A discriminação contra as mulheres acontece ao longo de toda a Bacia do Rio Doce atingida pelo rompimento da Barragem de Fundão, da Samarco/Vale-BHP, ocorrido no dia cinco de novembro de 2015, em Mariana/MG. Por esse motivo, a Marcha de três anos do crime ambiental – o maior da história do Brasil e o maior mineração mundial – , organizada pelo Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), vai enfocar na situação das mulheres atingidas.
A programação tem início com um encontro de mulheres em Mariana no próximo domingo e, segunda-feira (4 e 5), com o tema “As consequências do crime na vida das mulheres e crianças na Bacia do Rio Doce”.
E prossegue até o dia 14, ao longo de dez municípios mineiros e capixabas atingidos, com a mensagem “Do Rio ao Mar: Não vão nos calar!”. O destino final é a capital Vitória, no dia 14 de novembro. Em cada localidade, haverá uma mobilização específica, com atividades relacionadas às realidades locais, incluindo Feiras de Saúde, atos culturais, caminhadas, celebrações religiosas e assembleias.
Mulheres
“Não estão querendo reconhecer as mulheres”, afirma Claudia Monteiro, presidente da Associação de Pescadores, Moradores, Marisqueiros do Distrito de Barra Nova Sul (Asspmmdbns), em São Mateus, no litoral norte do Espírito Santo.
Em sua comunidade, segundo a Associação, 125 pessoas têm direito ao auxílio emergencial e indenização, entre pescadores, moradores, comerciantes e marisqueiros, mas apenas onze foram cadastradas, três delas mulheres, apesar de o sexo feminino ser a maioria do público atingido.
“Temos o mesmo direito, fomos impactadas da mesma forma. E o impacto se renova todos os dias. Eu vivia do comércio e hoje dependo do meu marido”, relata a líder comunitária. “Fomos impactados no nosso trabalho, na renda, no lazer, na saúde”, diz.
Camaroneiros
Outro enfoque específico desta terceira marcha está nos pescadores de camarão de Vitória, que estão há três anos praticamente impossibilitados de exercer sua atividade no litoral norte, principal fonte de renda.
Recentemente apenas, é que houve o reconhecimento desses pescadores por parte da Fundação Renova, criada pelas empresas criminosas – a partir do Acordo firmado com os Governos estaduais e Federal, em março de 2016 – para executar os programas de compensação e reparação dos impactos socioambientais e econômicos do rompimento.
O pagamento das indenizações, no entanto, ainda não aconteceu. “A Renova está morrinha, ‘barrigando’ a gente pra caramba. Ninguém recebeu cartão”, conta o presidente da Colônia Z-5.
“Agora temos que pescar a 20 metros de profundidade, antes eram três metros. São três milhas de distância, não tem camarão”, descreve Álvaro Martins da Silva, o Alvinho, presidente da Colônia de Pesca Z-5, na Enseada do Suá, em Vitória. “Esses pescadores perderam 70% da renda, estão passando dificuldades!”, diz.
Nesses três anos, o que se vê são muitos barcos encostados. “Se dá uma ressaca de mar, lá nos vinte metros, dá algum camarão. Mas com calmaria não dá nada”, explica.
A estimativa da Colônia Z-5 é de que haja cera de 250 donos de barcos e pescadores de camarão atingidos pelo crime. E outros 250 aproximadamente, também impactados, mas numa intensidade menor, por trabalharem na venda do camarão, no conserto dos barcos camaroneiros, entre outras funções.
A promessa da Renova é que no mês de novembro agora seja feito o pagamento de 15% a 20% das indenizações a cada pescador, a maioria em torno de R$ 150 mil. Pagamento fundamental para a sobrevivência dos pescadores, em função do longo período de abandono e do início de mais um defeso do camarão, entre um de dezembro e 28 de fevereiro.
Números
No dia 5 de novembro de 2015, a Barragem de Fundão, da mineradora Samarco, controlada pela Vale e pela BHP Billiton, se rompeu e derramou 48,3 milhões de metros cúbicos de lama de rejeitos na natureza. A lama percorreu cerca de 650 km entre Mariana, em Minas Gerais, até a foz do Rio Doce no município de Linhares, Espírito Santo, espalhando-se por várias comunidades ao norte e ao sul da foz.
Atingiu, pela sequência, o córrego Santarém, o rio Gualaxo do Norte, o rio Carmo e todo o Rio Doce em um trajeto que compreende 43 municípios. Destruiu diversas casas, bens, modos de vida, fontes de renda, sonhos e projetos de vida. O rompimento matou 19 pessoas e provocou um aborto forçado pela lama no distrito de Bento Rodrigues. Destes, ainda há um corpo desaparecido de um trabalhador direto da Samarco.
Desde então, a luta das famílias atingidas segue, mas sem resposta real da Justiça e sem punição das empresas criminosas. Nenhuma casa foi construída, milhares não são reconhecidos, e a população denuncia que a Fundação Renova “empurra” os problemas sem previsão de reparação real na vida dessas famílias.