participou da elaboração do manifesto, reforçou que “a concessão pode dar autonomia para empresas privadas, o que pode resultar na exploração turística desses espaços sem a devida preservação ambiental”. Ela explicou que a lógica de exploração privada ameaça o acesso da população, especialmente das comunidades mais próximas, que poderão ser excluídas do processo de gestão e uso desses espaços.

Além disso, Edinete também alerta para a falta de autonomia no gerenciamento de espaços públicos e o impacto potencial sobre as comunidades locais. “Como psicóloga, compreendo que além do espaço físico, existe um espaço de envolvimento da comunidade que passa por um processo de um empobrecimento comunitário quando uma área que era pública se torna privada”, avalia. Ela ainda acrescentou que “não se trata apenas de retroceder com o programa, mas de garantir avanços na preservação e usos desses parques, que têm um valor ecológico e cultural imenso para as gerações presentes e futuras”.

A coordenadora do Fórum das Pastorais Sociais, Adriana Nunes Oliveira, destacou que a preparação para a campanha deste ano incluiu encontros nas seis áreas pastorais da Arquidiocese de Vitória, onde foram discutidos os principais problemas ambientais de cada região. A partir desses debates, foi construído um levantamento de ações para minimizar os impactos ambientais, apresentado na celebração de abertura. 

Adriana também ressalta a importância desse diálogo ampliado. “Esperamos que o governador abra um diálogo sobre esse tema para que toda a sociedade possa participar do que é de interesse comum. Isso também é papel da Igreja e das pastorais. Preservar a casa comum implica em tudo isso: cuidar da água, dos parques, das praias e das iniciativas que possam ser úteis para as novas gerações”, afirmou. 

A mobilização contra o Peduc vem crescendo desde 2024 e chegou à Campanha da Fraternidade por meio das visitas da Arquidiocese às áreas pastorais. Durante a celebração, o Movimento em Defesa das Unidades de Conservação (UCs) do Espírito Santo entregou uma carta aberta aos participantes e a Casagrande, com um chamado para o abaixo-assinado pela revogação do programa, que já ultrapassou 13 mil adesões.  Além disso, foi anunciada a intenção de levar o tema para audiências públicas na Assembleia Legislativa e nas Câmaras Municipais. 

O Arcebispo de Vitória, Dom Ângelo, reforçou o compromisso da Igreja com a causa ambiental em sua homilia. “O nosso compromisso a partir de agora é cuidar da Casa Comum. As políticas públicas também devem ser pensadas em busca do bem comum. Deus nos confiou a criação e nós somos chamados a cuidar. Se faltar alimentos, faltará para todos; se faltar água, faltará para todos”, declarou. 

Arquidiocese de Vitória

‘Crise socioambiental’

Sem a realização de estudos e relatórios de impacto ambiental (EIA/Rima), os primeiros projetos de infraestrutura turística para os Parques Estaduais de Itaúnas e Paulo César Vinha foram apresentados pela consultoria Ernst & Young, contratada sem licitação por mais de R$ 8,6 milhões para a modelagem econômica das concessões. As propostas incluem a construção de teleféricos, tirolesas, restaurantes, hospedagens, piscina flutuante e estacionamentos para centenas de veículos. Especialistas alertam que esse modelo de exploração econômica pode colocar em risco a preservação ambiental dessas áreas protegidas. 

Os manifestantes pretendem continuar pressionando o governo para barrar a privatização dos parques e garantir que a preservação ambiental seja prioridade. Para o ambientalista Izanildo Sabido, um dos porta-vozes do movimento, o engajamento da igreja tem sido fundamental para envolver as comunidades e ampliar a participação popular. Além da revogação do programa, o grupo cobra a substituição do secretário de Meio Ambiente, Felipe Rigoni (União), apontado como responsável por uma condução autoritária do projeto, em benefício de interesses privados.  

Para a coordenadora do Fórum das Pastorais Sociais, Adriana Nunes Oliveira Adriana, a mobilização das comunidades, pastorais e ambientalistas reforça a importância de um diálogo aberto e transparente sobre as políticas públicas que impactam o meio ambiente e a vida das populações. Ela reitera a esperança de que o governo estadual escute a sociedade antes de avançar com qualquer iniciativa que possa comprometer a integridade das unidades de conservação e o bem-estar das futuras gerações.  “A crise não é só ambiental, é socioambiental. Precisamos cuidar da casa comum como um todo, combatendo também a fome e a desigualdade”, concluiu.

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